O entardecer da quarta-feira 9 de abril em Bagdá marcou o fim do regime de Saddam Hussein e o início da era dos falcões da Casa Branca. Lá na praça Al Firdus, a derrubada da estátua do ex-ditador iraquiano, estrategicamente postada em frente aos hotéis ocupados pela imprensa internacional, forneceu a forte simbologia para os dois eventos. Como preliminar ao grande espetáculo que viria a seguir, as câmeras começaram a mostrar ao mundo a ocupação da praça pelos tanques e carros de combate das tropas americanas. E aquelas imagens produziram também a surpresa pela constatação da facilidade e rapidez com que a cidade foi conquistada. Aos poucos, os habitantes de Bagdá foram chegando e se aglomerando na praça, e a estátua de Saddam tornou-se o alvo da catarse. Seu pedestal foi exaustivamente espancado por uma marreta, que passou de mão em mão enquanto a estátua era escalada para que uma corda fosse passada em volta de seu pescoço. Mas a tarefa de botar abaixo o ditador era demais para aqueles iraquianos. A estátua só veio abaixo, num feérico grand finale, depois que um soldado americano, ignorando a corda dos iraquianos, passou pelo pescoço de Saddam uma grossa corrente que, rebocada por um carro da engenharia do Exército, trouxe abaixo a gigantesca imagem. Antes de derrubar o ditador, o soldado hasteou em sua cara a bandeira americana, deixando para a posteridade a inequívoca autoria do feito. Mas o símbolo também serve como alerta, pois marca a vitória dos falcões de Bush – a turma liderada pelo secretário de Defesa Donald Rumsfeld e seu auxiliar Paul Wolfowitz – e o início de uma era de incertezas para o resto do mundo. Bagdá demorou muito pouco para ser conquistada e cobrou poucas vidas de soldados americanos, e isso coroou e legitimou, dentro do ninho dos falcões, a nova doutrina de invadir antes de perguntar.

Mas, se morreram poucos soldados americanos, o mesmo não se pode dizer dos civis iraquianos. A Cruz Vermelha não consegue dar conta dos mortos e feridos. A única certeza é que já chegam a milhares. Um deles é o menino Ali Ismael, de apenas 12 anos, que teve sua casa atingida por um bombardeio americano. Ele perdeu o pai, a mãe grávida de cinco meses e o irmão. O pequeno Ali perdeu também os dois braços. E, como um símbolo desta barbárie, sua tragédia deve ser usada para reconstruir em novos moldes o poder da ONU e de seu Conselho de Segurança para que se possa de alguma maneira aparar as garras dos falcões do império.