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Assim o ex-presidente Getúlio Vargas referia-se ao Tribunal de Contas da União: “É o arquivo para onde nós mandamos os amigos.” Na semana passada, uma das nove cadeiras do TCU foi a voto no plenário da Câmara. Vale ouro. Dá direito a ocupação vitalícia, salário atual de R$ 23 mil, gabinete amplo, carro, motorista e poderes para criar ou aliviar dores de cabeças em prefeitos, governadores e até no presidente da República. Os petistas indicaram o amigo do peito Paulo Delgado (MG). Os pefelistas apostaram no parceiro Haroldo Cedraz (PFL-BA). Os tucanos se assanharam com o deputado Gonzaga Motta (CE). A primeira medição de forças na Câmara depois da eleição presidencial exprimiu um resultado límpido: o governo perdeu feio. Mesmo dividida, a oposição elegeu Cedraz com 172 votos e ainda obteve outros 50 para Motta. Delgado conseguiu insuficientes 148 indicações.

 
 
Eleição de Haroldo Cedraz para o TCU tem tudo para causar mais dores de cabeça para o governo “Nossa bancada precisa parar de fazer maluquices”, dizia pelos corredores da Câmara o deputado pernambucano Maurício Randes, um petista em alta com seus colegas. É a segunda vez que, em razão da voracidade e pressa da bancada, o presidente Lula perde na escolha de um ministro do TCU. No ano passado, o PT lançou para uma das vagas o deputado José Pimentel (CE), derrotado por Augusto Nardes, do PP. Hoje, Nardes é o relator no TCU das obras da Operação Tapa-Buracos, de reforma das estradas brasileiras. Ele tem-se especializado em pedir explicações para centenas de contratos. Desta vez, pode ser até pior. Ex-secretário estadual na Bahia, o eleito Cedraz é ligado ao gabinete do senador ACM. Político ciente de que a vingança é um prato frio, ACM pode usar sua carta no TCU para criar problemas para Lula a curto prazo.
 
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Uma alternativa para aplacar os ânimos foi apresentada ao governo pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo. Ele parte do princípio de que a oposição não deve ser esmagada porque, se não der certo, a fúria empregada se volta contra o agressor. Espartano, também acredita que vitórias políticas mal devem ser comemoradas. “Há sempre o risco de humilhar os perdedores”, acredita. Nestes quadrantes de conciliação, ele concluiu que a vitória de Cedraz se daria em qualquer circunstância. Passou a apoiá-lo, esperando em troca o voto dos oposicionistas em matérias do interesse do presidente Lula e, claro, votos para se reeleger em fevereiro. “Aldo sabe que a política é um jogo de compensações”, diz um de seus auxiliares. Em seguida à eleição para a cadeira de ouro do TCU, o líder do PFL, Rodrigo Maia, foi ao gabinete de Aldo. “Obrigado por cumprir a palavra empenhada”, registrou.

 
A disputa em torno do TCU praticamente dinamitou as chances de o petista Arlindo Chinaglia (SP) eleger-se presidente da Câmara. Estimulado pelos remanescentes do grupo do ex-ministro José Dirceu, Chinaglia não passou pelo teste básico de garantir ao menos o apoio da base governista para Delgado. “Fui o único orador do meu próprio enterro”, comentou, com alta dose de ironia, o próprio Delgado. Ele foi identificado como o nome ligado a Chinaglia e pagou por isso. Teoricamente, Delgado deveria obter os votos dos deputados do PMDB. O partido, afinal, faz parte da base governista. Uma reunião da bancada à tarde, no entanto, já dava sinais de possível traição na votação secreta. Os pemedebistas reclamavam dos “maus-tratos” do governo na distribuição de cargos e verbas, cobrando a liberação até o final do ano de R$ 1,2 bilhão em emendas parlamentares.
 
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“Não é possível que nós vamos ficar sempre cometendo os mesmos erros”, preocupa-se o deputado Renato Casagrande (PSB-ES). O rei do baixo-clero Severino Cavalcanti foi eleito presidente da Câmara na brecha de uma disputa entre os governistas. Na ocasião, sem acordo, o PT lançou na disputa dois nomes, Luiz Eduardo Greenhalgh (SP) e Virgílio Guimarães (MG). Agora, o PT insiste em lançar Chinaglia, mas Lula prefere Aldo. A persistir, essa divergência tende a fortalecer dois outros reis do baixo-clero: o deputado Inocêncio Oliveira (PE), em plena campanha, e o azarão Ciro Nogueira (PI). Qual deles o PT prefere?