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Novos-ricos: Page (à esq.) e Brin, os criadores do site

A sede da empresa mais badalada da internet parece um parque de diversões. No estacionamento do prédio em Mountain View, na Califórnia, ficaram famosas as partidas de hockey sobre patins entre os funcionários do Google, o mais visitado mecanismo de pesquisa da rede mundial de computadores. Na cozinha, quem prepara as refeições para os mais de mil empregados é Charlie Ayers, chef da banda de rock psicodélica Grateful Dead. Está nos banheiros, porém, a maior extravagância: toaletes digitais japoneses com tantas funções quanto um videocassete. Ao preço de U$ 800 cada um (cerca de R$ 2.500), eles são equipados com controle remoto para ajustar a temperatura do assento, a direção e a pressão dos jatos d’água.

Ninguém mais estranha ver um dos fundadores da empresa, o americano Larry Page, 31 anos, circular de skate pelos corredores. O site criado em 1998 por Page e pelo russo Sergey Brin, 30 anos, seu colega na Universidade de Stanford (EUA), se tornou um dos mais rentáveis negócios da história da internet. Para criá-lo, os estudantes de ciência da computação pediram dinheiro emprestado aos professores, à família e a todos os amigos. Em 1999, quando celebrava um ano, a empresa recebeu verba de US$ 25 milhões de dois fundos de investimento. Na semana passada, ao fazer a oferta pública de suas ações (IPO) na Bolsa de Valores de Nova York, a estimativa era de que o Google valia pelo menos US$ 20 bilhões, 800 vezes mais.

O gigante das buscas anunciou na quinta-feira 29 sua tão esperada entrada no mercado de ações e dois bancos investidores assumiram a negociação, o Morgan Stanley e o Crédit Suisse First Boston. Com a abertura do capital, o site passará a ter uma cotação na Nasdaq, índice no qual estão listadas as empresas de tecnologia. E passará a fazer algo jamais feito antes: abrir suas contas para o mundo. Page, Brin e o executivo Eric Schmidt, 48 anos, que preside a empresa e completa o triunvirato que comanda o Google, mantêm segredo sobre os bastidores do site. Algumas cifras já se tornaram públicas, como o lucro, em 2003, de US$ 105,6 milhões. Especula-se que na estréia do pregão sejam arrecadados US$ 2,7 bilhões.

A idéia brilhante de criar um site para organizar a pesquisa na caótica internet surgiu para suprir um desejo tão simples quanto típico da natureza humana. Estamos sempre à procura de algo, o que inclui perder peso, fazer trabalhos de escola, trocar de parceiro, comprar um carro novo, relógio, roupas, livros ou o que a imaginação permitir. Para dar conta do recado, os bancos de dados do Google estão espalhados por milhares de computadores, que processam, a cada minuto, quase 140 mil consultas em 90 idiomas, entre eles o português.

Com um design simples, a página da enciclopédia virtual usa um sistema de palavras-chave para vasculhar a rede mundial. O processo se baseia numa tecnologia patenteada pelo Google, o PageRank, que avalia sites e calcula os resultados mais importantes a partir de algoritmos matemáticos. Inútil dizer que aparecer no topo da lista de respostas pode valer alguns milhares de dólares. Apesar disso, os co-fundadores Page, Brin e o veterano da indústria de software Eric Schmidt consideram blasfêmia cobrar para mostrar os resultados de uma consulta. Eles juram que as buscas no Google são feitas de “modo honesto e objetivo para encontrar websites de alta qualidade, facilmente”. Há quem duvide.

O dinheiro que engorda o cofre dos empresários prodígio é tanto que sua entrada na Bolsa vai colocá-los entre os homens mais ricos do mundo. Por deterem um terço das ações da companhia, Brin e Page teriam nas mãos algo próximo de US$ 9 bilhões. A última grande especulação em torno de um negócio na área de tecnologia foi em 1995, quando o Netscape fez sua estréia na Nasdaq. Mas o Google terá de enfrentar alguns obstáculos para se estabelecer como um investimento seguro: os dois principais chamam-se Yahoo e Microsoft.

Até fevereiro, o portal Yahoo usava o sistema de buscas do Google, garantindo que o site efetuasse três em cada quatro pesquisas na rede. De lá para cá o Yahoo passou a usar um sistema de buscas próprio. Munido das informações sobre seus 141 milhões de usuários, elaborou um mecanismo de pesquisa que só apresenta aquilo que o consumidor deseja. De olho nessa estratégia, o Google anunciou em 1º de abril o Gmail, um serviço de e-mail gratuito com capacidade de um gigabyte. É 250 vezes mais do que os 4 megabytes oferecidos pelo Yahoo, e dez vezes mais do que um dos pacotes do Hotmail, que oferece 100 megabytes por US$ 60 ao ano. Em troca, o Google fazia uma única exigência: a de vasculhar o conteúdo das mensagens. E usá-las para conhecer melhor o perfil de seus clientes com o objetivo de oferecer respostas e veicular anúncios publicitários condizentes com seus hábitos de consumo. A notícia provocou balbúrdia, e 28 entidades de defesa de privacidade chiaram.

Ao disponibilizar tanta memória, o Google está cutucando a Microsoft, pois espera que os usuários deixem de armazenar arquivos no computador pessoal para guardá-los no Gmail. A gigante de Bill Gates já tem resposta para a provocação. A Microsoft desenvolve um sistema de buscas que será integrado ao Windows. Na próxima versão do programa, prevista para 2006, esse mecanismo buscará um arquivo em documentos de texto, em e-mails e na internet. Tudo indica que será dura a guerra dos serviços de busca, que movimentaram US$ 2 bilhões em 2003 e devem render US$ 4,8 bilhões em 2005. A caça a esse tesouro já começou.