A entrega do prêmio O
Brasileiro do Ano, da revista ISTOÉ, antecipou a festa da democracia, marcada para
1º de janeiro, quando o presidente Fernando Henrique Cardoso passará o leme do País para Luiz Inácio Lula da Silva.
No palco do DirecTV Music Hall, em São Paulo, FHC e Lula apareceram pela primeira vez juntos num evento público
e trocaram calorosos elogios, ergueram os braços de
mãos dadas, selando a mais democrática transição da história. O clima de confraternização por um novo Brasil contagiou políticos, empresários e personalidades presentes à festa. Também
no palco, o homenageado Aécio Neves, que deixou a presidência da Câmara para assumir o governo de Minas, deu as mãos ao petista
José Dirceu, futuro ministro da Casa Civil. A prefeita Marta Suplicy (PT)
e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) repetiram o gesto sob aplausos do público que lotou a casa na noite de segunda-feira 16.

“Eu quero agradecer ao Domingo Alzugaray, que é um gênio. Colocou
o Lula e eu juntos, felizes”, disse Fernando Henrique, que recebeu das mãos do editor e diretor responsável da Editora Três o prêmio especial
de O Brasileiro da Década. Lula, premiado com O Brasileiro do Ano, emocionou Fernando Henrique com seu discurso. Saudou-o como “meu caro amigo” e chamou os governadores eleitos do PSDB, Aécio e
Alckmin, de companheiros. Seguindo a linha do improviso, que tem pautado suas aparições, Lula brincou com Abraham Kasinsky, escolhido
O Empreendedor do Ano pela ISTOÉ Dinheiro: “Quando vocês assistirem na tevê ao nosso amigo Kasinsky andando com aquelas vespas que
ele está produzindo, deve ser montagem de algum marqueteiro. Ele parece um menino aos 85 anos. Espero que Deus me conceda a graça
de chegar aos 85 com esta saúde.” Em seguida, a “bola da vez” nos cumprimentos foi Aécio: “Meu companheiro de futebol, de quem sempre ganhei.” O petista saudou do palco o adversário tucano José Serra,
que se levantou da platéia e foi muito aplaudido. Lula não conteve
as generosas doses de bom humor ao falar de suas lágrimas em
público. Ele ressaltou que muitos brasileiros anônimos poderiam estar recebendo a homenagem. “Eu sobrevivi fazendo apenas o necessário: sobreviver. Depois, me tornei adulto fazendo o que era possível e
hoje ao receber esse prêmio acho que consegui fazer o impossível,
coisa que espero realizar em quatro anos de mandato”, afirmou, dedicando ao povo brasileiro o prêmio que recebeu do editor
e diretor responsável da Editora Três, Domingo Alzugaray.

O presidente eleito fez questão de lembrar a civilidade que marca
sua relação com FHC. No entanto, não abriu mão das divergências, principalmente no futebol: “Como bom corintiano e bom santista que somos, a gente torce e vai por caminhos diferentes. Mas o dado concreto é que esse processo de transição que estamos fazendo
no Brasil será um novo marco na política nacional.” Emocionado com
as palavras de Lula, FHC disse que quase chorou pela segunda vez naquele dia. “Há poucos instantes descerramos um retrato em homenagem a Mário Covas e me lembrei dele; e agora ao ouvir o Lula falar, confesso que minha voz embargou.” Em seguida, corrigiu o petista dizendo que não há divergências no futebol porque ele é corintiano
e não santista e que na política elas estão cada vez menores. “Quero dizer que nós tivemos mais divergências no passado do que hoje. Tenho visto tantas convergências nas últimas semanas. Estou muito feliz. Não digo isso com ironia, mas com alegria.” FHC, que foi aplaudido de pé, recordou que conheceu Lula em 1973, quando atuava como secretário
do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo-Diadema.
“Ele foi ao Cebrap com Paulo Vidal, que era o presidente do sindicato.
E, se hoje nós podemos assistir a esse momento de transição política
que assume essa forma civilizada, é porque começamos lá atrás a fazer com que esse Brasil fosse um pouco mais civilizado.” O presidente FHC arrancou risos dos presentes ao dizer que estava arrependido de ter afirmado, no início do primeiro mandato, que era fácil governar o Brasil. “Ai, meu Deus, que arrependimento! Não era fácil não. Mas é um país generoso, capaz de se refazer, que tem condições de avançar por
mais que venham ventanias de fora. E vem mesmo. Dou a mão ao
futuro. Quero que o Brasil avance mais e mais para o benefício de
todos.” Ao receber o Brasileiro da Década, que ofereceu ao futuro
do Brasil, brincou com Domingo Alzugaray, lembrando que o dirigente
da Editora Três era o responsável pelo clima de confraternização entre
as matizes políticas das mais diversas: “Nós gostamos da confusão,
mas da confusão produtiva como esta que passamos neste momento. Não é bem confusão, mas purificação: sentimentos, vontades, maneiras de ver o mundo, transformação.” Ao concluir, admitiu, emocionado,
que seria fácil chegar às lágrimas “porque quando a gente está
chegando ao fim do mandato há uma certa nostalgia”.

