Durou apenas alguns minutos, mas
deu para sentir o gosto de ser Argentina. Foi na manhã da
quarta-feira 31, quando uma espiral
de insanidade fez a cotação do dólar bater em históricos R$ 3,61. A paridade real-peso estava praticamente estabelecida. No mesmo momento, as casas de câmbio em Buenos Aires cobravam 3,64 pesos pela moeda americana. O presidente do Banco Central, Aldo Pignanelli, aproveitou a deixa e declarou que “o mercado argentino é quase uma festa” se comparado ao brasileiro ou ao uruguaio, que também vive uma forte turbulência.

De fato, o câmbio na Argentina permanece estável há quase dois meses, uma situação inversa ao nosso, que não para quieto há tempos. A diferença entre os vizinhos, ignorada por Pignanelli em um momento de euforia descabida, é que o nosso presidente foi escolhido nas urnas, os nossos bancos abrem e fecham todos os dias e não há sequer um centavo dos correntistas preso neles. Ao menos por enquanto.

O intenso nervosismo da semana passada, traduzido em nove recordes seguidos da cotação do dólar (trajetória só quebrada na quinta-feira 1º, quando a moeda americana deu uma trégua e fechou a R$ 3,15), fez crescer o temor da tão falada argentinização da economia brasileira. O que era uma ameaça de campanha virou uma incômoda e real possibilidade. No mínimo, aumentaram as chances de um forte processo recessivo abarcar uma economia que já vinha, digamos, andando de lado. Idéias até então consideradas distantes da realidade brasileira – como a eventual antecipação da transição presidencial, aventada pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr., da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo – passaram a fazer parte do vocabulário dos especialistas.

“Essa crise pode criar risco institucional se as reservas chegarem a zero. O cenário predominante hoje indica uma brutal recessão”, afirma o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Reinaldo Gonçalves. “Se o investimento empresarial estava em compasso de espera, hoje está rigorosamente paralisado”, constata o diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida. “As vendas estão caindo, as linhas de crédito estão encurtadas, a indústria está à beira de uma recessão… Precisamos de uma resposta à altura do governo”, cobra Mario Bernardini, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), que sugere a criação de uma câmara de gestão emergencial para a crise financeira, nos moldes do “ministério do apagão”, surgido ano passado para gerir a crise energética.