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TIME VENCEDOR
O presidente do BC, Alexandre Tombini, fala para uma plateia de 380 empresários sobre
os rumos da economia brasileira. Os ex-presidentes do BC Pérsio Arida, Gustavo Franco,
Henrique Meirelles e Armínio Fraga (acima da esq. para a dir.) foram os protagonistas do debate

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Nos últimos 15 anos, a economia brasileira passou por uma transformação extraordinária. O descontrole inflacionário foi substituído por uma moeda forte e a responsabilidade fiscal se tornou um objetivo perseguido pelos governos. O País se modernizou em todas as frentes e, estimulado por um ambiente de negócios mais pujante, o setor privado floresceu. Essa revolução se deve certamente a muitas ­pessoas, mas é também a obra particular de um grupo seleto de economistas. Cinco deles se reuniram na terça-feira 19 em São Paulo, em um encontro inédito promovido em comemoração aos 15 anos da revista ISTOÉ Dinheiro, publicação da Editora Três. O seminário, intitulado “Guardiões da Estabilidade”, reuniu quatro ex-presidentes do Banco Central – Pérsio Arida, Gustavo Franco, Armínio Fraga e Henrique Meirelles –, além do atual chefe da autoridade monetária, Alexandre Tombini. Na plateia, estavam presentes mais de 380 empresários dos principais setores da economia. “Vivemos a já longa Era do Real, mas podemos chamá-la de Era da Estabilidade, da moeda forte, do respeito às regras e da credibilidade internacional”, disse o presidente-executivo da Editora Três, Caco Alzugaray, na abertura do evento.

Apesar do consenso em torno do agravamento da crise na zona do euro e da lenta recuperação dos Estados Unidos, Alexandre Tombini sustentou que as perspectivas de crescimento da economia brasileira são positivas e que a alta do Produto Interno Bruto irá acelerar nos próximos meses. “No quarto trimestre de 2012, o Brasil estará crescendo a um ritmo de 4% na comparação com igual período de 2011”, disse. “E crescerá acima de 4,5% no primeiro semestre de 2013.” O que garante isso, em primeiro lugar, é a manutenção da demanda doméstica e da expansão moderada do crédito. Nesse ponto, Aldemir Bendine, presidente do Banco do Brasil, completou: “Ampliamos o limite de recursos disponíveis, reduzimos as taxas e estimulamos o debate para o consumo consciente do crédito. Todas essas medidas foram possíveis justamente pelas atuais condições do País.” E, por último, o governo espera os efeitos de medidas tomadas pelo BC que ainda não se manifestaram. Entre elas estão a expressiva redução da taxa básica de juros da economia e a flexibilização das regras de recolhimentos compulsórios (depósitos obrigatórios dos bancos no BC), o que trará mais liquidez ao sistema financeiro.

Segundo Henrique Meirelles, que foi a autoridade máxima do BC nos oito anos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva e agora é presidente do conselho do grupo J&F, o Brasil ingressou em um novo período de sua história. “Estamos entrando na Era da Produtividade, com a queda do desemprego e o aumento do custo salarial”, afirmou. Meirelles acredita que o País aproveitou o bônus da estabilidade para permitir a queda real dos juros e o crescimento do crédito, amparado por um bônus demográfico: a entrada de muitos jovens no mercado de trabalho. Dados apresentados por Tombini mostram que, nos últimos 12 meses, foi criado quase 1,4 milhão de novos postos de trabalho e a massa salarial real avançou 5%. Gustavo Franco, que presidiu a instituição entre 1997 e 1999 e é sócio da Rio Bravo Investimentos, destacou ainda que a economia foi beneficiada por duas “revoluções invisíveis” recentes: a ascensão da classe C e o investimento estrangeiro.

