Depois de perder a eleição para um novo mandato e a cerca de 40 dias de se tornar novamente um cidadão comum, o deputado Augusto Farias (PPB-AL) encontrou na última semana um bom motivo para comemoração. Na segunda-feira 11, o procurador-geral da República Geraldo Brindeiro recomendou ao Supremo Tribunal Federal o arquivamento do inquérito criminal que apurava a participação do parlamentar no assassinato de seu irmão Paulo César Farias e da namorada de PC, Suzana Marcolino. O casal foi morto em 23 de junho de 1996 na casa de praia de Guaxuma, litoral de Maceió. PC foi tesoureiro da campanha de Fernando Collor e protagonizou um dos maiores esquemas de corrupção já revelados no Brasil. Era grande conhecedor do submundo da política nacional e dos destinos da dinheirama transferida dos cofres públicos para contas privadas no Exterior. Sua morte no interior de uma mansão cercada de seguranças surpreendeu o País. Tão logo foram descobertos os corpos, a polícia alagoana, a família Farias e parte da imprensa trataram o caso como um crime passional. Era a maneira mais simples de enterrar definitivamente um arquivo comprometedor. A confortável tese de que Suzana teria matado PC e se suicidado em seguida impediria qualquer investigação mais profunda a respeito das relações de PC e também daqueles que com ele tinham algum tipo de envolvimento. Já em junho de 1996, porém, ISTOÉ denunciou que estava sendo armada uma farsa. PC e Suzana foram vítimas de duplo homicídio e não de um crime passional.

Em sucessivas edições, as reportagens de ISTOÉ mostraram as contradições que impediam a aceitação do crime passional. Diante disso, o Ministério da Justiça indicou Fortunato Badan Palhares, legista da Unicamp, para que auxiliasse a polícia de Alagoas nas investigações. Badan acabou cedendo à tese do homicídio seguido de suicídio. O problema é que o laudo comandado por ele acabou sendo contestado e a Justiça de Alagoas nomeou uma comissão de peritos e legistas de diversas partes do País para uma nova investigação. Foram realizados dezenas de exames, depoimentos e até debates entre especialistas, intermediados por juízes e promotores. Ao final, foram produzidos milhares de páginas. O Ministério Público de Alagoas acompanhou cada passo da apuração. Revirou todas as arestas das peças de um complexo quebra-cabeça e chegou a algumas conclusões:

1 – Tecnicamente, é impossível afirmar que Suzana Marcolino matou
PC Farias e depois se suicidou.

2 – O local do crime foi deliberadamente adulterado antes da chegada da polícia. Portanto, os seguranças de PC sabem mais do que disseram ou têm alguma participação direta no crime.

3 – Augusto Farias também teria tido alguma participação no duplo homicídio, ou está protegendo alguém.

4 – Há indícios de que as falhas encontradas no laudo comandado por Badan possam caracterizar o crime de falsa perícia.

As conclusões do MP foram em parte acolhidas pela Justiça. Há cerca de 15 dias, o juiz Alberto Jorge Correa Lima determinou que os seguranças de PC sejam levados a júri popular. No caso de Augusto Farias, no entanto, o processo acabou sendo encaminhado ao procurador-geral, pois como deputado ele tem, até o fim de seu mandato, o privilégio de só poder ser julgado e investigado por instância superior. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça determinou que o mesmo fosse feito em relação à perícia de Badan. Brindeiro recebeu todo o processo no final de 1999 e, em fevereiro de 2000, encaminhou o caso ao STF. Na época, ele entendeu que havia diversos indicadores da participação do deputado no suposto duplo homicídio e visualizou “fortes indícios” de que o irmão de PC fora responsável pela alteração na cena do crime. De fevereiro para cá não se tem notícia da descoberta de alguma novidade. Nem surgiram depoimentos que apontassem para outra investigação. No entanto, Brindeiro acabou convencendo-se de que PC fora vítima de um crime passional. Augusto não foi o responsável por duplo homicídio e Badan não cometeu falsa perícia. O mistério que fez o procurador mudar de idéia é bastante singelo: esclarecimentos técnicos feitos pelo próprio Badan.

Com essa decisão, Brindeiro tirou o caso PC da gaveta e o colocou em um arquivo mais seguro. “Só poderemos reabrir o caso envolvendo o deputado se algum fato novo ocorrer”, lamenta o juiz Correa Lima. A posição do procurador-geral foi tomada 40 dias antes de Augusto terminar seu mandato. Se esperasse mais tempo, o deputado seria levado a júri popular, exatamente como os seguranças. Como ficou, é possível que a morte de PC acabe mesmo sobrando para o mordomo.