Aos 66 anos, a cantora diz que a sensualidade continua sendo sua marca e conta como é criar um filho sozinha em São Paulo

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BISTURI
"Fiz plástica com o Ivo Pitangui este ano.
Fiz um lifting e não parece que fiz"
, diz ela

A soteropolitana Maria da Graça Costa Penna Burgos, a Gal Costa, escolheu a capital paulista para viver, desde janeiro, com o filho, Gabriel, de 7 anos, adotado em 2007. Em São Paulo, ela vai ao banco, ao supermercado e, acredite, diz que quase nunca pega trânsito. Faz, desse modo, um retorno à cidade onde tudo começou, profissionalmente falando, há quase meio século. Em turnê pelo Brasil, foi em um show em São Paulo, durante uma apresentação do seu mais recente álbum, “Recanto”, dirigido por Caetano Veloso, que a sua voz a deixou na mão pela primeira vez. Aos 66 anos, a eterna diva da Tropicália conta, entre outras passagens, como reagiu à inédita desafinada diante dos olhares da plateia.

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"Desafinei porque a voz falhou. Aí evoquei os roqueiros dos
anos 60, Janis Joplin, Jimi Hendrix, todos daquele tempo"

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"Não tenho nenhuma saudade da Bahia. Vejo a Bahia muito malcuidada.
Os governantes não estão cuidando dela como deveriam"

ISTOÉ

Por que morar em São Paulo?

 

Gal Costa

Cheguei em São Paulo em 29 de janeiro. Tenho esse apartamento, nos Jardins, há quatro anos. Fui amadurecendo a ideia de morar aqui. A minha ideia era ter um espaço na cidade já que morava em Salvador e viajava muito, sempre passando por São Paulo. Tô adorando. Gosto do ritmo da cidade, das pessoas, as coisas acontecem. As pessoas marcam com você e vão aos compromissos. Se não podem ir, ligam para você. Fora daqui as pessoas marcavam comigo, não iam e não avisavam que não iam. E eu gosto do paulista. São Paulo foi onde morei no começo da carreira, quando ainda não era famosa, tudo começou aqui. Talvez tenha alguma razão no subconsciente o fato de eu ter escolhido morar em São Paulo.
 

ISTOÉ

O que gosta de fazer na cidade?
 

Gal Costa

Faço tudo. Vou ao banco, que é pequeno, tem estacionamento e é tudo fácil. Procuro as facilidades, mas vou até ao supermercado. Faço minhas compras. No fim de semana, vou com meu filho (Gabriel) ao shopping e o levo ao cinema, a um restaurante. Ele adora comida japonesa, ama sashimi de salmão. Gosto de dirigir. Vejo os paulistas dizerem que o trânsito é horrível, mas eu só pego trânsito ótimo.  

ISTOÉ

Em um show em São Paulo sua voz falhou. Como reagiu ao fato?
 

Gal Costa

Eu já havia cancelado dois shows por causa de uma faringite. E não queria cancelar a estreia no HSBC (casa de espetáculos). Não me sentia totalmente pronta, mas achava que daria conta do recado. “Divino Maravilhoso” é a música na qual vou numa tonalidade mais alta. Não ensaiei essa música e justamente nela minha voz deu uma falhada, uma bela falhada. Eu me preocupei bastante, mas dividi com a plateia aquela situação. Não iria fingir que nada estava acontecendo. Nunca tinha feito um show nessas condições. Esse episódio foi difícil. É um sofrimento grande para um cantor que não está em plena condição, mas naquele show consegui ser guerreira, dizer: “Eu vou conseguir, porque posso e quero!” E foi quando veio a música “Autotune Autoerótico”, uma das mais difíceis, onde canto com a voz muito para fora… aí, eu disse “bom, chegou a hora”.
 

ISTOÉ

E o que fez?
 

