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Depois da conclusão do item cinco da denúncia do mensalão, com a condenação de três ex-diretores do Banco do Rural por gestão fraudulenta na última quinta-feira, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) voltam hoje ao ponto quatro, que trata dos saques realizados na instituição financeira. Além da cúpula do banco, estão na berlinda outros réus acusados por lavagem de dinheiro, como Marcos Valério e seus sócios, além de funcionários da agência de publicidade SMP&B.

O primeiro a proferir seu voto na sessão desta segunda-feira é o relator, Joaquim Barbosa. Ao pedir a condenação dos réus ligados ao Rural na última semana por gestão fraudulenta, ele já havia antecipado que também deve seguir a mesma postura em relação ao crime de lavagem de dinheiro. "Os réus ao atuarem dolosamente na simulação de empréstimos, com manifesta infringência das normas, incorreram tanto no crime de gestão fraudulenta como de lavagem de dinheiro", afirmou no dia 3 de setembro.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), os dirigentes do banco José Roberto Salgado, Kátia Rabello, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane negociaram empréstimos fraudulentos que abasteceram os cofres do PT e do valerioduto. A denúncia apontou que a instituição tinha esperança de obter vantagens na liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco. De acordo com as defesas dos réus, todo o dinheiro que circulava nas contas da SMP&B vinha de outras instituições financeiras e, portanto, não haveria como sugerir que tinham origem ilícita.
 
Na última quinta-feira, o advogado de Kátia Rabello, José Carlos Dias, afirmou que os ex-diretores da instituição não podem ser enquadrados no crime de lavagem de dinheiro, já que houve entendimento que os empréstimos fictícios configuraram gestão fraudulenta pelos executivos. "A lavagem estaria integrada na figura da gestão fraudulenta. Seria um bis in idem condenar duas vezes pelo mesmo fato", disse Dias.
 
Kátia Rabello, ex-presidente e acionista majoritária do Rural, e José Roberto Salgado, ex-vice-presidente, foram condenados por unanimidade por gestão fraudulenta. Vinícius Samarane, que à época dos empréstimos era superintendente e hoje é vice-presidente da instituição, teve apenas dois votos pela sua absolvição – do revisor, Ricardo Lewandowski, e do ministro Marco Aurélio Mello. Já Ayanna Tenório, ex-vice-presidente, foi declarada inocente do crime de gestão fraudulenta por nove ministros.
 
De acordo com os ministros, ficou evidenciado que os empréstimos do banco às empresas de Valério e ao PT foram simulados. Alguns dos magistrados foram além e sugeriram que o Rural ajudou financeiramente o PT por meio de Valério. "Desde o início do processo foi revelado à saciedade que o núcleo financeiro deu apoio, através de um núcleo publicitário, para uma agremiação partidária", afirmou o ministro Luiz Fux, que chegou a classificar o Rural de "lavanderia de dinheiro" que cometeu "gestão tenebrosa". Assim como nos outros dois capítulos analisados, o voto do relator deve ocupar toda a sessão de hoje. O próximo a proferir seu voto sobre o item quatro é o revisor do processo, Ricardo Lewandowski.
 
Próximas votações
 
Após a conclusão do ponto quatro da denúncia, o julgamento deve prosseguir com a análise do item seis, no qual são detalhados os saques realizados por políticos no Rural. Serão julgados integrantes do PP, PL, PTB e PMDB, além de membros dos núcleos político, publicitário e financeiro, acusados de corrupção ativa em relação à compra de votos. Entre eles estão José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. O capítulo sete tem como foco os saques feitos no Rural por petistas e pelo ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. O penúltimo capítulo, o oitavo, é dedicado à evasão de divisas e lavagem de dinheiro atribuídas aos publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes.
 
Por fim, o capítulo dois deverá levar ao plenário do Supremo o ápice do julgamento. É nesse ponto que estão descritas as condutas de Dirceu, Delúbio e José Genoíno, ex-presidente do PT, que resultaram na acusação de formação de quadrilha.
 
O mensalão do PT
 
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
 
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
 
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
 
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
 
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
 
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
 
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.