Ah, o verão… Com o mesmo ritmo com que a barra vai sendo elevada nas finais do salto em altura, o termômetro e a altura das saias estão subindo em Londres. No metrô, nas ruas e, principalmente, nos parques, as londrinas se desavergonham e oferecem a propaganda subliminar da transparência como contraponto ao marketing agressivo dos nossos fios-dentais.

Comuns por aqui são aquelas minissaias no limite da decência recobertas por um pano vasado ou rendado, uns quatro dedos mais compridos. Ao mesmo tempo em que oferece uma dose de recato, essa roupa deixa uma boa área disponível para que a usuária receba as raríssimas lufadas de ar fresco sopradas pelo velho Tâmisa. Menos charmosa, a bermuda ajuda as moças a atingirem o mesmo fim.

Essa indumentária-padrão faz com que a cidade abrigue um variado e interminável desfile de pernas. Multicultural como só ela sabe ser, Londres oferece toda a cartela de pantone que o Criador usou para tingir os veículos de locomoção mais cobiçados do lado de cá da Via Láctea.

Maioria por aqui, as mulheres comoventemente brancas e suas pernas fazem sucesso até entre os insetos. Mesmo transeuntes desatentos têm a atenção capturada por aquele solitário ponto vermelho deixado na noite anterior por uma muriçoca desalmada. Aqueles mais solidários se sentem impelidos a oferecer à moça uma demão de Minancora, mas se acovardam por não saber como se diz o nome da pomada em inglês.

Livres de quaisquer marcas deixadas por seres voadores, as negras desfilam com a fronte erguida, orgulhosas, cheias de si. As mais em forma trajam vestidinhos que, antes da admiração, provocam a dúvida: como foi que ela entrou nisso aí? Talvez seja essa a explicação para o fato de, em média, elas andarem mais rápido que as demais. Com roupas que melhoram a aerodinâmica, as negras se aproveitam das suas linhas desenhadas muito mais com o compasso do que com a régua.

Há, é claro, uma infinidade de moças – de todas as cores – que parecem saídas de uma pintura barroca ou de uma tela do Botero. Boa parte delas usa roupas compradas uns 80 fish and chips atrás. É admirável o esforço da lycra para manter represados todos os excessos. Quando a blusa é de alcinha, revela-se uma canaleta úmida no meio das costas, de cima abaixo. E, instantaneamente, a mulher se converte numa espécie de seringueira de suor. Lindo!

Dá dó das muçulmanas. Recobertas de preto, elas não se concedem o direito de exibir nem sequer um pescoçinho, uma canela, um calcanhar. Curiosamente, não escorre nem uma gota por seus rostos. Fica difícil acreditar que, por trás daqueles olhares misteriosos, não se esconda um eficiente e sustentável sistema de refrigeração.

E o homem londrino? Ele parece conhecer a cena de outros verões. Permanece imperturbável diante dessa fashion week gratuita e democrática. Sem chilique de estilista, nem cadeira reservada pra Costanza Pascolato. Os rapazes não dão aquela cotoveladinha para chamar a atenção do colega, não param na calçada e viram para trás, não soltam um contido e sussurrado “oh, Lord”. Não dedicam àquelas saias, bermudas e pernas a adoração demonstrada diante de uma torneira de Guinness. Eles devem saber de algo que o resto da humanidade ignora.