Assis Chateaubriand, o “avô” da televisão brasileira, ficaria orgulhoso. Desde que o jornalista, político e empresário inaugurou, na marra, a pioneira TV Tupi, em 1950, sua cria não parou de evoluir. Os primeiros 200 aparelhos que “Chatô” espalhou por São Paulo para a transmissão inaugural da emissora viraram milhões, ganharam nitidez, cor, controle remoto e agora se preparam para o salto definitivo rumo ao mundo digital.

A nova encarnação do televisor terá imagem de cinema, som de CD e servirá até de shopping center, permitindo compras diretamente na telinha. Essas maravilhas, anunciadas como as maiores vantagens da tevê digital, devem demorar para chegar ao telespectador brasileiro. O novo aparelho precisa vencer algumas etapas burocráticas e legais, como a definição do padrão que será utilizado nas transmissões, mas hoje já se pode ver uma amostra da tevê do futuro.

Além da tela mais larga, com formato que reproduz a telona de cinema, os novos televisores vão incorporar uma série de recursos, uma infinidade de canais (fala-se em mais de seis mil) e uma variedade de modelos que utilizam as tecnologias de plasma e cristal líquido. Elas eliminam o tubo transmissor de imagens, podem ser penduradas na parede como molduras de quadros e são os objetos de desejo dos apaixonados por televisão. E devem substituir os televisores convencionais num horizonte de dez a 20 anos, prazo para que seu custo se torne acessível. “Os novos aparelhos serão mais finos e vão mudar para o formato mais largo de exibição”, diz Piet Coelewij, vice-presidente da holandesa Philips, que esteve no Brasil para apresentar os lançamentos para a era digital. Um dos atrativos da tevê do futuro serão os recursos da internet e sua propalada interatividade. Será possível encomendar o filme que se quer ver, no horário desejado. Durante um jogo de futebol, o telespectador poderá consultar o preço de uma chuteira ou comprar o ingresso da próxima partida, sem levantar do sofá.

A evolução, é claro, terá seu preço. Hoje, em qualquer modelo que incorpore alguma inovação digital, o custo do aparelho de tevê não fica abaixo dos R$ 4 mil – e pode chegar a R$ 80 mil se utilizar a tecnologia de plasma. Os fabricantes calculam que as tevês digitais atinjam o patamar de preço atual dentro de cinco a dez anos. Para quem não pretende aderir à digitalização, o governo vai estipular um prazo longo para que os dois padrões – analógico (atual) e digital – convivam simultaneamente. Para que o consumidor brasileiro não sinta tanto o peso em seu bolso, os fabricantes se preparam para vender um equipamento chamado setup-box, conversor que transforma os sinais digitais transmitidos pelas emissoras de televisão em formato compreensível aos aparelhos.

“A digitalização acontecerá de forma lenta e gradual”, aposta Carlos Goya, gerente de novos negócios da Sony. “O preço alto é o maior obstáculo para uma migração mais rápida para os televisores digitais”, diz Marcelo Granja, gerente de produtos da LG. Para Moris Arditti, vice-presidente da Gradiente, a queda nos preços dos novos televisores vai depender do sistema escolhido pelo governo, anúncio que deverá ser feito até julho. Estão na briga os padrões americano, europeu e japonês. Do ponto de vista técnico, o japonês foi eleito o melhor, embora não seja sequer usado no Japão. O americano tem boa definição de imagens, mas não oferece mobilidade, o que inviabiliza um dos maiores charmes dessa tecnologia, que é assistir a um programa de tevê no celular ou no computador de mão. O europeu parece ser um meio termo, apesar de não transmitir em alta definição. O que vai pesar na escolha são as contrapartidas que os países detentores dessas tecnologias podem oferecer, já que o Brasil pretende produzir e exportar aparelhos e programas de tevê. “Se o padrão não levar em conta a fabricação local de componentes, ficaremos à mercê das importações”, diz Arditti, da Gradiente. “Para chegarmos a um preço popular, só com um grande aumento da demanda.” Os novos televisores vêm com softwares embutidos e uma série de componentes eletrônicos, o que encarece seu preço final.

Com 50 milhões de televisores instalados no País, empresários e especialistas estimam que o Brasil deve movimentar uma fábula com a chegada da televisão digital. Os valores são elásticos, vão de US$ 5 bilhões a US$ 100 bilhões, num período de dez a 15 anos. Aí estão incluídos os gastos dos consumidores, os investimentos da indústria e os das emissoras de televisão. Além dos novos negócios que podem surgir com o poder da interatividade, como lojas e serviços e virtuais. A próxima evolução da televisão vai doer no bolso. O prêmio de consolação é que a imagem será, no mínimo, dez vezes melhor do que a exibida pelos aparelhos de hoje.