O maior negócio da dinastia Chong no Brasil foi montar um grupo de 300 policiais federais, militares, civis e fiscais da Receita Federal a fim de que o chinês naturalizado brasileiro Law Kin Chong pudesse operar impunemente seu principal negócio: o contrabando. Ele pagaria de propina por mês a seus colaboradores cerca de 10% de seu faturamento (R$ 5 milhões). O tigre asiático escapou ileso da operação Anaconda, apesar de telefonemas comprometedores ao delegado da PF de São Paulo José Augusto Beline. O policial foi preso, mas Chong não foi denunciado formalmente, uma vez que sua modalidade criminosa não tinha a ver com venda de sentenças. O império do felino, no entanto, começou a ruir quando a PF de Brasília e a CPI da Pirataria deram início ao que foi batizado de Operação Gatinho. Dono de 600 lojas, três shoppings, casa de câmbio em São Paulo, sem contar as fábricas de produtos falsificados em sua terra natal, Chong foi preso na terça-feira 1º, depois de oferecer US$ 1,5 milhão ao presidente da CPI, deputado Luiz Antônio Medeiros (PL-SP). O contrabandista queria seu nome fora do relatório da CPI. O banquete chinês oferecido ao parlamentar previa ainda uma mesada de R$ 30 mil mensais pela indicação de um delegado “amigo” para a Delegacia Antipirataria do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic) e fotos de orientais nuas.

O despachante aduaneiro Pedro Lindolfo Sarlo, que se apresenta como advogado e amigo de senadores e ministros do Judiciário, foi preso em flagrante pela polícia quando entregava US$ 58,8 mil, parte dos US$ 375 mil da primeira parcela do suborno, que seria pago em quatro suaves prestações. A entrega do dinheiro foi feita no escritório político de Medeiros. A apuração da tentativa de suborno começou há dois meses e meio, quando uma pessoa procurou o gabinete do deputado. A PF de São Paulo, a exemplo do que aconteceu na Operação Anaconda, quando foi preso entre outros o juiz Rocha Mattos e policiais federais, não foi informada da ação da PF de Brasília para não levantar suspeitas de colegas que teriam boas relações, como o megacontrabandista. Medeiros, que está sob proteção policial, afirma que tem peixe grande na rede de Chong. O parlamentar pediu ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, uma limpeza nas polícias de São Paulo e foi mais além, ao levantar suspeitas sobre políticos e membros do Judiciário. “Ele tem uma rede de proteção da Justiça, das polícias e tem proteção no meio político”.

A Operação Gatinho desencadeou nova crise entre a direção da PF em Brasília e a superintendência da instituição em São Paulo. Irritados por terem ficado de fora da ação, delegados se reuniram na federação nacional da categoria e decidiram apresentar em assembléia a proposta de transferência coletiva. “Se há suspeição, queremos deixar claro que não fazemos parte de pacote”, reagiu o presidente da federação, delegado Armando Coelho. Depois do incêndio, Daniel Sampaio,
que chefiou as buscas e apreensões nos escritórios de Chong, jogou água na fervura ao desmentir que os trabalhos foram executados escondido da PF-SP. “A compartimentação faz parte do trabalho. Eles não devem ficar melindrados.Trata-se de uma polícia única.” A intensidade do fogo será medida após o resultado das investigações nos computadores e nas agendas do chinês, que foram levadas para Brasília, assim como o seu dono.

Apesar das gravações em vídeo das “negociações” e dos grampos telefônicos, o contrabandista espera se ver livre das grades. Os advogados de Chong dizem tratar-se de uma armação e vão se valer da súmula do STF que desconsidera flagrante preparado. Enquanto divide cela com os presos das Operações Anaconda e Vampiro, o rei da muamba reage usando do estilo chinês. Perguntado sobre o que achou da sua prisão respondeu: “Todos sabem que o deputado Medeiros é incorruptível. Foi uma brincadeira de mau gosto.”


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