Cerca de duas semanas antes das eleições, o então candidato do PSDB a governador de Minas Gerais, Aécio Neves, fez uma previsão: “Nada como ser o favorito nas pesquisas eleitorais. A expectativa de poder traz mais e mais manifestações de apoio. Os problemas aparecem depois, quando a gente vence. Aí começam as pressões.” Dito e feito. Eleito em primeiro turno com 57,68% dos votos, a maior porcentagem entre os tucanos que concorreram aos governos estaduais, Aécio agora se tornou alvo de cobranças. A começar dentro de seu próprio partido. O candidato tucano à Presidência, José Serra, que teve um modesto desempenho em Minas – apenas 23% dos votos contra 53% obtidos pelo petista Luiz Inácio Lula da Silva –, exige que Aécio capitaneie a virada em um Estado que é o segundo maior colégio eleitoral do País, portanto decisivo para a eleição. Colocou nada menos que o próprio presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, como intermediário das cobranças. Na segunda-feira 7, dia seguinte às eleições, FHC telefonou para Aécio três vezes. O tucanato queria que ele assumisse pessoalmente a coordenação nacional da campanha
de Serra, no lugar do ex-deputado Pimenta da Veiga.

Aécio saiu-se mineiramente. Disse que, como presidente da Câmara, cargo que exercerá até o final do ano, terá que negociar votações importantes e polêmicas no Congresso e uma participação tão direta na campanha prejudicaria esse “papel institucional”. Serra e seus assessores, naturalmente, não se deram por vencidos. Chamaram Aécio para uma reunião na quarta-feira 8, em Brasília, e o colocaram numa espécie de conselho da campanha, o que vai obrigar o governador eleito a usar todo o seu jogo de cintura que aprendeu com o avô Tancredo Neves para evitar que as cobranças dos tucanos estraguem um relacionamento duramente construído com o PT e que será fundamental para o futuro governador de Minas, caso Lula vença as eleições.

Já na primeira entrevista após a vitória, Aécio reafirmou o que defendeu durante toda a campanha: a adoção de um pacto entre os governadores eleitos de diversos partidos para dar sustentação ao próximo presidente, seja ele Lula, seja Serra. Chegou a afirmar que os dois candidatos são muito bons, “dois homens inatacáveis do ponto de vista moral”. Mas, caso ele entre de corpo e alma na campanha de Serra, perderá as condições de liderar esse pacto, o que é fundamental para seus planos de tornar-se uma força política capaz de atrair recursos da União para solucionar a crise financeira do Estado, qualquer que seja o próximo presidente. Mais. Em Minas, Aécio contou com o apoio eleitoral decisivo do atual governador, Itamar Franco, que sempre defendeu a candidatura Lula no plano nacional. Agora seria constrangedora uma disputa aberta contra Itamar. E o vice de Lula, o empresário mineiro José de Alencar (PL), também telefonou para Aécio na segunda-feira 7 informando que pretende manifestar apoio formal a seu governo, integrando os seis deputados eleitos pela bancada do PL à base parlamentar governista na Assembléia Legislativa. Uma forma nada sutil de cobrar isenção do governador eleito na disputa presidencial. E Aécio sabe que não pode abrir mão de apoios, ainda mais com o crescimento da bancada estadual do PT, que elegeu 15 deputados para a Assembléia Legislativa. Para piorar a situação, na terça-feira 8, Aécio recebeu um telefonema do presidente nacional do PT, José Dirceu, com juras de amor de um futuro governo Lula. Uma forma educada de cobrar o pagamento de uma dívida de Aécio: três semanas antes das eleições, a pedido do tucano, Dirceu telefonou para o candidato petista ao governo de Minas, Nilmário Miranda, vetando qualquer ataque mais virulento contra Aécio. O argumento usado na época era de que havia uma avenida aberta para o relacionamento futuro entre o governador tucano de Minas e Lula, então com expectativas de eleger-se no primeiro turno. É exatamente este o dilema de Aécio agora. A avenida foi aberta com muito trabalho e está pavimentada. Não pode deixar que pressões do tucanato coloquem barreiras nesse caminho, mas também como negar um pedido de socorro de Serra e FHC sem parecer que está traindo o PSDB?