Gal Costa

Pensei no palco: “Vou receber Janis Joplin, Jimi Hendrix, todo mundo daquele tempo.” É incrível porque tudo aconteceu aqui em São Paulo, o Tropicalismo, então esse show foi muito intenso para mim. Foi aqui que eu ouvi todo mundo, Beatles, Janis Joplin, e que houve essa transformação em mim e fiz o “Divino Maravilhoso”. Foi aqui que me transformei na Gal tropicalista e pensei nisso no palco. Eu realmente evoquei os roqueiros dos anos 60. Aí, fiz o show e foi lindo. Caetano (mentor do álbum que originou o show) percebeu tudo isso e disse que eu atuei de maneira maravilhosa (risos). 

ISTOÉ

Sua voz voltou a falhar? Vejo que a sra. está com uma tosse constante. 

Gal Costa

Não voltou a falhar. Essa tosse é um pigarro por causa da poluição de São Paulo. Mas com um pouco de exercício vocal, esquentamento, desaparece. Procuro não tomar gelado depois do show, não saio para jantar fora, até porque não gosto de dormir tarde. Não bebo, não fumo. Quando era mais jovem, meus amigos iam ao camarim e eu tomava vodca… e até fumei. Mas hoje procuro me preservar.
 

ISTOÉ

Foi a única vez que desafinou?
 

Gal Costa

Nem desafinei. É, desafinei porque a voz falhou. Na hora de emitir a nota ela não foi. Foi falha mesmo. Mas nunca havia acontecido isso. 

ISTOÉ

Ainda sente frio na barriga em show? 

Gal Costa

Sinto. “Recanto” me dá frio todas as vezes. Uma entidade me toma, uma espécie de nervosismo com excitação, que perdura por duas, três músicas e depois vou ficando na normalidade do palco. Quando entro no palco, tudo muda, as células, os neurônios, a corrente sanguínea, a pressão arterial. O palco é uma catarse. Me dá um frio na barriga muito grande. E se não der é porque não tem tesão.
 

ISTOÉ

Como se define como mãe?
 

Gal Costa

Sempre tive loucura para ser mãe, mas nunca engravidei. Fui averiguar isso e descobri que tenho as trompas obstruídas. Então, hoje, sou uma mãe-avó. Sou louca, apaixonada, pelo meu filho. Ser mãe é algo revolucionário. Conviver com aquela pessoinha que depende de você, dar amor, carinho, moldar o caráter dela. Eu sou uma boa mãe dedicada. Gabriel tem um celular, a gente se fala por ele. A minha vida é toda em função da música e do Gabriel. Ele é uma luz na minha vida. Veio ao mundo para ser meu filho, é lindo, parece com a família do meu pai. E é muito levado, pula de um sofá para o outro, fala alto, me pirraça, faz coisas que eu não quero só para chamar a minha atenção. Mas ao mesmo tempo é doce, obediente, tem bom caráter.  

ISTOÉ

A sra. cresceu sem a presença do pai. Isso a prejudicou? 

Gal Costa

Não acho que tenha atrapalhado meu desenvolvimento. Sou o que eu sou. Minha mãe fez o papel de mãe e pai muito bem. Não tive uma relação afetiva com o meu pai e isso foi apenas um fato. Meus pais viveram muito tempo juntos e minha mãe não conseguiu engravidar. Aí, ela descobriu que o meu pai tinha uma outra mulher, com filhos. Depois de se desquitarem, meu pai resolveu reconquistar a minha mãe e a levou não sei para onde. E ficaram um tempo juntos e, ao retornar, ela percebeu que estava grávida de mim. Mas eles já estavam separados. Quando estava grávida, minha mãe se concentrava para que eu nascesse musical. Todo dia, ouvia música clássica e se concentrava para que o feto absorvesse aquela música. E deu certo.
 

ISTOÉ

Gabriel também está sendo criado sem a presença do pai. Vê algo a ser trabalhado com o seu filho, alguma lacuna a ser preenchida?
 

Gal Costa

Não. Simplesmente eu não sou casada. E o Gabriel vai viver a vida dele, entendeu? As coisas não têm de ser como as pessoas formalizam. Eu fui criada pela minha mãe e sou uma grande mulher. Não existe uma lacuna do pai. Minha mãe me deu oportunidade de ver coisas: cultura, música, teatro, cinema. Isso não enche a lacuna do pai, isso é mostrar… eu mostro, levo o meu filho ao cinema, quero que vá ao teatro, ouça música, dei um iPod pra ele colocar as músicas que gosta. Isso é enriquecer a alma de uma pessoa que você cuida, sobre a qual tem responsabilidade.
 

