A arte engajada está de volta. Os artistas – até Madonna entrou no jogo – voltam a protestar. Engajados, não são mais guerrilheiros que se escondem em guetos. Têm a seu favor a grande opinião pública, excetuando-se a opinião pública americana. Mas essa não conta. É peculiar. Graças ao senhor George W. Bush, o antiamericanismo é um sentimento globalizado. Exceção para o pessoal que vê o mundo como morador de Omaha, Nebraska.

Existe quem boicote o McDonald’s. Mas o antiamericanismo mais bem fundamentado, com lastro e cultura, teria que brotar nos países
da Comunidade Européia. Não podia ser diferente. Como uma cebola, a cabeça de Bush foi sendo descascada no chamado velho continente. Sobrou o quê? Os métodos e estilos da Comunidade Européia versus os do senhor Bush que parecem uma trágica confrontação entre a civilização e a barbárie.

Por estes motivos, a exposição Artequeune, recém-inaugurada nas esplêndidas e climatizadas (tão pouco usadas, que pena!) instalações do Conjunto Cultural da Nossa Caixa, em Brasília, é oportuna. Foi mero acaso, mas o embaixador da Grécia, Stratos Doukas, decidiu que o evento cultural do seu mandato como representante da União Européia no Brasil seria reunir o “olhar europeu” sobre o Brasil. Recrutou o curador do acervo da Nossa Caixa, Wagner Barja, e saíram à cata de artistas europeus que passaram pelo Brasil. De preferência os que viveram aqui.

A primeira surpresa de Doukas e Barja: o “olhar europeu” e dominador na relação colonizado x colonizador é absorvido e devorado pelo encanto dos “nativos”. Dessa mastigação surge um novo personagem, o artista estrangeiro criando uma obra transfigurada pela dura e às vezes tão doce realidade brasileira. Estabeleceu-se uma quase imediata e reveladora mestiçagem. Do processo de desmanche, os estrangeiros saem enriquecidos – um novo artista, mais ingênuo em certos aspectos, porém mais criativo e vigoroso. O próprio nome da exposição é uma armadilha: Artequeune. Lido rapidamente, passa a idéia de palavra indígena. Mas é apenas a arte unindo pessoas que nasceram aqui ou ali. Há surpresas. Estão lá artistas que deixaram em algum lugar do passado a sua condição estrangeira: Yolanda Mohalli, Nicolas Vlavianos, Fayga Ostrower, Frans Krajcberg. E Alfredo Volpi, que era italiano de Lucca. Ou o simplório e ao mesmo tempo sofisticado português Antonio Poteiro. Ninguém queimou a bandeira dos Estados Unidos na inauguração. Era um evento sereníssimo. Diplomático.