Não foi por falta de aviso que a Petrobras não evitou o acidente com o navio-plataforma Presidente Prudente de Morais, também conhecido como P-34. Situada no campo de Barracuda-Caratinga, na parte sul da Bacia de Campos, na região norte fluminense do Rio de Janeiro, a plataforma começou a adernar no domingo 13, por volta das 15h30, após uma falha no sistema elétrico. Foi pânico em alto-mar. Petroleiros apavorados se jogaram na água com medo da repetição da trágica cena do naufrágio da maior plataforma de petróleo do mundo, a P-36, em março do ano passado, quando morreram 11 operários. Em maio de 2002, o Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ) começou a alertar a Petrobras de que uma outra plataforma, a P-34, vinha apresentando falhas na geração de energia. Em 29 de maio, problemas elétricos obrigaram o navio-tanque a ser evacuado às pressas.

A Petrobras volta a chamar a atenção do mundo, um mês depois de o Rio de Janeiro sediar o 17º Congresso Internacional de Petróleo. Só que por motivos pouco lisonjeiros. “Não dá para atribuir o acidente do último domingo a uma fatalidade”, denunciou o diretor do Sindipetro-RJ, Fernando Carvalho, afirmando que o alerta foi feito, mas não recebeu a devida atenção. Sorte da Petrobras que o drama durou pouco tempo e não chegou a provocar mortes, apenas prejuízos financeiros. Na quinta-feira 17, a empresa já descartava a possibilidade de a P-34 ir a pique. O grau de inclinação tinha diminuído de 32 para 5 graus. “Estamos, por enquanto, concentrados no problema da estabilidade. Só depois é que vamos nos concentrar no problema elétrico”, respondeu o diretor-gerente de Exploração e Produção da Petrobras, Carlos Tadeu Fraga. Nesse mesmo dia, a direção da empresa já tinha resgatado a caixa-preta do interior da plataforma para análise. Com isso, a Petrobras deixará de produzir diariamente 34 mil barris de petróleo e 195 mil metros cúbicos de gás, o equivalente a US$ 670 mil.

Recordista na prospecção de petróleo em águas profundas, a Petrobras vem acumulando recordes amargos. De 1999 a 2001, foram registrados 62 acidentes em plataformas, 264% a mais do que nos 23 anos anteriores – de 1975 a 1998, foram apenas 17 acidentes. A Associação dos Engenheiros da Estatal (Aepet) não descarta a possibilidade de sabotagem, entre outras. Na tentativa de chegar o mais próximo possível da verdade, o Ministério Público Federal foi acionado para apurar o motivo de tantos acidentes. O presidente da Aepet, Fernando Siqueira, tem uma tese: “A Petrobras passou a ter uma administração voltada para o aumento da produção, tendo como mote principal o lucro. Acabou, com isso, deixando as questões de segurança em segundo plano.”

Apesar de todo o esforço da direção da Petrobras, a reputação da estatal vem sofrendo arranhões difíceis de ser cicatrizados. Os sindicalistas estão convencidos de que o processo de terceirização é o responsável pelos recordes de acidentes. No início da década de 90, a Petrobras trabalhava com um efetivo de 62 mil funcionários e com 20 mil outros contratados. Atualmente, são 32 mil empregados e 88 mil terceirizados. Coincidência ou não, o fato é que ambas as plataformas acidentadas na Bacia de Campos vinham trabalhando com alto índice de terceirização. Na P-34, dois terços dos 76 funcionários eram terceirizados; dos 175 trabalhadores da P-36, 116 não eram empregados da Petrobras.

Imagem – Ainda é cedo para afirmar o que teria provocado o acidente da semana passada, mas o coordenador dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia Oceânica da Coppe-UFRJ, Segen Estefan, está convencido de que a situação é gravíssima, o que é péssimo para
a imagem do País. “Alguma coisa está errada, mas não podemos arriscar palpites sem aprofundar as análises.” Há cerca de um mês, a Coppe propôs à Agência Nacional de Petróleo (ANP) o estabelecimento de novos padrões de segurança. “Os sistemas convencionais estão demonstrando não ser suficientes para acompanhar o acelerado crescimento da produção”, justifica Estefan.

O assunto vem sendo acompanhado pela Câmara dos Deputados, que formou uma comissão para ajudar a apurar responsabilidades. Contra
a Petrobras pesa a acusação de não ter uma consciência ambiental equivalente à sua importância no mundo do petróleo. “Apesar dos avanços, a empresa não cumpre a legislação. Cerca de 80% das plataformas da Petrobras não têm licença ambiental”, denunciou o ex-presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa do Rio, Carlos Minc.

Integrantes do Sindipetro se reuniram para discutir o processo de evacuação utilizado pela Petrobras. Segundo Fernando Carvalho, já foi encaminhada uma representação ao Ministério Público Estadual com o objetivo de apurar as responsabilidades pelo acidente. Quando a P-34 começou a adernar, 25 trabalhadores precisaram se jogar no mar em busca de salvação.