A Argentina caminha célere de volta ao cadafalso. Já há quem aponte a ameaça de um novo calote da dívida externa e de um período tenebroso de revés econômico e social. Nas ruas a insatisfação passou a ser sentida. A greve geral semanas atrás foi apenas o primeiro sinal do grau de preocupação da população. Com as contas públicas desarrumadas, inflação em repique e fuga de empresas para outros mercados, o país mergulhou numa temporada de indicadores negativos e, por tabela, de acirramento político. Parlamentares da oposição têm destacado o comportamento hesitante da presidenta Cristina Kirchner e a maneira belicosa e pouco transparente como ela vem tratando questões prioritárias no campo do gasto público. A maquiagem de dados para disfarçar o tamanho do problema transformou-se numa constante. Com medidas impopulares como o cerceamento da liberdade de imprensa, Kirchner está colhendo críticas inclusive dentro do governo e sua base de sustentação reduziu sensivelmente nos últimos tempos, recolhendo-se a alas pouco representativas do peronismo. Com a popularidade em baixa, o índice de aprovação à gestão da presidenta desabou, chegando à metade do que era no ano passado. Parceiros internacionais como os EUA, sentindo o risco, apertaram o cerco. Há poucos dias um tribunal americano estabeleceu que a Argentina pague de imediato mais de US$ 1,3 bilhão aos credores que se recusaram a participar da reestruturação dos títulos da dívida externa do país. Em meados de 2001 a hecatombe argentina atingia seu pico com o calote monstro de US$ 81 bilhões. De lá para cá, uma sucessão de governos fracassados e sacrifícios sem-fim aos cidadãos deixaram marcas no país, que demorou mais do que o esperado para se recuperar. A perspectiva de retorno àquela situação tem colocado em alerta inclusive vizinhos membros do Mercosul. A presidenta Dilma, em missão claramente de apoio a Kirchner, chegou a viajar para a Argentina na semana passada e a conclamar a união dos parceiros do bloco contra as nuvens de crise. Sem um ajuste firme e convincente da máquina do Estado, dificilmente a Argentina escapa da desconfiança global de que será ela a próxima vítima do caos financeiro, com reflexos possíveis em todo o continente.