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PREJUÍZO
Avaliado em R$ 50 milhões, o quadro "Samba",
de Di Cavalcanti, foi queimado no incêndio 

O “Samba” (1925) acabou em cinzas. Avaliada em R$ 50 milhões, uma das telas mais importantes do pintor Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976) foi perdida em um incêndio na cobertura do marchand e colecionador de arte Jean Boghici, em Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro, na semana passada. Ninguém ficou ferido. O prejuízo financeiro total de Boghici ainda não foi divulgado, nem a quantidade de obras perdidas. Até agora, sabe-se que o fogo também destruiu “Floresta Tropical” (1938), de Alberto Guignard. Segundo especialistas, a coleção do marchand passa de R$ 100 milhões. “Foi uma fatalidade. O meu sentimento é de raiva e vingança contra o destino”, disse Boghici. O laudo sobre as causas do incêndio deverá ser concluído na próxima semana, mas tudo indica que começou em um aparelho de ar-condicionado. Seja o que for, o fato mostrou a vulnerabilidade a que estão expostas obras de arte mantidas em casa, e acendeu a luz vermelha no mercado de colecionadores.

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COLEÇÃO
Jean Boghici com a filha Sabine e as obras de arte na cobertura que
pegou fogo: uma exposição do que sobrou será montada no Rio

Especialista em art déco e dono de uma coleção particular invejável, Márcio Roiter afirma que o fato despertou sua atenção para fatalidades que podem destruir preciosidades. “Sempre fui cuidadoso com a parte elétrica, mas não temos que nos preocupar só com incêndios. Hidráulica, condições de temperatura e de limpeza das obras também podem provocar perdas irreparáveis”, alerta. Os cuidados valem igualmente para o Instituto Art Déco Brasil, que funciona em outra casa de Roiter, no Rio. Segundo ele, cuidar bem de arte inclui até checar as condições do prédio e modernizar suas instalações, além, claro, de manter um eficiente sistema de segurança contra roubos.

O colecionador Diógenes Paixão decidiu abrir mão de aparelhos de ar refrigerado em sua casa, no bairro de Santa Teresa, no Rio, justamente para não botar em risco sua fantástica coleção de telas de Alfredo Volpi (1896-1988), além de gravuras e fotografias. “Tenho medo de qualquer aparelho elétrico, quero evitar problemas”, conta. “O episódio Boghici deu um susto em todo mundo”, diz Paixão, dono do Bar do Mineiro, no mesmo bairro, onde expõe telas de arte naif. Organizadora de leilões no Rio e também colecionadora, Soraia Cals acredita que um simples sistema contra incêndio poderia ter poupado Boghici de prejuízo tão grande. “Ter extintores em pontos estratégicos da casa pode acabar com o fogo antes de ele se alastrar”, diz. O seguro ainda é algo distante do colecionador brasileiro. “É muito caro. A maioria só reza para que nada aconteça”, afirma. Uma das poucas companhias que prestam esse tipo de serviço no País, a Allianz Seguros, não fecha contrato sem, antes, avaliar bem as condições de riscos. “Já negamos apólices para arte que fica em casas de veraneio pouco frequentadas, pois a chance de furto é grande”, conta o superintendente Edson Toguchi.

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ATENÇÃO
Dono de uma coleção particular invejável, Márcio Roiter
cuida da parte elétrica do apartamento onde mora

Em tragédias como essa, as obras que ficam tornam-se mais valorizadas. Os quadros de Tarsila do Amaral, “Pont Neuf”, “O Sono” e “Sol Poente” são ainda mais únicos por terem sobrevivido às chamas da casa de Boghici. “Esse tipo de acidente faz algumas obras mais especiais”, avalia Toguchi. Todas as que não foram queimadas poderão ser vistas na exposição programada para novembro, na inauguração do Museu de Arte do Rio (MAR). “Montamos a mostra como se fosse a casa de Jean Boghici e vamos homenagear as pinturas que foram perdidas”, adianta o curador Leonel Kaz.

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