Um golpe de mestre. Foi assim que operadores do mercado financeiro definiram um esquema que trouxe de volta ao País, em 1992, US$ 3 milhões sem procedência investidos nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal do Caribe. No comando estava o economista Ricardo Sérgio de Oliveira, que já acumulava uma bem-sucedida carreira no mercado financeiro e começava a se destacar em outro ramo. Seu êxito em obter recursos para a campanha a deputado do amigo José Serra lhe deu credenciais para um desafio maior: recolher dinheiro para as candidaturas de Serra ao Senado e de Fernando Henrique para presidente, em 1994. Nesse contexto surgiu a Operação Banespa. Investidores e banqueiros examinaram documentos obtidos por ISTOÉ. Todos classificam-na como uma simulação de empréstimo que produziu um pretexto legal para trazer os milhões ao País. “De todas as operações envolvendo Ricardo Sérgio, a do Banespa é que me interessa mais. Quero saber se o dinheiro internado foi de sobra de campanha”, diz o procurador Guilherme Schelb, que investiga o enriquecimento ilícito do ex-diretor do Banco do Brasil.

Ricardo Sérgio conseguiu a façanha de vender ao exigente mercado internacional títulos de uma empresa falida. A transação foi feita por meio de um Contrato Particular de Emissão e Colocação de Pagamento e Títulos no Exterior, firmado entre o Banespa, na época estatal, e a empresa falimentar Calfat. O avalista foi o próprio Ricardo Sérgio, membro do conselho administrativo da Calfat. Trata-se de uma operação de lançamento de títulos no Exterior que apenas grandes empresas
podem utilizar. O contrato, de 14 de fevereiro de 1992, reúne
lances inacreditáveis.

Simulação – Além não ter nome no Exterior, a Calfat enfrentava muitos processos de execução, que a impediam de passar um cheque na quitanda da esquina. Mesmo assim, conseguiu compradores internacionais. O dinheiro, depositado na agência do Banespa nas Ilhas Cayman, pousou na conta da Calfat no banco em São Paulo. Para investidores, a operação foi uma simulação. “Tudo indica que a Calfat emitiu títulos podres no mercado externo, que foram resgatados a valores superfaturados pela própria empresa ou por empresas amigas. Isso permitiu o retorno do dinheiro sem procedência”, diz o ex-presidente de um banco estrangeiro.

De acordo com uma juíza federal, para conferir legalidade à operação, o empréstimo simulado no contrato cumpre exigências como a penhora de bens e fiadores. O banco chega a entrar com um processo contra a empresa pela não quitação do empréstimo. A cobrança se arrasta até o arquivamento e os advogados do banco dão um jeito para que os fiadores e donos das empresas executadas não fiquem inadimplentes. Foi o que aconteceu na Operação Banespa. Em São Paulo, tramitam, desde 1994, dois processos movidos pelo Banespa contra Ricardo Sérgio e a Calfat pelo não pagamento dos US$ 3 milhões. A garantia é a hipoteca de uma fábrica em Leopoldina (MG), insuficiente para quitar a dívida. Mesmo assim, o banco jamais tentou penhorar os bens do economista. Outro processo revela que o Banespa trouxe dinheiro de fora para a Calfat em outras operações suspeitas. Mas os autos foram retirados por advogados do banco, em 1995, e nunca retornaram.

Em 1989, Ricardo Sérgio realizou um esquema semelhante para trazer dinheiro das Ilhas Virgens. Documentos mostram que, em fevereiro, ele e seu sócio, Roberto Visneviski, compraram um escritório em São Paulo da Andover Nacional Cooporation, instalada no paraíso fiscal. Para o jurista Heleno Tôrres, especialista em lavagem de dinheiro, a transação é suspeita porque o responsável pela Andover é o próprio Visneviski. “Clássica operação de internação de dinheiro. A Andover deve ser do Ricardo Sérgio”, diz. No mesmo paraíso, está a empresa Antar Venture Investments, representada no Brasil por Ronaldo de Souza, outro sócio de Ricardo Sérgio. Segundo documentos revelados pelo jornal Estado de Minas, a Antar se associou à brasileira Antares para adquirir um complexo imobiliário, em São Paulo, avaliado em R$ 50 milhões. Para os especialistas, foi outro esquema de lavagem, atividade que parece estar se tornando marca registrada de Ricardo Sérgio.