Sobrou para o presidente Eduardo Duhalde. A maioria dos argentinos pensa que ele foi o grande prejudicado com a eliminação da seleção na Copa. Uma pesquisa realizada pelo Ibope OPSM para o jornal Página 12 mostra que oito em cada dez entrevistados acreditam que Duhalde será afetado pelo amargo regresso da equipe. Durou muito pouco o resgate da auto-estima e do ânimo da população, o súbito “esquecimento” das dificuldades proporcionadas pela crise mais grave da história do país. “Se nem as cabeçadas de Sorin entraram no gol da Suécia, como o país vai dar a volta por cima em sua situação econômica?”, perguntam os torcedores. O sonho acabou de madrugada e, já ao amanhecer, os argentinos foram obrigados a voltar a encarar a penosa realidade e a chegada de mais uma missão do FMI, na quinta-feira 13, missão que desembarcou com o olhar mais crítico que o costumeiro.

É a linha-dura do FMI que chega a Buenos Aires, chefiada pelo inglês John Thornton. “É uma missão negociadora”, disse o chefe de Gabinete, Alfredo Atanasof, admitindo que o governo aspira a obter um acordo para a postergação do pagamento da dívida, impossível neste momento. Os vencimentos da dívida da Argentina com o FMI para este ano somam US$ 5,467 bilhões, de acordo com dados do Ministério da Economia. As obrigações com organismos internacionais atingem US$ 8,6 bilhões em 2003. Atanasof ainda deve estar com a cabeça quente por causa da derrota na Copa do Mundo. O próprio ministro da Economia, Roberto Lavagna, disse aos deputados do Partido Justicialista como pensa o FMI: “Nós, sobre o acordo, estamos vendo um copo meio cheio, mas o FMI enxerga o copo meio vazio.” Ele também admitiu que não dá para contar com dinheiro tão cedo. Numa crise tão grave, a Argentina estaria satisfeita se o FMI refinanciasse os vencimentos deste ano e de 2003, evitando, assim, a moratória.

A missão chega no ataque, pronta para pressionar mais uma vez o governo Duhalde para que complete a assinatura dos acordos de
ajuste fiscal por parte das províncias. Além disso, o Fundo espera ouvir da equipe de assessores de Lavagna uma versão aceitável para o fim do corralito, o congelamenpromessas de austeridade fiscal, antes de fornecer auxílio. Segundo o ministro, se o acordo não sair, “o panorama será muito sombrio”.

É tudo muito demorado quando o FMI quer. Previsões otimistas dizem que, se tudo correr bem nessa visita dos oito integrantes do Fundo ao país, uma outra missão voltaria depois e só após quase dois meses o acordo poderia ser assinado. O FMI demonstra má vontade para com a Argentina, ao contrário do que manifesta em relação ao Brasil, que nos próximos dias vai sacar do caixa da instituição US$ 10 bilhões a que
tem direito pelo acordo firmado no ano passado. Também com o Uruguai
e Paraguai há maior benevolência, sinalizada por desembolsos, estratégia do organismo para tentar conter a expansão da crise argentina para
seus vizinhos. É uma crise contagiosa, sim, e até as autoridades financeiras dos países vizinhos devem ter lamentado a trégua que
não veio com a Copa do Mundo.