Antes mesmo do depoimento do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) no Conselho de Ética, nesta terça-feira 15, o cheiro de pizza já está impregnando o Senado. Conversas dos líderes do governo e da oposição começam a definir a fórmula para baixar o fogo e livrar o mandato de ACM do pré-cozimento. Em volta do forno, os senadores discutiram saídas. Uma solução mezzo a mezzo seria aplicar a ACM uma suspensão do mandato entre 60 e 90 dias, pelo envolvimento no megagrampo baiano que xeretou a vida
de centenas de pessoas. Apesar do formato redondinho para salvar as aparências, essa receita deixou ACM irritado. O senador quer só
a crua absolvição. O pedido de abertura de processo corre o risco de ser congelado pela Mesa Diretora do Senado, onde ACM teria os
votos de quatro dos sete titulares. O do presidente, José Sarney (PMDB-AP), e os de Romeu Tuma (PFL-SP), Heráclito Fortes (PFL-PI)
e Alberto Silva (PMDB-PI). O voto mais hostil seria o de Paulo Paim (PT-RS), restando dúvidas sobre a posição de Eduardo Siqueira Campos (PSDB-TO) e Sérgio Zambiasi (PTB-RS).

Uma coisa é certa, a pizza terá um sabor apimentado. O relator, Geraldo Mesquita (PSB-AC), deve pedir abertura de processo por quebra de decoro, mas não explicitaria a punição. O objetivo seria evitar o voto secreto no Conselho: se o relator indicar a punição (suspensão ou cassação), os senadores serão protegidos pelo sigilo do voto – o que em tese favorece ACM. Para evitar queimar a língua nessa fase, ACM estuda até mesmo não comparecer ao depoimento e enviar a defesa por escrito, com o filtro do advogado. Votado o relatório, o texto é enviado para a Mesa, a quem cabe decidir se haverá processo. É aqui que os aliados de ACM acreditam que a pizza estará no ponto. A Mesa negaria o pedido do Conselho e, se algum partido entrar com recurso, ele será julgado pelos próprios integrantes da Mesa.

O que confunde os aliados de ACM é o efeito da estratégia na opinião pública. Como ninguém mais duvida que ACM meteu mesmo a mão
na massa dos grampos, o PFL tenta fritar o argumento de que não estaria provado o crime de mando e, por isso, não haveria cassação.
“O envolvimento dele é inequívoco. Vai haver punição”, disse o senador Demósthenes Torres (PFL-GO). Os pefelistas não conseguem explicar o fato de que, na violação do painel do Senado, ACM foi obrigado a renunciar mesmo com as provas apontando o ex-senador José Roberto Arruda como mandante. A estratégia dos senadores pode desandar na PF, onde as investigações estão superaquecidas. O delegado Gesival Gomes deve indiciar ACM por vários delitos,
entre eles formação de quadrilha.

A denúncia do megagrampo foi feita por ISTOÉ em 7 de fevereiro. Apontado como suspeito número 1, ACM se apressou em dizer que
não tinha nada a ver com o caso. Afirmou que ignorava os grampos
até ser aconselhado por advogados a engolir em seco e não comentar mais o assunto. Mas, em alguns casos, ACM não conseguiu recuar.
No Jornal Nacional do dia 10 de fevereiro, ele diz textualmente:
“Ignorava totalmente a existência de qualquer grampo, como ignoro. Agora, acho que deve ser apurado com todo rigor para saber se ele existiu ou não.” A senadora Heloísa Helena (PT-AL) vai requisitar a cópia da entrevista. “Essa entrevista é mais um elemento. Já existem provas gravíssimas, mais que suficientes para perda do mandato”, diz ela, referindo-se às cartas de ACM coincidentes com o grampo e a gravação onde ele confessa seu envolvimento.

Os conteúdos dos grampos também foram parar no Correio da Bahia, jornal de propriedade da família de ACM. O grampo do dia 12 de julho de 2002 registra uma conversa do deputado Geddel Vieira Lima (PMDB) sobre a nomeação de um aliado no município de Juazeiro (BA). Cinco dias depois, o colunista do Correio, Antônio Jorge Moura, dá detalhes da indicação com o título “O homem de Geddel”. No dia 30 de julho o grampo transcreve as conversas de Geddel sobre obras nos municípios baianos de São Félix e Candeias. O mesmo colunista publica uma nota com uma incrível semelhança com o grampo. No mesmo dia 30, o grampo registra a conversas de Geddel sobre as verbas publicitárias do Denatran. Cinco dias depois o fato é registrado na nota “Dinheiro no Denatran”. O jornal desativou a coluna de Moura depois do escândalo explodir, mas ele não foi esquecido pela família de ACM. Desde o dia 13 de fevereiro Moura está lotado no gabinete do deputado federal Antônio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) em Brasília, com o salário de R$ 2.587.

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