Ao abrir a festa da entrega dos prêmios conferidos pela Editora Três nas categorias Brasileiro do Ano (ISTOÉ), Empreendedor do Ano (ISTOÉ Dinheiro) e Personalidade do Ano (ISTOÉ Gente), que homenageou 15 personalidades que se destacaram em 2002, Alzugaray comemorou também os 30 anos da empresa. Ao lado do filho Carlos Alzugaray, diretor executivo da editora, ele lembrou que em
1972 a empresa funcionava em duas salas alugadas e tinha cinco funcionários. E hoje são 1.500 trabalhadores e 25 mil metros quadrados de área construída próprios. Ressaltou ainda que a editora produz hoje 40 milhões de exemplares de revista por ano e que a gráfica tem capacidade para produzir até 100 milhões. “Fazemos um jornalismo crítico, investigativo, mas construtivo, sempre a serviço do Brasil
na procura de seu destino de grande nação.” A emoção não poupou Alzugaray ao pedir licença aos homenageados e convidados para
um agradecimento especial a sua mulher e sócia, Cátia Alzugaray,
que estava na platéia. “Ela compartilhou momentos difíceis comigo
e enfrentou todos os percalços. Ela tornou essa noite possível porque quando a conheci, há 43 anos, uma bela carioca de Copacabana,
foi que decidi não voltar para Argentina e ficar no Brasil. Esta foi
a melhor decisão da minha vida”, confessou sob aplausos.

Na categoria Política de O Brasileiro do Ano, o prêmio foi dividido
entre um tucano e um petista: Aécio Neves – que desponta como
uma nova liderança ao eleger-se governador de Minas já no primeiro turno – e José Dirceu – principal articulador político da vitória de Lula.
O mineiro Aécio ressaltou o papel do Legislativo sob sua batuta e falou do momento político atual: “Nessas últimas eleições, iniciou-se um novo ciclo político no Brasil, independentemente das nossas convicções doutrinárias, que cobra de todos nós colaboração, solidariedade
com a construção desse novo tempo. Presidente Lula, de Minas,
do alto daquelas montanhas, não lhe faltará solidariedade.” Dirceu
disse ter gostado de compartilhar a homenagem com um mineiro
como ele, e sem fugir do tom da festa emendou: “Somos de
partidos diferentes, mas somos democratas e tenho certeza que estaremos juntos com o presidente Lula para governar o Brasil.”

Na categoria Área Social, Milú Villela, presidente do Comitê
Brasileiro do Voluntariado, foi a primeira homenageada pela ISTOÉ.
Ela adiantou que seguirá investindo nos jovens, que serão sua
prioridade. “Vou continuar trabalhando para que a sociedade cresça
cada vez mais em sua dimensão solidária. Fernando Meirelles, diretor
do filme Cidade de Deus, foi o premiado na categoria Cultura. Ele parabenizou a editora pelo seu 30º aniversário e brincou: “Juntar
esta rapaziada no final do ano só mesmo com muita moral.”

