Uma das leis informais mais importantes do futebol reza que o torcedor, como o próprio nome anuncia, está aí para torcer os fatos. O publicitário Washington Olivetto e o jornalista Nirlando Beirão encontraram a expressão quase completa dessa tese no divertido e comovente Corinthians –
É preto no branco
(DBA, 263 págs., R$ 38), quarto livro da série Camisa 13, sobre os grandes clubes brasileiros. É preto no branco é paixão em alto calibre. Olivetto, corinthiano apostólico romano, e Nirlando, mineiro com pegada de lorde, mas atleticano “por DNA” – portanto acostumado às grandes emoções –, partem de uma idéia original para construir o Corinthians dos sonhos.No final de 1999, Olivetto recebeu um amigo americano, o publicitário Edward McCabe, sujeito bacana, apaixonado por esporte, mas “cego” de tudo para esse negócio de bola.

McCabe desembarcou no dia em que o Corinthians conquistaria o tricampeonato brasileiro. Olivetto o levou ao estádio e o gringo, comovido, entregou-se à fúria da fiel. De Nova York, McCabe passou a cobrar notícias do “Coouruingao”.A realidade acaba na primeira carta de Olivetto. Episódios como a democracia corintiana, a invasão do Maracanã por 70 mil “fiéis” em 1976 e o gol de Basílio contra a Ponte Preta no ano seguinte, que tirou o time da fila de 23 anos sem títulos, viram delírios luminosos.Burilado pela prosa rococó chique de Nirlando, o turbilhão de idéias de Olivetto leva o Timão ao epicentro do futebol. As mentiras “sinceras”, o preto no branco, estão no início dos capítulos. A “verdade dos outros” aparece no final, em letras claras sobre páginas negras.Em preto no branco, descobre-se, por exemplo, “o dia em que o Timão decidiu emprestar um crioulinho talentoso (Pelé) a um time de segunda do interior (Santos)”. Pelé jamais jogou no Corinthians – assim, pelo menos, dizem “os outros” lá no “pretão”.

A conquista do Estadual de 1977, o fim de 23 anos de jejum de títulos, é apresentada como “rotina”. Vicente Matheus, o filósofo, o gênio rigoroso e absoluto do pensamento, provou ser também um poderoso visionário, na medida em que, com o agradecimento à Antarctica pelas “brahmas” doadas ao Corinthians, previu com muita antecedência o surgimento da Ambev.

Há algo de poético naquele torcedor que, anabolizado no boteco por pingas e geladas, escala aquele time fantástico da final do ano tal e, na bruma da ressaca seguinte, admite que o zagueiro genial, àquela altura, tinha sido vendido e o lateral maravilhoso, emprestado.Não importa – o que vale são a paixão e as sensações – a das biritas incluídas, evidentemente. Olivetto e Nirlando radiografam esses sentimentos com elegância e bom humor. Tem são-paulino dizendo que o livro é ilustrado com cem fotos por motivos óbvios.Afirmam que há fotos de Ademir da Guia e de Ricardinho para agradar são-paulinos e palmeirenses, ou seja, os alfabetizados, e assim vender livros.

Também há “porcos” apostando que a liderança do Timão no campeonato de vendas da série só será consolidada se houver lançamento em audio book.

Fatos torcidos. Mas, se tiver coragem, o leitor do outro lado da arquibancada não se arrependerá de comprar o livro. Uma boa tática é dizer aos amigos que é para queimá-lo num belo ponto de macumba.

Preto no branco é boa leitura para os que ainda se emocionam com o futebol. E para os que, como o amigo gringo de Olivetto, não diferenciam falta de pênalti, mas identificam beleza em histórias bem contadas sobre fidelidade e paixão.