O remédio é amargo e, se ministrado em excesso, pode matar. A dose foi aplicada na segunda-feira 14, na forma de um acréscimo repentino de 3 pontos percentuais nos juros. Os já elevados 18% da taxa básica da economia viraram 21%, patamar mais alto desde junho de 1999. A doença, um caso clássico de especulação contra a moeda nacional, com sintomas de inflação rediviva, resistiu firme e forte à medicação. Ao contrário, a alta do dólar recrudesceu desde então e só acalmou no fim da tarde da quinta-feira 17, quando a cotação encerrou a R$ 3,91. No ano, a alta do dólar beira os 70%. Apenas nos últimos 30 dias, o salto supera os 20%.

O cérebro do paciente parece ter entrado em colapso com a crise nervosa dos últimos dias. Na quarta-feira 9, o recado do governo, dado pelo presidente do Banco Central, Armínio Fraga, era de que as possibilidades de conter o desvario cambial já haviam se esgotado no fronte oficial. As declarações pegaram tão mal (menos para os especuladores) que dois dias depois vinha o BC anunciar um pacote de medidas técnicas que tiraria dinheiro de circulação dos bancos e reduziria, em tese, a capacidade de especulação dos agentes financeiros. Ficou na tese. O dólar não deu refresco e, para arrematar o cenário, a equipe econômica resolveu convocar às pressas o comitê que define a taxa básica de juros do País.

A ata da reunião, divulgada dois dias depois da alta dos juros, explica que o problema é a inflação causada pelo aumento do valor da moeda americana (um movimento que até o mais ingênuo dos monges beneditinos sabe que deriva de um outro puramente especulativo).

Dentre as várias reações (em geral negativas, apesar de muitos considerarem a medida necessária), a mais precisa talvez tenha sido a do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Horácio Lafer Piva: “Este aumento, somado ao pacote da última sexta-feira, representa pesado ônus para a atividade produtiva e tem eficácia questionável para conter a piora das expectativas de inflação e para debelar a atual crise de credibilidade. Não se combate crise de confiança com política monetária”, diz a nota assinada por Piva.

A eficácia, realmente, provou-se discutível. O dólar fechou a R$ 3,92, o segundo maior valor da história do real, na quarta-feira 16, véspera de vencimento de US$ 3,6 bilhões em títulos cambiais do governo. É justamente nesse momento que a especulação atinge seu auge, já que o fechamento do dia definirá o valor dos resgates. Ponto para os especuladores.

Enquanto isso, na economia real, os primeiros sinais concretos da alta dos juros apareciam. O Bradesco reajustou em 0,2 ponto porcentual suas taxas (a do cheque especial foi fixada em 9% ao mês). As financeiras aplicavam aumentos de até 0,4 ponto nos juros dos empréstimos. O dinheiro mais caro estrangula a economia. O diagnóstico é quase unânime: mantida a condição atual, a produção deve atravessar o primeiro semestre de 2003 sem reação. Já a febre cambial deve seguir, ao menos enquanto durar o oxigênio da especulação.