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A primeira individual de Wagner Morales no Rio de Janeiro é constituída por quatro séries de trabalhos que formam um só corpo, coeso e consistente. “Dual Overdrive” é o título que amarra o conjunto: talvez porque o efeito produzido por esse pedal de efeitos de guitarra seja a distorção. Contorcer, reverter, desvirtuar são os efeitos que reverberam no ambiente da Anita Schwartz Galeria de Arte.

Na antessala, a série “Joker” é uma coleção de fotografias de pôsteres da campanha política francesa. Morales, que reside em Paris com a artista Beatriz Toledo – sua mulher, com quem realizou essa série –, perseguiu cartazes em que os rostos dos candidatos foram maculados, seja com spray, seja com navalha. Ao se apropriar dessas imagens destruídas, a dupla interroga a publicidade: sua estratégia de superficialidade e sua mecânica da frontalidade visual. Nas demais obras que integram a mostra, Morales reafirma seu partido da negação. Na grande sala da galeria, instalou dois outdoors de madeira, voltados para as paredes. Não há nada para ver neles além de sua ossatura magra, feita de ripas de madeira barata. “É como se eles tivessem ido parar ali por algum acidente de percurso, um tufão, um tsunami”, conjectura o artista. Mas não, não é acidental. Eles estão ali para enfatizar o rompimento com a lógica do espetáculo – finalidade para a qual se voltam todas as obras da exposição.

A cultura dos bastidores se consolida na surpreendente foto-instalação “Estudo de Balística” – compilação de imagens de cuspes encontrados nas calçadas acinzentadas das cidades e posicionada aqui, desavisadamente, sob um dos outdoors – e na série “Vicinais”. Essas fotos – de lugares feios, sujos e abandonados, que não se escondem nas periferias das cidades – são pregadas sem moldura diretamente sobre a parede e interligadas por um risco de spray verde. “Para mim não há importância no que está sendo fotografado, tenho vontade de preservar a banalidade das coisas. Há também uma espécie de “autovandalismo” no spray de tinta que perpassa todas as imagens. Algo que confirma uma despretensão, uma vontade de negar a cultura do bom acabamento e do “beletrismo” do mundo da fotografia”, afirma Morales.

Tudo isso está envolto pelo incômodo som amplificado do ar-condicionado da galeria. Em “Dual Overdrive”, Wagner Morales recolhe imagens e objetos das periferias da civilização. Não para cantá-los em versos, mas para expor seus reversos. P.A.