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APARÊNCIA No solo congelado de Marte há bactérias adormecidas, não mortas

 

Um dos mistérios que mais intrigam e incitam a curiosidade humana é saber se estamos mesmo sozinhos no universo. Se depender de um estudo publicado na semana passada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), uma das mais conceituadas publicações científicas do mundo, aumentaram sensivelmente as possibilidades de a resposta ser não – ou seja, há vida extraterrena. Longe de ela ser mais uma forma de vida de ficção científica com seres exóticos ou dotados de superpoderes, dessa vez o que está em questão, no mundo real da ciência, são bactérias capazes de sobreviver por milhares de anos incólumes à ação do tempo e em condições ambientais extremas.

Um dos grandes desafios era compreender como essas bactérias conseguiam manter o seu material genético inalterado após anos de congelamento e como esse material se mantinha em aparente estado latente. Imaginava-se que as células, ao “zerarem” o seu metabolismo, não mais seriam capazes de corrigir imperfeições que inevitavelmente surgiriam em seu DNA – ou seja, a sua sobrevivência estaria naturalmente comprometida. No estudo recém-publicado, coordenado pelo biólogo dinamarquês Eske Willerslev, da Universidade de Copenhague, os pesquisadores descobriram que as bactérias aparentemente dormentes, diferentemente do que se julgava, não paralisam suas atividades vitais. Embora num ritmo mais leve, seu metabolismo permanece funcionando, o que impede uma degradação total do material genético: o DNA permanece vivo.

A equipe de pesquisadores analisou amostras desses microorganismos que datam de cerca de 600 mil anos, todas elas recolhidas nos chamados “permafrosts” – leia-se solo congelado de regiões como Sibéria, Antártida e Canadá. Ou, também, leia-se solo congelado de Marte. Assim, se as bactérias estudadas, cujo DNA está sendo estimado como o mais antigo do mundo, sobrevivem por mais de seis milênios nesses solos na Terra, por que não sobreviveriam nesses mesmos solos em Marte? Durante um período de nove meses, essas amostras foram mantidas a 10ºC negativos em um ambiente onde inicialmente não existia gás carbônico. Dessa forma, os pesquisadores puderam constatar, por meio de medições, a constante produção desse gás. E essa é a surpreendente comprovação de que as células das bactérias continuavam a respirar. Com os resultados da pesquisa, os biólogos chegaram à conclusão de que ainda pode existir um grande número desses microorganismos vivos em solos congelados – sobretudo no solo marciano onde já se descobriu gelo, indício claro de que, em algum dia remoto, também lá existiu água. Além disso, a descoberta de bactérias tão resistentes e a maneira como se mantêm vivas expostas a condições tão adversas pode colaborar com estudos acerca da evolução das espécies. Se a Terra não é o limite, os autores da pesquisa atentam para um fato interessante: as condições extremas de temperatura registradas em algumas regiões da Terra repetem-se, por exemplo, nos pólos de Marte e em uma das luas de Júpiter. Portanto, se no Sistema Solar realmente existiram formas de vida semelhantes às nossas bactérias, é certa a possibilidade de que elas ainda resistam nos permafrosts de outros planetas. Estamos nos aproximando, enfim, da comprovação de que o universo é mesmo grande demais para estarmos sozinhos nele. E as bactérias parecem ser a única forma de vida que, até agora, deu certo – ou seja, muitas delas não foram extintas e, mesmo quando parecem mortas ao longo de 600 mil anos, estão apenas “descansando”. Com seu DNA vivo.

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