Investir nas crises é uma velha lição dos negócios que está voltando à tona. É uma saída para quem pode – e não para quem quer. Em queda desde 2001, os escassos recursos destinados ao aumento de produção e produtividade ficaram por conta das grandes empresas, as grandes mesmo, que fazem agora um trailler do que pode ser o crescimento. Mais produção, mais empregos, mais receitas e mais dinheiro para o consumo. Nada que vá mudar rapidamente o atual cenário ainda de estagnação, mas é um começo. “Ainda não temos números para afirmar que essa melhora irá representar uma retomada dos investimentos”, pondera Renato da Fonseca, coordenador da unidade de pesquisas da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Mas os sinais de reversão já podem ser percebidos na recuperação gradual da renda dos trabalhadores, no crescimento do nível de emprego, nas vendas maiores da indústria e no aumento das importações de matéria-prima e bens de capital. Sem falar nas exportações que vão de vento em popa. “Isso já é suficiente para as empresas manterem seus investimentos”, acredita Fonseca.

Com a maioria de sua produção voltada para o mercado externo, a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) planeja um novo investimento de US$ 100 milhões na unidade localizada na cidade de Alumínio, interior de São Paulo. O dinheiro – parte de um total de US$ 370 milhões que será aplicado até o final de 2005 – destina-se à compra de equipamentos para ampliar em 70% a fabricação de laminados. Controlada pelo Grupo Votorantim, a CBA quer aproveitar o bom momento das exportações e incrementar suas vendas também para o mercado interno nos segmentos de embalagem, transporte e construção civil. O investimento irá garantir a contratação de 300 empregados. Líder na produção de fenol e acetona, que servem de matéria-prima para a cadeia produtiva da indústria de móveis e de calçados, a subsidiária brasileira da francesa Rhodia está destinando US$ 10 milhões para aumentar em 27% a capacidade de produção de sua fábrica em Paulínia (SP). A empresa também está ampliando sua linha de fios têxteis e de plásticos de engenharia. Nas duas unidades, será gasto mais US$ 1,75 milhão e criados cerca de 50 empregos. “Os projetos estão em perfeita sintonia com a estratégia de crescimento da Rhodia na América Latina”, disse o presidente mundial da empresa, Jean-Pierre Clamadieu, que veio ao Brasil especialmente para a inauguração oficial do projeto de ampliação, na segunda-feira 21.

Outra francesa que não desanimou com o cenário negativo do País foi a Michelin, que trouxe para o Brasil sua linha de produção do pneu Pilot Sport 2, até então uma exclusividade da fábrica na França. A fabricação local do pneu de “alta performance” que equipa carrões como os modelos da Mercedes, Lamborghini e BMW exigiu investimentos de US$ 20 milhões. Os franceses também estão ampliando a fábrica de Campo Grande (MT), que produz pneus para veículos pesados. O investimento será de US$ 98 milhões e deve gerar 500 empregos. “Essas grandes empresas têm horizontes de planejamento estratégico mais longos. Além disso, com crise ou sem crise, elas têm acesso aos programas de financiamentos”, diz Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

Dona de uma performance financeira impressionante, a enfant terrible Gol levantou R$ 878 milhões com o lançamento de ações na Bolsa. Os recursos vão custear parte da compra de 15 aviões – com opção de compra de outros 28 – que irão se somar à atual frota de 22 aviões. A previsão de investimentos até 2010 é de R$ 8 bilhões para compra de 43 aeronaves. Os primeiros 15 Boeings 737/800 encomendados devem pousar no Brasil entre 2007 e 2009. Com as aquisições, a Gol espera aumentar o número de vôos e rotas e duplicar o atual quadro de pessoal de 2,7 mil. Outra que está em franca expansão é a Motorola. Depois de uma fase difícil, a empresa de telefonia deu a volta por cima e se prepara para instalar mais quatro linhas de produção de celulares na fábrica de Jaguariúna, em São Paulo. No início de junho, desembarcaram no aeroporto de Viracopos, na vizinha Campinas, 120 toneladas de equipamentos no valor de US$ 11 milhões. O dinheiro também vai custear treinamento de funcionários e a contratação de mais 300 empregados.

Os números do emprego, divulgados pelo Ministério do Trabalho e pelo IBGE, contribuem para uma melhoria no clima. O mercado de trabalho para os trabalhadores com carteira assinada assimilou pouco mais de um milhão de pessoas nos últimos 12 meses. Só no mês de maio, foram abertos 291,8 mil postos de trabalho com registro em carteira, sendo 90 mil só na indústria. Já o IBGE registrou pela primeira vez este ano uma redução no porcentual de desempregados nas principais regiões do País, de 13,1% em abril para 12,2% em maio. No total, foram criadas 148 mil vagas, a maioria em São Paulo, Estado que concentra a maior parcela de pessoas sem emprego. É pouco se a referência for o total de 12 milhões de desempregados do País, mas, novamente, é um começo – pelo menos no horizonte de quem está atrás de um trabalho.

O entrave – não é dificil saber – está numa recente análise do Iedi: “O Brasil está retardando excessivamente o relançamento de sua economia, que de fato vem se recuperando desde meados de 2003, mas de forma tão lenta que ainda não acena com um crescimento de longo prazo capaz de estimular os investimentos de uma forma geral e, em particular, os investimentos diretos de origem externa.” Esses estão cada vez mais afugentados: no mês de maio foram apenas US$ 207 milhões, valor significativamente pior do que o do mês de abril (US$ 381 milhões). A chinesa Speed InfoTech, de Xangai, é, nesse cenário, uma exceção: acaba de anunciar que está fazendo investimentos de US$ 3 milhões para a fabricação terceirizada de computadores e periféricos. Não vai parar por aí. Para 2005 projeta investir mais
US$ 10 milhões numa fábrica própria.

Os investimentos que pipocam passam pela Mangels Industrial, uma das maiores fabricantes de rodas de alumínio para a indústria automobilística. Seu crescimento provocou um aumento dos investimentos de R$ 12 milhões para R$ 20 milhões. Parte desse dinheiro segue para a expansão da unidade de rodas, em Três Corações, a cidade que ficou famosa por ter como filho Edson Arantes do Nascimento, o Pelé.

A maior empresa do País e uma das maiores do mundo, a Petrobras, honra as estatais ao divulgar seus planos de investimentos para os próximos seis anos. Serão US$ 56,6 bilhões, sendo US$ 32 bilhões para a exploração e produção de petróleo. Também honrosa é a saída da Ford – em plena recuperação – para corresponder à demanda de sua fábrica de Camaçari, na Bahia. Vai inovar criando o terceiro turno e registrando a carteira de mais dois mil funcionários. É tudo o que os trabalhadores da Bahia queriam. Não afeta a previsão oficial modesta de crescimento do PIB para este ano (3,5%), mas empurra o emprego para frente.