ISTOÉ

Tem algum sonho que ainda não realizou?
 

Gal Costa

Tenho muitas coisas que gostaria de fazer. Mas não vou dizer, não.
 

ISTOÉ

Dieta ainda faz parte da sua rotina?
 

Gal Costa

Convivo com a palavra dieta e esse exercício de fazer dieta desde jovem. Sempre tive tendência a engordar e sempre malhei muito para me manter magra. Eu me prefiro magra a gorda desde que tomei a primeira pílula anticoncepcional. Minha mãe era gorduchinha, puxei a ela. Me incomodava, não gostava, não me sinto bem quando estou gorda, ao mesmo tempo fazer dieta é algo difícil. Mas não como demais.  

ISTOÉ

Já foi gorda, então?
 

Gal Costa

Nunca fui gorda, baleia. Fui gordinha. Hoje, ficaria mais feliz se perdesse 5, 6 quilos. É uma sensação deliciosa quando a roupa entra tranquilamente no corpo da gente. Tô pesando 72 quilos, engordei um quilo. Antes, era mais paranoica com o meu peso. Hoje nem tanto.  

ISTOÉ

Os 66 anos pesam em algum momento?
 

Gal Costa

Pesam. É difícil emagrecer, o corpo muda um pouco. Mas têm suas compensações, como a maturidade, a tranquilidade. Tô com 66 anos de idade cronológica. Minha idade espiritual, relativa à vitalidade, energia, está entre 45, 46 anos. Vejo muita gente com a mesma idade que a minha e jeito de velha. Eu me sinto jovial. No palco me sinto assim. A minha voz, quando eu canto, demonstra que sou jovial. Canto nos tons originais das gravações. Tenho vitalidade, gana de vida, sonho com projetos futuros. Em alguns momentos, hoje me acho mais bonita do que quando era mais jovem. Eu tenho uma marca muito grande, essa coisa da beleza, da sensualidade, do corpo. A minha aura está toda conectada com isso. Meus fãs, os jovens principalmente, sonham com essa garota gostosa, linda, com a barriga de fora. Eles têm essa fantasia, sei que têm.  

ISTOÉ

E como vê isso?  

Gal Costa

 Eu continuo bonita, mas não sou mais aquela garota com a barriga de fora. Não tem o menor sentido eu colocar a barriga, os seios, de fora. Mas há fotos lindas minhas com o corpo à mostra. Adoro vê-las. Me olho e penso: “P. q. p., eu era gostosa!” E ainda sou gostosa! Claro!

ISTOÉ

Até onde vai a sua vaidade?
 

Gal Costa

 Fiz plástica com o Ivo Pitangui este ano. Fiz um lifting e não parece que fiz. Cheguei lá e disse: “Professor, quero rejuvenescer o meu rosto, mas quero me sentir como se eu tivesse descansado.” Queria que as pessoas me vissem, dissessem que eu estou bem, bonita, e pensassem que eu descansei 15 dias numa fazenda. Procurei a cirurgia plástica buscando algo que parecesse natural. Lipoaspiração até faria, mas não preciso.

ISTOÉ

Caetano acaba de fazer 70 anos. Como o enxerga, hoje?
 

Gal Costa

Caetano não aparenta a idade que tem. Ele está bonito, sempre foi bonito fisicamente falando. É um menino com vitalidade, energia, garra. Caetano é um dos meus musos, meu irmão espiritual, um cara com quem tenho uma conexão musical especial. Isso se deve à grande idolatria que temos por João Gilberto desde que nos conhecemos. Dei a ele a minha energia, a minha emoção ali no “Recanto”.
 

ISTOÉ

Do que sente saudade da Bahia?
 

Gal Costa

Não tenho nenhuma saudade da Bahia. Eu adoro morar em São Paulo. Eu tô aqui, esse é o meu lugar. Vejo a Bahia muito malcuidada. Os governantes não estão cuidando da Bahia como deveriam. Ela está muito maltratada, mas com uma luz e cor do mar lindas e um povo lindo.