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ATITUDE
Gislaine transita nos truculentos bastidores do futebol de cabeça erguida:

“Sou a maior credora de todos os grandes clubes”, diz

Na ruidosa rescisão de contrato entre Ronaldinho Gaúcho e o Clube de Regatas do Flamengo, do Rio de Janeiro, entrou em campo uma das personagens mais polêmicas dos bastidores do futebol brasileiro, a paulista Gislaine Nunes, 45 anos, advogada de cerca de 500 jogadores do futebol brasileiro, entre eles várias estrelas. Foi ela quem conseguiu a liminar na Justiça do Trabalho que desvinculou o craque gaúcho da agremiação carioca. Essa foi apenas a mais recente vitória da doutora de chuteiras. Especialistas calculam que ela tenha conseguido amealhar cerca de R$ 350 milhões para seus clientes da bola em 15 anos no ramo. Como cobra 30% de honorários, Gislaine fez fortuna, faturando cerca de R$ 7 milhões por ano. No caso de Ronaldinho Gaúcho, por exemplo, além de desvincular o atleta do clube, ainda inferniza o rubro-negro com um pedido de indenização de R$ 40 milhões. “Ela não é bem-vista porque vem obtendo algumas decisões que acabam por fazer pó do dinheiro dos clubes”, afirma o advogado Denis España, do Corinthians. “Sou a maior credora de todos os grandes clubes”, gaba-se a advogada.

Certa dose de exibicionismo, um estilo excêntrico e, para alguns, até desbocado, fazem de Gislaine um alvo constante. Atualmente, ela vem sofrendo, inclusive, ameaças de morte. “Colocaram um bicho morto na porta da minha casa, já recebi coroas de flores de funerária e perdi a conta dos e-mails que recebo de gente que diz querer me matar”, afirma. Tanta agressividade fez com que a advogada providenciasse um carro blindado e guarda-costas. Por causa dessas ameaças, é em segurança pessoal que mais tem investido seu respeitável capital. “Com isso, não economizo”, diz. No mais, garante, tem hábitos simples. Mora em Perdizes, zona oeste de São Paulo, com o marido e o filho Júnior, de 21 anos, que trabalham com ela. No mesmo bairro fica o escritório, onde comanda uma equipe de cinco advogados. Costuma almoçar em botecos, não come carne, é adepta da medicina ortomolecular e relaxa de sua média diária de 12 horas de trabalho caminhando nos parques das imediações ou admirando sua coleção de bichos de pelúcia. Costuma trabalhar de jeans e só usa o terninho típico dos advogados em audiências. Mas gosta de roupa boa e assume ter sido frequentadora da Daslu. Viaja bastante, mas apenas a trabalho. Passeio mesmo, só em shopping. “Sou uma pessoa comum”, diz Gislaine, que afirma ter tido depressão há dois anos e meio, quando perdeu o pai.

A advogada que se declara corintiana, mas assume não entender de futebol, também tem seu fã-clube. “Ela é brilhante! Forte demais, conhece todos os meandros. E não visa prejudicar os clubes, mas defender os jogadores”, disse à ISTOÉ o ex-jogador Marcelinho Carioca. “Mandar o Flamengo chorar na cama que é mais quente não é postura de advogado”, critica Paulo Reis, vice-presidente jurídico do Vasco da Gama por 20 anos, referindo-se às declarações dadas por Gislaine após derrotar o Flamengo no episódio Ronaldinho Gaúcho. Ela diz estar acostumada a ser a maltratada no ambiente. “Tem advogado de clube que fala: lá vem a advogada que não tem ética, a cafona, etc. Mas eu não ligo”, afirma. Até quatro anos atrás, ela diz ter sido muito achincalhada porque pesava 136 quilos para seu 1,67 m de altura. “Eu sofria por ter problema de obesidade. Agora estou mais enxutinha”, brinca, revelando que se submeteu à cirurgia de redução de estômago.

Sobre a relação entre clubes e jogadores, a paulista garante que não há respeito. “O mundo do futebol é um dos piores que existem. Aquilo que se assina não se cumpre, e aquilo que não se assina então… é simplesmente terrível!”, afirma. Segundo ela, os times usam artifícios para reduzir os custos com encargos trabalhistas. “Você sabia que muitos clubes me contratam para tirar jogador de um concorrente?”, pergunta. Questionada se esse foi o caso de Ronaldinho Gaúcho, que rescindiu o contrato com o Flamengo na sexta-feira 8 e na segunda-feira 12 já estava treinando com a camisa do Clube Atlético Mineiro, ela responde que não. Apesar de tantas rusgas, a advogada diz que em breve vai apresentar um projeto para salvar os clubes. “Vou tirar todos do buraco. Não posso dar detalhes ainda porque assinamos um contrato de confidencialidade”, diz ela, adiantando que Assis, irmão e empresário de Ronaldinho Gaúcho, é sócio na empreitada.

Além da questão trabalhista, o escritório de Gislaine cuida da imagem e até da vida pessoal de alguns atletas. “O jogador vem de origem humilde e não está preparado para ganhar um caminhão de dinheiro”, afirma a “mãezona”, como muitos a chamam, que se intromete até em questões íntimas. “Eles falam que vão sair e eu pergunto: cadê a camisinha? Nada de usar as delas, não pode. Elas (as chamadas marias chuteiras) já têm tudo planejado”, diz. O relacionamento de amizade rende retribuições. “Ganho carros, roupas de grife, perfumes, joias”, diz.

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Mas nem sempre a vida foi de fartura para Gislaine, nascida em Bauru, interior de São Paulo. Criada para ser dona de casa, ela se casou em 1988, aos 21 anos, com o namorado de infância, o então lateral-esquerdo Evandro, da Ponte Preta, de Campinas (SP). À época, o vínculo entre atletas e clubes era regido pela Lei do Passe, um sistema que beirava a escravidão (leia quadro ao lado). “O Evandro sofreu uma lesão em jogo, foi afastado e o clube simplesmente parou de pagar o salário”, lembra. A família teve que vender os poucos bens que conseguira para sobreviver e quase passou fome, o que não aconteceu porque o pai dela, um ferroviário, começou a abastecer a casa com comida. Formada em advocacia, ela decidiu correr atrás dos direitos do marido, com quem é casada até hoje. “Entrei na Justiça do Trabalho quando ninguém se atrevia a fazer isso. Ganhei, penhorei o que o clube tinha, leiloei tudo e recebi o dinheiro”, diz. Entre os atletas de futebol logo se espalhou a notícia de que uma advogada estava obtendo vitórias na Justiça contra os clubes. E ela passou a ser conhecida como a “A Mulher do Lateral”. Os tempos de miséria acabaram quando Gislaine descobriu que representar jogadores em ações judiciais era uma inesgotável fonte de renda. E de desafetos, como comprovou logo depois.

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