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Foi sob gritos de independência que Laura Mintegui, líder do partido Euskal Herria Bildu, saudou o resultado das eleições parlamentares no País Basco na segunda-feira 22. O herdeiro político do ilegalizado partido Batasuna alcançou 21 dos 75 assentos, o que configura a maior vitória da esquerda nacionalista basca desde 1998. “É hora de começar a pensar como país e de parar as ordens que chegam de Madri”, disse Laura. Seu discurso deixa claro que, exatamente um ano depois de o grupo terrorista ETA anunciar sua renúncia à violência, a região autônoma está pronta para seguir os passos da Catalunha e impor ao governo central um referendo que responda à sua histórica demanda por independência.

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INSTABILIDADE
Sucessivos protestos em Madri mostram o grau de descontentamento com o governo

Não faltará força política para isso. O êxito do estreante EH Bildu se soma à previsível vitória do tradicional Partido Nacionalista Vasco (PNV), que ocupará 27 assentos no Parlamento. Ainda que as duas legendas tenham enormes divergências ideológicas (o PNV é de direita e o EH Bildu, de esquerda), juntos eles têm dois terços das cadeiras e anulam o Partido Socialista e o Partido Popular, ambos centralistas. A vitória dos nacionalistas não é inédita, mas mostra que uma explosiva conjunção de crise econômica e descontentamento social está ameaçando a frágil unidade espanhola, criada pela submissão de reinos e territórios autônomos ao longo da história. “Mais autogoverno é mais bem-estar”, sentenciou Iñigo Urkullo, líder do PNV. Por bem-estar, ele se refere à melhora da preocupante situa­ção econômica da região. Entre 2009 e 2012, a dívida pública do País Basco subiu de 4% para 11% do PIB e o número de desempregados saltou quatro pontos percentuais, chegando a 14,6%.

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Tudo isso leva a um aumento daquilo que a imprensa espanhola vem chamando de “tensão nacionalista”. No caso da Catalunha, presidida pelo soberanista Artur Mas, a situação é ainda mais evidente e a cisão parece depender só do tempo. Segundo um projeto aprovado pelo parlamento catalão em setembro, um referendo deverá ser realizado dentro de quatro anos. Se o pleito fosse hoje, a opção pela independência ganharia com 53% dos votos. Esse índice chegaria a 68% entre os mais jovens – não por coincidência, os mais afetados pela dura crise financeira. Entre o empresariado, as opiniões não são diferentes: 67% dos donos de pequenas e médias empresas são a favor da soberania catalã.

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A força do movimento soberanista na Catalunha nunca foi tão evidente. No início de outubro, poucas semanas após uma marcha que reuniu mais de um milhão e meio de pessoas em Barcelona, 100 mil nacionalistas aproveitaram a simbologia – e a visibilidade – do clássico de futebol entre o Real Madrid e o Barcelona para lembrar a derrota catalã diante das tropas do rei Felipe V em 1714. Aos 17 minutos e 14 segundos da partida, o grito de “independência” e as cores da bandeira catalã tomaram o estádio de Camp Nou, que pertence ao Barcelona. O jogador do Barça Xavi Hernandez deixou claro que o futebol pode e será usado como aglutinador dessa causa: “O Barcelona representa a Catalunha e estaremos sempre ao lado do que queiram os catalães.”

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A mensagem nada sutil dos catalães e, agora, também dos bascos, enfureceu o cambaleante primeiro-ministro Mariano Rajoy e os setores militares. “Independência da Catalunha? Só por cima do meu cadáver e do cadáver de muitos soldados mortos”, disse o coronel do Exército Francisco Alamán. Esse tipo de reação dramática, que não encontra paralelo em processos de secessão como o que vem sendo negociado entre a Escócia e a Grã-Bretanha, pode aprofundar as disputas territoriais e desvirtuar um processo que, dada a pressão popular, é quase inevitável. Mesmo sabendo que a independência das regiõe­s autônomas demanda tempo, discussões e ajustes profundos nas leis nacionais e europeias, Rajoy tem dado sinais de impaciência que só debilitam ainda mais sua liderança. Sua legenda, o PP, amargou a pior derrota nas urnas bascas desde 1990. Se quiser evitar o mesmo fatídico destino na Catalunha, que celebrará suas eleições municipais no dia 25 de novembro, Rajoy e seu partido deverão considerar a mudança de estratégia. O primeiro-ministro parece estar consciente disso. Na semana passada, que foi marcada por mais uma jornada de violentos protestos em Madri pelo fim das políticas de austeridade, Rajoy decidiu viajar a Barcelona e embarcar de vez na campanha eleitoral regional. “É muito cômodo colocar a culpa em Madri e logo pedir que o governo financie seu déficit”, afirmou. “Nós jogaremos essa partida.” 

Fotos: Vincent West/REUTERS e Alvaro Barrientos/AP Photo
Fotos: REUTERS/Andrea Comas e Denis Doyle/Getty Images


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