Na mitologia, Vênus é a deusa do amor, da beleza e representa a feminilidade. Pode ainda simbolizar a luxúria e a vaidade. Na astronomia, o planeta Vênus é o segundo no Sistema Solar e, depois da Lua e do Sol, é o astro mais exuberante e brilhante do céu. Se não bastasse, cientistas americanos sugerem que, além do planeta Marte e Europa – uma das luas de Júpiter –, seria possível a existência de vida na atmosfera venusiana. Ao contrário da inóspita superfície de Vênus, que possui pressão 90 vezes maior que a da Terra e temperaturas que atingem 460ºC, sua atmosfera é mais parecida com a terrestre e suas temperaturas oscilariam entre 30ºC e 80ºC. Essas condições seriam propícias ao desenvolvimento de bactérias. Toda essa aura que envolve Vênus pode explicar por que poetas, músicos e apaixonados em geral vêem o planeta como uma eterna fonte de inspiração. Conhecido na Grécia antiga como Phosphóros, a estrela matutina, e Hisperos, estrela vespertina, no Brasil ele foi imortalizado como Estrela D’Alva, graças à canção carnavalesca de Noel Rosa e João de Barro.

Um evento astronômico raro, que aconteceu pela última vez em 1882, promete atiçar ainda mais os fãs desse planeta. Na terça-feira 8, acontecerá o que os astrônomos chamam de trânsito de Vênus, um fenômeno que ocorre quando o planeta se alinha entre a Terra e o Sol. O chamado minieclipse ocorre em par, isto é, a primeira aparição depois do intervalo de 122 anos é seguida por uma segunda, oito anos depois. O próximo alinhamento será em 2012, quando o planeta estará do outro lado do Sol, mas o fenômeno será invisível no Brasil. Nem todo mundo verá o trânsito deste ano, mas os observadores privilegiados conseguirão acompanhar um pequeno ponto escuro no disco solar. Os astrônomos estão de prontidão. “Esse acontecimento é extremamente raro, mais do que um eclipse total ou a passagem de um cometa”, diz Amâncio Friaça, astrônomo da Universidade de São Paulo (USP).

Desde que o astrônomo alemão Johannes Kepler previu que o fenômeno celeste aconteceria em 1631, os cientistas sabiam que seria possível criar uma unidade padrão para medir distâncias interplanetárias. A primeira observação comprovada ocorreu em 1639 pelos astrônomos ingleses Jeremiah Horrocks e William Crabtree, mas foi no trânsito de 1761 e 1769 que o astrônomo Edmond Halley criou o método usado até hoje para calcular grandes distâncias no espaço. Dois observadores colocados em pontos diferentes e distantes um do outro registrariam as imagens durante o fenômeno. A diferença no deslocamento de Vênus no disco solar, o chamado paralaxe, indicaria a distância entre a Terra e o Sol. A partir desses dados, várias expedições foram organizadas para calcular o que hoje é conhecida como Unidade Astronômica (UA), uma espécie de régua astronômica.

O Brasil teve uma importante participação em 6 de dezembro de 1882, quando o Imperial Observatório do Rio de Janeiro, atual Observatório Nacional, organizou três expedições. A que foi chefiada pelo astrônomo Luis Cruls, em Punta Arenas, na Patagônia, chegou ao resultado de 149,4 milhões de quilômetros de distância, muito próximo da medida aceita oficialmente de 149,5 milhões. O imperador d. Pedro II, um admirador das ciências, fez questão de enviar os resultados pessoalmente à Academia de Ciências de Paris. Com a UA definida, hoje a observação do fenômeno é mais histórica, mas não menos importante. “Será interessante comprovar a margem de erro da medida, que é bem pequena, para poder melhorar cálculos futuros”, assegura Marcomede Rangel, físico do Observatório Nacional. Além disso, o fenômeno pode proporcionar a realização de outros estudos. “Podemos pôr em prática técnicas para detectar a existência de planetas em torno das estrelas. Como o ofuscamento solar, que retira artificialmente o brilho do Sol”, diz Friaça.

Como tudo que se refere aos astros, não é só na astronomia que o trânsito de Vênus causa rebuliço. Para a astrologia, o evento pode significar mudanças importantes no mundo. Uma delas é a maior participação feminina em questões de destaque. “Estudando os outros trânsitos, observei muitos casos de mulheres que entraram para a história devido a fatos ocorridos em ocasiões próximas às datas em que Vênus cruzou o disco do Sol”, garante Celisa Barenger, presidente do Sindicato de Astrólogos do Rio de Janeiro. Segundo a estudiosa, a influência do fenômeno pode começar até um ano antes e perdurar por mais algum tempo. Ela cita os casos da princesa Isabel e da musicista Chiquinha Gonzaga, personalidades importantes que tiveram destaque no período do último trânsito, em 1882. “Este ano estamos vendo uma maior participação das mulheres na Olimpíada de Atenas, por exemplo”, afirma. Coincidência ou não, o Comitê Olímpico Brasileiro vai levar 224 atletas, sendo 106 mulheres, já considerado um número recorde. Em Sydney, a delegação feminina contava 94 atletas.

Por estar entre as órbitas da Terra e do Sol, Vênus é considerado um planeta interior. Para muitos estudiosos, isso significa uma forte influência no interior das pessoas. “Isso mexe com o amor-próprio, simboliza o lado da sensibilidade. Como o evento acontece na casa de gêmeos, isso favorece também a comunicação”, diz o astrólogo paulista Valderson de Souza. Para a astróloga Maggy Harrison, o momento vai trazer benefícios na convivência social. “Haverá mais prazer através dos amigos, capacidade de perdoar os erros alheios, refinamento dos sentimentos e do intelecto e maior capacidade de apreciação da beleza, da poesia e da música”, garante. Uma dose a mais de inspiração às vésperas do Dia dos Namorados e num momento em que o mundo clama por paz.