O presidente George H. Bush saiu da guerra do Iraque com 90% de aprovação do eleitorado americano. Seis meses antes das eleições, porém, ele enfrentava 54% de desaprovação ao modo como sua política econômica era conduzida, e 53% de opiniões negativas sobre seu governo. George H. Bush, o 41º presidente dos Estados Unidos, perderia as eleições para o democrata Bill Clinton, em 1992. O filho, George W. Bush, 43º presidente, depara com estas mesmas porcentagens preocupantes no mesmo período, em 2004. Com um agravante: 60% do país não vê com bons olhos sua performance na ocupação do Iraque. “Nos últimos 100 anos, nenhum presidente candidato à reeleição conseguiu manter o cargo com estes números no mês de maio”, diz o marketeiro político Ross Springfield, ligado à campanha do democrata John Kerry. Este tipo de tabu político, sabe-se, está situado mais no folclore político do que na categoria das ciências exatas, e pode ser quebrado a qualquer momento. “Nenhum vice-presidente candidato à Presidência em tempos de paz e prosperidade perdeu as eleições que disputou, até que George W. Bush bateu Al Gore no ano 2000”, diz Michael Harris, analista do Partido Republicano. Mas, fora desta batalha, a realidade é que a campanha Bush-Cheney para a reeleição está ameaçada.

Até mesmo os soldados do pelotão mais conservador do Partido Republicano – os que dão maior apoio ao presidente – estão manifestando suas preocupações com o andar da carruagem de Bush. “A percepção é a de que o presidente não está conseguindo passar sua mensagem ao povo americano. Com os problemas que enfrentamos no Iraque, corre-se o risco de que estas eleições se transformem num plebiscito nacional sobre a política do governo Bush na ocupação daquele país”, diz o senador republicano Trent Lott, do Mississipi, ex-líder da maioria no Senado e um dos maiores defensores desta administração. O coro dos descontentes republicanos já cantava em allegro fortissimo, quando o presidente Bush embarcou em uma série de seis discursos que procuraram explicar sua política iraquiana e tentar apontar saídas para o atoleiro da ocupação. Pelo que se viu depois dos primeiros pronunciamentos, essa meta não foi atingida. Os comentaristas políticos e as pesquisas de opinião pública demonstram que a maioria nacional não captou nenhuma mensagem positiva e nada de novo na verborragia otimista da Casa Branca. A situação torna-se ainda mais delicada com a saída do diretor da CIA, George Tenet, que apresentou sua carta de demissão a Bush na quarta-feira 2. Em discurso emocionado, Tenet disse: “Não tomei esta decisão de forma apressada ou fácil, mas meu coração me diz que este é o momento oportuno para avançar para uma fase seguinte na vida.”

Mas uma pesquisa conduzida pela AP/Ipsos mostrou números mais alentadores para o presidente. Com 42% das intenções de voto, ele arranca um empate técnico com o rival John Kerry, que tem o apoio de 45% dos eleitores. “Estes números são enganosos. Na mesma pesquisa, o candidato a candidato Ralph Nader (independente) aparece com 11% das preferências. Destes eleitores, 49% disseram que votariam em Kerry, caso Nader não estivesse na corrida. Outros 29% afirmaram que não votariam em ninguém, se Nader a abandonasse”, diz o analista democrata James Carville. “Ninguém sabe o que passa pela cabeça de Nader. A esperança é que seja feito algum tipo de acordo entre ele e Kerry para evitar a vitória de Bush. E esta subida do presidente nas pesquisas se deve aos US$ 41 milhões gastos por seu comitê de campanha em publicidade negativa nas televisões contra Kerry”, diz Carville.

De todo modo, John Kerry não ganha pontos enquanto Bush desliza nas pesquisas. Os ataques democratas a Bush não vêm do candidato democrata, mas de Al Gore, que tem martelado com gosto aquele que o abateu nas eleições de 2000. “Kerry parece apático. As pessoas podem não gostar de Bush, mas não conhecem direito o outro candidato”, diz o analista Jacob Towns. A tática da campanha democrata, na verdade, está seguindo a cartilha do guru republicano Lee Atwater, ex-chefe de campanha de George Bush pai e suposto criador da estratégia de guerra de lama contra seus adversários políticos. Atwater, morto em 1991, ensinava a deixar à própria incompetência o rival que estivesse trocando os pés pelas mãos. “Se o oponente está se debatendo no lamaçal, o melhor a fazer é deixá-lo se sujar cada vez mais, e sair de perto para que a atenção da platéia não se desvie. Quem se aproxima, corre o risco de receber respingos de lama”, dizia. É exatamente isso que o comitê de campanha de Kerry tem feito. “Estrategicamente, o melhor no momento é deixar o presidente se enrolar cada vez mais. Durante e depois da convenção democrata (em Boston, no mês de julho), Kerry terá oportunidade de se mostrar ao país e oferecer seu programa como a melhor alternativa ao governo Bush”, diz Carville.