A crise econômica atravessou o rio da Prata. Com fortíssimos laços econômicos com a Argentina, o Uruguai segue rumo a seu quarto ano consecutivo de recessão. O desemprego, hoje em 15%, bate recorde atrás de recorde. Os títulos da dívida uruguaia já são considerados pelas agências de risco como investimento perdido. A população reagiu e até incorporou o argentiníssimo panelaço nas (por enquanto) esparsas manifestações de rua. O governo de Jorge Battle também se mobiliza para afastar o fantasma do “efeito tango” nos pampas uruguaios. Um pacote de ajuda de US$ 1 bilhão, suficiente para salvar os bancos, está prestes a ser concluído. Em troca do cheque, o Fundo Monetário Internacional (FMI) exigiu um profundo reajuste fiscal, que deve cortar em até 60% as despesas dos governos locais.

O soluço uruguaio começou em 1999, quando o Brasil desvalorizou o real. Com um mercado interno de apenas três milhões de pessoas, o país é extremamente vulnerável aos seus parceiros de Mercosul. “O fluxo comercial com o Brasil caiu perto de 50% desde então”, constata o presidente da Câmara de Comércio Uruguai-Brasil, Marcino Fernandes Rodrigues Jr. Ao mesmo tempo, a Argentina começava a dar seus primeiros passos rumo ao abismo. “Historicamente, o país depende muito mais da Argentina do que do Brasil”, diz o presidente da Associação das Empresas Brasileiras para Integração de Mercados, Michel Alabi.

Sustentado primordialmente pelo setor agrícola, o Uruguai sofreu também nos últimos anos com surtos de febre aftosa, que afetaram o comércio bovino. Mas foi só quando a crise chegou ao sistema financeiro que o mundo percebeu que o país passava por problemas sérios. O Uruguai só não é chamado explicitamente de paraíso fiscal para não ferir suscetibilidades patrióticas, tal a liberdade de trânsito de capitais que os estrangeiros encontram por lá. Em janeiro, o Banco Central local suspendeu o problemático Banco Galícia, o preferido dos argentinos, que, assustados com a quebradeira dos bancos locais, passaram a investir seus dólares no Uruguai. O dinheiro que entrou com vigor até dezembro do ano passado partiu de lá com pressa aos primeiros sinais de debilidade dos bancos. Um boato que circulou nas últimas semanas – completamente sem fundamento, diga-se – da criação de um “corralito” nos bancos uruguaios (nos moldes do bloqueio de depósitos feito na Argentina) só agravou a corrida aos saques.

O bilhão do FMI está prestes a sair. É consenso entre os economistas de lá que o dinheiro vai reequilibrar o sistema bancário. Mas, para voltar a crescer, a ajuda não basta. Ajustes fiscais costumam causar (ou aprofundar) o processo recessivo. O peso uruguaio já se desvalorizou cerca de 30% em três anos. Até o fim do ano, seu valor deve cair ainda mais, o que pode reequilibrar o fluxo de comércio internacional. Mas, como dois bons dançarinos de tango, o Uruguai só deve mesmo se reerguer quando sua parceira Argentina encontrar o passo certo.