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O ministro Joaquim Barbosa concluiu nesta segunda-feira (3) seu voto pela condenação dos réus ligados ao Banco Rural por gestão fraudulenta. Relator do processo do mensalão, Barbosa já havia indicado na quinta-feira passada que o chamado núcleo financeiro do esquema cometeu fraude na concessão de empréstimos fictícios ao PT.
 
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a dona do Banco Rural, Kátia Rabello, e os executivos José Roberto Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius Samarane cometeram o delito de gestão fraudulenta (gerir fraudulentamente instituição financeira) na concessão de empréstimos fictícios a empresas de Valério e ao PT para financiar o mensalão e com a criação de artifícios para encobrir o caráter simulado das movimentações financeiras.
 
O Banco Rural, segundo a procuradoria, disponibilizou R$ 32 milhões para o esquema. O MPF alega que os empréstimos da instituição não foram operações bancárias típicas, tendo sido cobradas apenas depois da divulgação do escândalo pela imprensa.
"Os principais dirigentes do Banco Rural à época, justamente para encobrir o caráter simulado destes empréstimos, utilizaram-se dolosamente de mecanismos fraudulentos", disse Barbosa.
 
Citando condutas individuais de cada réu, Barbosa afirmou que os executivos atuaram de forma orquestrada na concessão e na renovação de empréstimos fraudulentos ao PT e a empresas de Marcos Valério. "Conclui-se que Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório, como uma típica de uma quadrilha organizada, de forma livre e consciente, atuaram na simulação de empréstimos bem como utilizaram meios fraudulentos para encobrir essas operações", disse.
 
Segundo Barbosa, além de não observar os requisitos necessários para a concessão de empréstimos, o Banco Rural omitiu informações de contabilidade e só entregou registros em 2006, durante as investigações determinadas pelo Supremo. "O Banco Rural omitiu registros de transações financeiras sob alegações de extravios. Tais justificativas são descabidas", disse.
 
Para o relator, a incorreta classificação de risco na concessão de empréstimos para o PT e empresas de Valério era tão evidente que foi alertada por técnicos do próprio banco. "O risco era tão elevado que um dos membros do comitê do Banco Rural registrou que a proposta de renovação exigia ‘risco banqueiro’, sendo necessários os votos de Kátia Rabello e José Roberto Salgado, que eram as pessoas de grau mais elevado no banco", afirmou.
 
Esses votos serviram para rebater o argumento da defesa dos réus de que os dois somente participaram da renovação de alguns empréstimos, tendo os créditos sido concedidos na gestão de José Augusto Dumont, já falecido. "Tal argumento, da mesma forma que os demais, também não se sustenta. José Roberto Salgado aprovou a primeira operação de crédito, formalmente concedida pelo Banco Rural à Graffiti (empresa de Valério). O delito cometido pelos réus se caracterizou não somente pela concessão de crédito, mas pelo uso de mecanismos fraudulentos para encobrir essas operações", disse Barbosa.
 
Lavagem de dinheiro
 
O relator do processo ainda avançou em outra acusação, sobre lavagem de dinheiro. "Os réus ao atuarem dolosamente na simulação de empréstimos, com manifesta infringência das normas, incorreram tanto no crime de gestão fraudulenta como de lavagem de dinheiro", afirmou.
 
Ao ser questionado pela ministra Rosa Weber sobre essa imputação, Barbosa esclareceu que apenas citou a lavagem de dinheiro, mas que o crime será abordado posteriormente, quando apresentar seu voto sobre o item quatro da denúncia.
 
O mensalão do PT
 
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
 
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
 
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
 
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
 
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
 
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
 
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
 
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.