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Essas colagens são como eternos retornos? Personagens periodicamente vão e voltam, entram e saem de cena?
Retornos de memória, sim. Hoje eu não trabalho mais com o conceito, só com a memória. O artista está sempre colocando o conceito antes. Eu antes faço o trabalho para depois conceituar.

Então essa relação das Monalisas com o cinema apareceu depois?
Apareceu durante, no fazer. Mas antes havia o livro do Tarkovsky, que eu já tinha lido. Quando dei aula para vocês, eu só falava de Duchamp. Hoje eu tenho cinco livros de cabeceira. Esculpir o tempo, Tarkovsky. Porque o tempo é o principal mote do cinema. Depois, peguei o Pirandello, porque todo teatro do Pirandello é um jogo, e a questão do jogo me atrai muito. Depois, peguei “A Poética do Espaço”, do Bachelard, porque ele tem uma visão psicológica e antropológica do espaço. Ele fala de um outro espaço. Do espaço que está no canto, no cofre, na gaveta, no armário, naquela tua bolsa. Gosto dessa ideia de me relacionar com um espaço que não é o meu.

O espaço que não é o seu é o desconhecido. Esse também não é o espaço da arte?
Com a arte, você abre o cofre. Enquanto que, se o cofre está fechado, você sempre poderá imaginar tudo o que está lá dentro. Não é só dinheiro. Posso guardar a própria arte dentro do cofre. Pelo valor. Então, você pode pensar a arte como dinheiro, dentro do cofre. Veja bem, você roda muito mais não lendo sobre arte. Depois vem a fotografia, que eu acho que tem muita importância, hoje. Daí eu pego o Barthes, “A Câmara Clara”. Por quê? Porque acho muito bacana a percepção dele da fotografia como não fotógrafo. E no fim o Duchamp, né? O livro do Octavio Paz sobre Duchamp, “O Castelo da Pureza”. Octavio Paz escreve sobre dois gênios: Duchamp e Picasso. Picasso pelo que fez, Duchamp pelo que não fez. E eu estou no meio! Não chego nem a fazer, nem a deixar de fazer, como Duchamp. Por isso é que eu me sinto, de certa maneira, frustrado. Porque eu não atingi nem o fazer – por mais que eu faça, não sinto que a arte para mim é essa compulsão do Picasso. E Duchamp pelo que não fez: 35 anos jogando xadrez. E o xadrez que ele joga vira arte! E a vida dele se torna arte! Isso eu também não consigo fazer.