Emocionada, Sônia Nazário de Lima representou o filho Ronaldo,
eleito O Brasileiro do Ano no Esporte. O prêmio foi entregue pelo
diretor de redação de ISTOÉ, Hélio Campos Mello. Um dos principais responsáveis pela conquista do pentacampeonato mundial pela
Seleção Brasileira, o atleta foi escolhido pela Fifa o melhor jogador
do mundo em 2002. “Agradeço esse título com um beijo no coração
de cada um de vocês. Esse foi um ano fundamental na vida de
Ronaldo”, afirmou, com a voz embargada. Após a cerimônia, ela
explicou que o filho só seria liberado pelo Real Madrid no dia 23.

Abraham Kasinsky, aos 85 anos, dono da montadora Kasinski,
emocionou a platéia ao receber o prêmio de Empreendedor do Ano de Carlos José Marques, diretor de redação da revista ISTOÉ Dinheiro. A humildade deu o tom: “Não acredito que tenha sido homenageado. Eu não passo de um motoqueiro.” O ex-dono da Cofap, holding de autopeças vendida em 1998, surpreendeu quando não se aposentou e inaugurou a fábrica de motocicletas. Entre os convidados da festa, outros empresários e executivos de peso como Pedro Piva, da Klabin, Ivan Zurita, da Nestlé, Hugo Miguel Etchenique, da Brasmotor, Carlos Jereissati, Joseph Safra, Mário Amato, Wagner Canhedo, Eugênio Staub, Antoninho Marmo Trevisan e o futuro ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Luiz Fernando Furlan, celebravam a premiação. Outros quatro empreendedores foram eleitos: Gabriel Jaramillo, na categoria Finanças; Samuel Klein, vencedor da categoria Comércio; Chieko Aoki, da área de Turismo; e Maurício Botelho, o melhor do setor industrial. Klein, dono da rede Casas Bahia, comentou, com modéstia: “Estou muito orgulhoso de estar num evento que conseguiu reunir desde um simples comerciante como eu até dois presidentes da República.”

ISTOÉ OS BRASILEIROS DO ANO25/12/2002

 

Na categoria Finanças, o colombiano Gabriel Jaramillo preside
a filial brasileira do banco espanhol Santander há três anos e,
em 2002, transformou o Banespa no banco mais lucrativo do Brasil. Maurício Botelho se destacou como presidente da Embraer, a
quarta maior fabricante de aviões do mundo. Ele arrancou risos
da platéia: “Num negócio como este, o mais lerdo voa”, brincou.
A empresária Chieko Aoki, dona da Blue Tree, maior administradora
de hotéis do País, conseguiu aumentar o faturamento da rede em
19% em um ano, apesar do efeito 11 de setembro. Aoki disse
que o prêmio foi “um presente de Natal inesperado e glorioso”.

Cercada de glamour, a festa da Editora Três lembrou a cerimônia de entrega do Oscar. Com a entrada do DirecTV tomada por empresários, políticos e celebridades, fotógrafos e cinegrafistas disputavam os melhores ângulos. Uma equipe da Rede Globo entrou ao vivo no Jornal Nacional para anunciar que William Bonner, editor-chefe do noticiário, deixava de apresentá-lo naquela noite para receber o Prêmio Personalidade do Ano, concedido pela revista IstoÉ Gente. Amaury Jr. e Otávio Mesquita gravavam entrevistas com famosos, como Viviane Senna e Luiza Brunet. Na platéia, Marina e Patrícia de Sabrit, Supla e a nova namorada, Isabel Ibsen, Nizan Guanaes e João Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, ex-executivo da Globo, aplaudiam os homenageados. O publicitário Duda Mendonça foi o primeiro a receber seu troféu, entregue pelo diretor de redação de IstoÉ Gente, Luciano Suassuna. Eleito a Personalidade do Ano na área de Comunicação, o marqueteiro do PT disse: “É um orgulho ser premiado por ajudar Lula nesse momento tão importante da vida nacional. Tenho certeza de que ele será o presidente que todos nós queremos.” Ao som da música criada por Rita Lee em sua homenagem, a jornalista Marília Gabriela recebeu o prêmio de Personalidade do Ano em Televisão. Vestindo um longo preto da grife Huis Clos, a apresentadora roubou a cena ao cumprimentar as duas maiores estrelas da política. “Naquele momento percebi a importância daquele encontro de notáveis e resolvi quebrar o protocolo. Quis me despedir de FHC e dar as boas-vindas a Lula”, comentou.