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"Vivemos a já longa Era do Real, mas podemos chamá-la de Era da Estabilidade,
da moeda forte, do respeito às regras e da credibilidade internacional"

Caco Alzugaray, presidente-executivo da Editora Três

Do período que sucedeu a crise de 2008 para cá, Henrique Meirelles diz que ficaram lições importantes. Ao comparar a crise de crédito a um ataque cardíaco, o economista disse que a reação deve ser “precisa e rápida”. “Se for tratada imediatamente, os efeitos colaterais vão diminuir muito”, disse. A afirmação serviu para lembrar da receita utilizada pelo Brasil logo após o colapso do banco Lehman Brothers, em setembro daquele ano. O BC emprestou suas reservas ao mercado e liberou depósitos compulsórios para gerar liquidez interna. “A taxa de concessão de crédito voltou à normalidade em 60 dias”, afirmou. Assim, quando vieram os incentivos fiscais, como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados para automóveis e eletrodomésticos, havia crédito disponível para o consumo. Tombini lembrou que a crise não terminou, mas que “esta não é uma crise nossa”. “A solidez da nossa economia e do nosso sistema financeiro tem sido o nosso diferencial, e tem permitido que o Brasil continue avançando, apesar das turbulências.”

Aos nascidos pós-década de 80, a palavra “estabilidade” pode significar pouco numa economia que há anos preserva o poder de compra dos salários e não convive mais com a hiperinflação. Mas o Brasil, que tem inspirado euforia mundo afora, não faz muito tempo passou por momentos agudos de falta de credibilidade, marcados por pesadelos como o congelamento de preços e o confisco de depósitos bancários. “O real é o oitavo padrão monetário entre 1942 e 1994. Não sei se existe outro país que tenha tido essa sucessão de cortes de zeros e mudanças monetárias”, afirma Franco. “Se não fizéssemos isso, provavelmente a rotina de pagamentos no final do processo teria de contar com carrinhos de mão para carregar dinheiro, como aconteceu na Alemanha.”

Marco do alcance de um novo patamar da economia brasileira, o Plano Real começou a ser articulado em 1993 e foi implementado em 1º de julho de 1994. Com o objetivo de encerrar um período de 30 anos de inflação alta, o programa trouxe confiança para os agentes financeiros e os consumidores, proporcionando condições para o Brasil crescer mais, atrair investimentos e diminuir as desigualdades sociais. Dezoito anos depois, o real, símbolo da estabilidade, chega à maturidade como a moeda definitiva. Para o sócio do banco BTG Pactual Pérsio Arida, que participou do processo de elaboração da nova moeda e foi o primeiro presidente do BC (em 1995) da administração Fernando Henrique Cardoso, “a missão do Plano Real era não deixar que a esperança da estabilização monetária se perdesse mais uma vez”. O economista argumenta que, na época, o principal desafio não era conseguir o apoio da população, mas sim um desafio interno do governo, de criar sustentação para as novas condições econômicas.

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"Esta não é uma crise nossa. A solidez da nossa economia e do nosso sistema
financeiro tem sido o nosso diferencial, e tem permitido que o Brasil continue
avançando, apesar das turbulências que se observam desde 2008"

Alexandre Tombini, atual presidente do BC

“A estabilidade foi duramente conquistada”, disse Armínio Fraga, que esteve à frente do BC de 1999 a 2003 e hoje é sócio da Gávea Investimento. “A gente testou, experimentou muito antes de chegar aonde chegou.” Segundo o economista, os estrangeiros o consultam quando estudam medidas mais heterodoxas e criativas. “Somos depositários de uma certa sabedoria até sobre o que não se deve fazer.” Fraga coloca a estabilidade sobre quatro pilares: inflação baixa e estável, equilíbrio fiscal sustentável (o governo mais do que nunca precisa ter crédito), balanço de pagamentos robusto e estabilidade financeira. Foi a partir do primeiro ano de Fraga no BC que o governo adotou o sistema de metas de inflação por ser mais simples e transparente. Além disso, as metas permitiriam certa suavização das flutuações econômicas, embora não sejam capazes de eliminar os ciclos econômicos, ou seja, a alternância de períodos de crescimento e de recessão. Armínio Fraga aposta que o próximo passo para o fortalecimento da estabilidade no País é a redução gradual da meta de inflação, hoje em 4,5%.

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