Faltam 15 minutos para as 11h no Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Um ronco seco e constante começa a tomar conta do lugar. Conversar se torna impossível. Os desavisados chegam a se assustar com o rotineiro miniterremoto provocado pela decolagem do Concorde rumo a Nova York. “É como um relógio para nós”, diz um funcionário da Air France, sobre a pontualidade britânica do jato.

Muita gente deve ter perdido a hora entre julho de 2000, quando um pneu estourado provocou a queda de um Concorde nas proximidades do aeroporto, matando 113 pessoas, e novembro do ano passado, quando o jato voltou a fazer o trajeto Paris–Nova York em seis horas. Da tragédia, restou um discreto memorial aos mortos, um grave arranhão na história de 25 anos do Concorde e um admirável esforço de volta por cima da Air France. Os tanques de gasolina do supersônico acabaram reforçados, assim como o orgulho que os franceses nutrem pela nave.

É preciso lembrar que o Concorde voltou a cruzar o Atlântico menos de dois meses após o trauma de 11 de setembro. “Levantar vôo agora ou nunca mais” era o lema da companhia durante a reabilitação do Concorde. A tragédia acabou servindo de teste para enfrentar a crise que abateu a aviação mundial após os atentados terroristas aos Estados Unidos. “Vamos anunciar lucro no exercício de 2001”, anuncia o diretor-geral para as Américas, Jean-Loius Pinson.

Trata-se de uma façanha que deverá ser repetida por apenas mais duas ou três companhias do porte da Air France. Os números só devem sair em junho, mas a notícia do resultado positivo, por si só, dá fôlego à companhia. Um processo de reestruturação que durou cinco anos, a pequena dependência em relação aos vôos para os Estados Unidos e a posição estratégica do Charles De Gaulle são apontados como os responsáveis pelos ganhos.

Rotas abandonadas pelas outras companhias após o 11 de setembro foram rapidamente tomadas pela estatal francesa (56% do capital pertence ao governo francês). A agilidade foi possível graças ao sistema de funcionamento do aeroporto parisiense, a casa da Air France. Mais do que porta de entrada da França, o Charles de Gaulle serve de ponto de conexão para o mundo.

Toda a operação no CDG, como o aeroporto é conhecido na linguagem aeronáutica, é voltada para as conexões. Quase 60% das pessoas que chegam a Paris de avião não estão lá para curtir as belezas do Champs-Elysées, mas sim para pegar outra rota. As 80 mil pessoas que circulam por dia pelo aeroporto poderão usufruir de uma nova ala, a sexta, já no ano que vem. Desenhada pelo arquiteto francês Paul Andreu, vai custar 500 milhões de euros e pretende tornar ainda mais fácil o processo de conexões.

Em mais um sinal de força em meio à crise, a Air France acaba de trocar os antigos Boeing 777 por Airbus A330-200 – aviões que custam mais de US$ 100 milhões – na rota brasileira. O charme de Paris supera qualquer medo do terrorismo.