A top model Ana Hickmann não conseguia esconder o nervosismo. Aos 21 anos, com sete de carreira, ela foi eleita a Personalidade do Ano na Moda. A bela tremia dentro do seu vestido cor-de-rosa desenhado por Alexandre Herchcovitch. “Receber um prêmio desta importância ao lado de dois presidentes e de tantos profissionais respeitados é simplesmente inacreditável. Estou com frio na barriga até agora”, declarou. Mais escolado, o cantor e futuro ministro da Cultura Gilberto Gil agradeceu a sua eleição como Personalidade do Ano na Música com a segurança de quem tem 40 anos de palco. “O combinado era ficar calado. Mas já que sou obrigado, digo ‘obrigado.’” Antes da cerimônia, o músico e outros profissionais homenageados haviam combinado não fazer discurso. Destaque do ano por sua brilhante atuação nos debates durante a campanha pela Presidência, William Bonner dividiu o mérito da premiação com sua equipe. Em determinado momento, se atrapalhou: “Certamente existe a certeza de que…”. Mas, sem perder o humor, emendou: “Certamente existe a certeza de que eu estou muito nervoso.” Ele concluiu lembrando que FHC e Lula estão proporcionando ao povo brasileiro a mais bela transição de governo da história.

Ela não estava concorrendo a nenhum prêmio, mas bem que merecia ganhar o troféu de Rainha da Noite. Escalada para fazer um pocket show na celebração dos 30 anos da Editora Três, Rita Lee deu
um banho de animação. “Queria ter visto os dois presidentes e fazer-lhes algumas reivindicações”, comentou. “Perguntaria
a FHC se ele votou mesmo no Serra
e daria tudo para ver o Lula chorando. Vê-lo aos prantos me faz lembrar aquela cena final de Bambi”, brincou. Rita apresentou canções de seu CD, Aqui,
ali, em qualquer lugar
, e lembrou sucessos como Alô, alô marciano, celebrizado na voz de Elis. Entre uma música e outra, brindava o público
com pérolas do tipo: “Minha geração chegou ao poder! E eu que me lembro do Zé Dirceu falando em cima dos caminhões de som enquanto eu viajava de ácido e pensava: ‘Esse cara é bom, ele é roqueiro.’”

Criticando a indústria das celebridades, a cantora lembrou que hoje em dia é só inventar um factóide para aparecer nas revistas. “Desde que se separou, Ana Maria Braga foi capa de cinco”, enumerou. Imitando os trejeitos de Kelly Key, Rita lembrou que a garota foi destaque por ter brigado publicamente com o ex-marido Latino e depois removido a tatuagem com o rosto dele que havia feito na perna. Em seguida, fantasiada de Gal Costa, com direito a estola de penas roxas e peruca, cantou o sucesso tropicalista Baby imitando os trejeitos dela. Ao ver o senador Eduardo Suplicy na fila do gargarejo, provocou: “Solteiro, Eduardo?” Foi o suficiente para Rita sentar em seu colo e começar a brincar: “Você quer casar comigo? Seremos capa de todas as revistas” e emendou: “Supla é meu filho com o Suplicy.” O roqueiro subiu ao palco para cantar uma música dos Beatles junto com Rita. A cantora também se solidarizou com Sônia Nazário, mãe de Ronaldo, que teve suas visitas discriminadas pelos moradores do condomínio na Barra da Tijuca onde mora seu filho: “Aquela vizinhança é muito brega.” No momento do bis, quando já se preparava para deixar o palco, o cartunista Paulo Caruso, a fez cantar à capela: “Que tal nós dois numa banheira de espuma…” Já no camarim, Rita elogiou o evento. “É gratificante cantar para um público tão prestigiado.” De quebra, a tiazona do rock deu bronca em Supla: “Lamento informar, filhinho, mas você errou a letra!”

Sara Duarte