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NAS RUAS
Protesto na quarta-feira 5 contra a decisão de
proibir a emissão de vistos para estrangeiros

A estudante baiana Camila Alvarez, 25 anos, saiu do Brasil confiante. Aprovada pela London Metropolitan University (LMU), ela embarcou para a Inglaterra em 24 de junho sabendo que ao chegar teria tempo suficiente para se familiarizar com a cidade e quem sabe até encontrar um apartamento antes de mergulhar na tão sonhada pós-graduação em marketing estratégico. A viagem, o estudo e a vida na Inglaterra eram a realização de um sonho. “Sempre quis estudar fora e juntava dinheiro há três anos para isso”, diz ela. Como todo estrangeiro, Camila pagou adiantado 12,3 mil libras, o equivalente a R$ 39 mil, pelos 15 meses de aula previstos, e investiu outros R$ 20 mil nos preparativos da viagem. De início, tudo correu como o esperado. Camila encontrou um apartamento para dividir com dois ingleses, apaixonou-se pela Londres olímpica e, no final de julho, começou a pós-graduação. Com visto regularizado junto à United Kingdom Border Patrol (UKBA), órgão que regulamenta a entrada e saída de imigrantes no país, ela tinha garantida a estada legal na Inglaterra durante o curso. Mas na manhã do domingo 26 de agosto tudo mudou.

Na capa do jornal “Sunday Times” estava estampada a manchete informando que, em até dez dias, a UKBA determinaria a revogação do direito da LMU de emitir vistos para alunos de fora da União Europeia, bem como a cassação dos documentos já emitidos. Quatro dias depois a notícia se confirmou. Uma investigação do governo concluiu que a instituição aceitava alunos sem visto, estudantes que não falavam inglês e detectou que o controle de presença nas aulas era bastante falho. Um prazo foi concedido para que a universidade regularizasse a situação, o que não ocorreu. Com isso, todos os vistos emitidos para os 2,7 mil não europeus, dos quais 35 brasileiros, perdem a validade até dezembro. Para evitar a deportação, os alunos têm 60 dias para conseguir transferência para outra instituição de ensino.

A decisão, sem precedentes do governo inglês, está causando polêmica. Na quarta-feira 5, um protesto pedindo a reversão da cassação dos vistos contou com mais de 300 pessoas e quase acabou em pancadaria. Em piquete na porta do Home Office, espécie de Ministério da Justiça inglês, os manifestantes empunhavam cartazes com dizeres como “Anistia já! Salvem a London Met” e lideranças faziam discursos inflamados. “Faremos barricadas e ocupações para não deixar que as autoridades removam os alunos estrangeiros”, disse Max Campbell, presidente da University and College Union, o sindicato que reúne o maior número de trabalhadores do ensino superior no Reino Unido. “A decisão de expulsar alunos é ruim para a cultura, a educação e a economia do país”, acredita.

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Acima, Camila Alvarez, que investiu R$ 60 mil na viagem, e Daniel Figueira (abaixo),
que está de licença para fazer MBA: só transferência impede deportação

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Segundo estimativas das universidades, alunos estrangeiros gastam, em média, 5 bilhões de libras, ou R$ 16,2 bilhões anualmente para bancar estudos, estadia e vida no Reino Unido. E até 2025 o valor pode até triplicar. Só o Brasil, por exemplo, pretende mandar dez mil dos 100 mil bolsistas do programa federal Ciência sem Fronteiras para a Inglaterra. “Não acho certo reduzir o estudante ao que ele investe no país”, diz Diego Scardone, presidente da Associação de Brasileiros Estudantes de Pós-Graduação e Pesquisadores na Grã-Bretanha (Abep-UK). “Mas o argumento da arrecadação em potencial desse mercado costuma ter ressonância.”

A maioria dos estudantes afetados pela decisão, porém, não parece convencida de que haverá argumento, a essa altura, que fará o governo voltar atrás. A LMU move uma ação contra a UKBA pedindo a revisão do caso, mas, como os prazos estabelecidos pela decisão são curtos, pouco deve mudar até o início de dezembro, quando começam as deportações. “Achei um absurdo o que aconteceu”, afirma Daniel Figueira, 27 anos, matriculado no MBA da LMU. Daniel está de licença não remunerada da multinacional em que trabalha no Brasil e tem emprego garantido ao voltar, por isso está mais tranquilo. “Mas confio numa solução favorável aos alunos para o problema”, aposta.

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Fotos: Chico Lelis / Ag. Istoé