É um dinheirão que vai se transformar em panelas, rodas de carro, aviões, perfis de portas e janelas, automóveis, ar condicionado… O alumínio, invenção de um americano nascido em Thompson, no Estado de Ohio, Charles Martin Hall (1864-1914), está em tudo. Nos Estados Unidos, um carro tem pelo menos 200 quilos de alumínio (aqui tem menos de 90 quilos). O processo de produção é complicado e não se realiza sem energia, que representa 35% do custo de produção. Foi por falta de energia que a Alcoa, maior fabricante do produto no mundo, passou alguns anos sem pôr dinheiro no Brasil. Há duas semanas, a Eletronorte ganhou um leilão para fornecimento de energia por 20 anos e daí veio a segurança que a empresa precisava para investir. “Com essa garantia, vamos iniciar uma série de projetos que vai totalizar em quatro anos US$ 1,4 bilhão”, diz Josmar Verillo, presidente da Alcoa América Latina. A capacidade da fábrica de São Luís, no Maranhão, vai duplicar e a empresa iniciará um projeto de mineração de bauxita, matéria-prima do alumínio, no Pará. A melhor notícia é a criação de 1.200 empregos diretos e mais 3.600 indiretos; no período da construção a expectativa é de 14 mil pessoas, entre diretos e indiretos.

Verillo, 52 anos, ex-presidente da Klabin, onde trabalhou por 13 anos, administrador de empresas e economista, na direção da Alcoa América Latina desde janeiro de 2003, é um executivo de alto nível de competência e nível zero de arrogância, o que torna qualquer conversa com ele muito agradável. Nasceu em Ribeirão Bonito, no interior de São Paulo, onde passa a maior parte de seus finais de semana. Participa de uma organização não governamental que combate a corrupção nas prefeituras do interior e, como pessoa física, junto com a ONG Amarribo (Associação dos Amigos de Ribeirão Bonito) e com o apoio da população local, já derrubou um prefeito corrupto de Ribeirão Bonito. Sua conversa com ISTOÉ:

ISTOÉ – Quando foi tomada essa decisão de investir no Brasil?
Josmar Verillo –
Nós estávamos há alguns anos sem fazer um grande investimento no Brasil por insegurança na questão da energia, fundamental para a produção de alumínio. Sem resolver o problema não dá para fazer um investimento pesado desse jeito. Com o contrato com a Eletronorte, pudemos definir nossos investimentos. As expectativas são de que esses investimentos cresçam até US$ 5 bilhões.

ISTOÉ – Como está sendo a reestruturação da Alcoa no Brasil?
Verillo –
Nós saímos de alguns negócios, por exemplo a fabricação de garrafas
pet e a fabricação de latas, para nos concentrar na produção do alumínio.
O faturamento deu uma caída em função da venda desses negócios. Nós faturávamos cerca de US$ 1 bilhão por ano (no mundo inteiro a empresa fatura
US$ 22 bilhões), passamos para US$ 800 milhões neste 2004, mas com esses projetos pretendemos ultrapassar rapidamente US$ 1 bilhão. A Alcoa era líder até uns anos atrás e hoje está na terceira posição. Com os novos projetos provavelmente vamos recuperar a liderança.

ISTOÉ – O que está faltando para destravar o crescimento do País e estimular decisões como a da Alcoa?
Verillo –
Acho que o governo poderia ir um pouco melhor nessa parte de incentivo à produção, criação de emprego. Isso não é nenhuma crítica. Esse governo assumiu um país que estava com a questão da dívida muito apertada. Se não reduzir a dívida não consegue reduzir a taxa de juros. Por isso que o superávit primário (a economia que o governo faz) tem de ser tão grande, para permitir a saída da armadilha da dívida. Ou não há como. É um dilema entre promover o crescimento primeiro e com isso tentar sair da armadilha da dívida ou provocar um superávit forte, reduzir a dívida para daí poder reduzir os juros e crescer. O que eu acho é que poderia melhorar a distribuição da carga tributária, que é muito grande e acabou fazendo com que quem pagava vai pagar mais e quem não pagava continua não pagando. Isso cria uma dificuldade muito grande para ser competitivo, especialmente no mercado doméstico, e está levando muitas grandes empresas que não conseguem concorrer a se voltar para as exportações. Com isso o mercado doméstico está empobrecendo muito. Só informais conseguem produzir e vender. O governo também deveria trabalhar mais tirando os entraves para investimento. Tem muita burocracia, essa incerteza de altos e baixos. Precisamos passar uma imagem de estabilidade, mais um incentivo para as empresas, especialmente as estrangeiras, investirem aqui. Precisamos das estrangeiras. Só a poupança do Brasil não é suficiente para gerar os empregos que precisamos.

ISTOÉ – A violência incontrolável e a corrupção também afastam investidores?
Verillo –
Recentemente, uma empresa americana do setor químico, se não me engano, decidiu suspender todos os seus planos de investimentos quando um de seus executivos foi sequestrado no Rio. Em muitos casos, profissionais que são transferidos para o Brasil ganham mais (por causa dos riscos) e a empresa tem que proporcionar um esquema de segurança enorme para a pessoa aceitar vir para cá. Isso custa caro. Outro ponto no qual o governo tem de ter uma ação mais forte é o combate à corrupção. Nós, da ONG, temos um estudo que estima que o dinheiro desviado de prefeituras soma perto de R$ 50 bilhões por ano. Só eliminando essa corrupção o governo traria os recursos que lhe estão faltando. Pegou uma falcatrua, tem que afastar o prefeito, não pode ficar esperando a Justiça decidir. Nesse caso, nós temos que mudar nossa lei.

ISTOÉ – O sr. acha que um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB)
de 3% é suficiente para crescer?
Verillo
– Para o Brasil é pouco. Pelo número de pessoas novas que estão entrando no mercado de trabalho, o Brasil precisaria crescer no mínimo 5% ao ano durante muitos anos. A China, por exemplo, vem crescendo a 7%, 8% ao ano. Neste ano estavam crescendo 9% e o governo teve que tentar desacelerar. Um país que está crescendo assim vai melhorar a qualidade de vida das pessoas, é a única maneira, não tem milagre. Da parte do empresariado há a maior boa vontade em relação ao crescimento do Brasil. Nós, desde o princípio do ano passado, anunciamos essa intenção de investir no Brasil. Distribuição de renda tem o seu motor na educação. Programas sociais são importantes numa emergência, mas o governo não pode imaginar tocar um país dando cesta básica.