Aos 56 anos, o industrial Luiz Fernando Furlan largou a empresa da família (a gigante Sadia) para assumir o desafio de elevar de US$ 60 bilhões para US$ 100 bilhões as exportações brasileiras. Em 100 dias no papel de ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Furlan diz que se o governo tivesse partido para uma política mais agressiva de desenvolvimento logo de saída, estaríamos em situação pior.

ISTOÉ – O que mais o assustou nesses 100 dias?
Luiz Fernando Furlan –
A herança de problemas e desafios que precisam ser ajustados. Para construir um cabedal de credibilidade, o novo governo teve que realizar cortes extraordinários, gerar superávits primários monstruosos e uma política de juros elevados. Foi algo totalmente contrário ao pensamento do presidente, mas que se tornou necessário. Foi um contexto provocado por circunstâncias da campanha eleitoral e do cenário externo. Esses fatores geram um pouco de angústia.

ISTOÉ – Por quê?
Furlan –
É preciso fazer algumas coisas rapidamente, mas elas não podem ser feitas porque existe um período no qual precisamos mostrar aos agentes do mercado e à sociedade que a equipe de governo tem condições de gerenciar o processo. Essa é a angústia maior.

ISTOÉ – O que está sendo adiado?
Furlan –
Seria importante reduzir impostos sobre investimentos.
Mas os indicadores são muito positivos. Estamos comemorando
a queda do risco Brasil.

ISTOÉ – Os aumentos da taxa de juros e a política de arrocho não dificultam a sua interlocução com empresários?
Furlan –
Não. Diferentemente do passado, há um compromisso explícito de que os impostos não serão aumentados. O governo corta para dentro em vez de tirar da sociedade, como sempre aconteceu. É uma demonstração de austeridade interna.

ISTOÉ – Seus antecessores sempre esbarraram em objeções da equipe econômica. O sr. teme repetir essa sina?
Furlan –
Eu digo à minha equipe que não raciocino sobre coisas do passado. Nós estamos aqui para equacionar os problemas. O resultado é de equipe. Quem ganha o jogo é o time, não quem bate o pênalti. Além disso, o presidente Lula tem um respeito extraordinário de todos. Ninguém se sente à vontade para contestar sua autoridade. Isso ajuda muito.

ISTOÉ – O governo não está perdendo o timing de
anunciar boas notícias?
Furlan –
Se o governo tivesse se mobilizado de imediato em projetos de desenvolvimento, provavelmente teríamos hoje uma situação bem menos confortável. A sociedade brasileira está conquistando a duras penas a credibilidade necessária para ter um projeto de longo prazo.

ISTOÉ – A previsão de crescimento caiu para 2,2%.
O ano está perdido?
Furlan –
Só o comércio exterior vai representar 1,2% deste
crescimento de 2,2%. Mas nossa preocupação é com o mercado
interno. Há uma conscientização na equipe de que este é o ano
de cimentar a base para poder construir.

ISTOÉ – Como é o trabalho com o presidente Lula?
Furlan –
Ele sabe ser um bom líder e coordenador de equipe. É muito próximo das pessoas. Durante a viagem ao Nordeste fiquei surpreso quando, na cabine do Boeing presidencial, ele chamou o comissário e disse: “Meu querido, traz mais um cafezinho para nós.” Fiquei pensando se aquele comissário imaginou que, um dia, seria chamado pelo presidente de “meu querido”. Qual a reação do rapaz? “Vou correndo fazer o que o presidente quer.” Eu, por exemplo, me movo por desafios e um pouco de reconhecimento. Procuro usar o exemplo dele com meus funcionários.