Quem visita o agricultor mineiro Luís Arécio Ferreira, 33 anos, morador da comunidade de Córrego da Mandinga, em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha (MG), não se despede sem antes conhecer todos os detalhes da casa nova de alvenaria e de uma enorme cisterna com capacidade para 20 mil litros, seus maiores tesouros. Ele e a mulher, a
também agricultora Cleuza Alves de Jesus, 32 anos, não cabem em si de orgulho. Não é difícil entender tanta empolgação. Há dois anos, o casal e os três filhos moravam num quarto e cozinha de chão batido e o poço mais próximo ficava a três horas de caminhada. “Lavar, passar, cozinhar, tomar banho, tudo era um sofrimento”, lembra o agricultor. A casa de alvenaria tem dois dormitórios, sala, cozinha e banheiro e um sistema de captação de água, feito com uma calha instalada no beiral do telhado. O sistema permite armazenar a água da chuva. “Isso mudou a nossa vida, nos trouxe realização e esperança” conta Ferreira. O entusiasmo é compartilhado por outras dez famílias, que se organizaram e estão cultivando hortaliças, frutas, feijão, arroz e iniciaram até uma criação de peixes.

Parceria – As medidas simples que transformaram o cotidiano de várias
famílias fazem parte do Programa de Desenvolvimento Humano Sustentado
(PDHS), criado pelo Fundo Cristão para Crianças. A organização não-governamental mantém ações em todo o mundo há 37 anos e trabalha em cinco Estados brasileiros, com educação, saúde e desenvolvimento comunitário e econômico. O objetivo é garantir a segurança alimentar e promover a geração de renda, o que está ocorrendo com mais 721 famílias de outras comunidades. Elas tiveram as casas reformadas e ganharam saneamento básico, lavanderias, açudes e lavouras comunitárias que enriquecem a alimentação de 2,6 mil crianças de dois a seis anos, atendidas em 85 creches. “Tínhamos muitas mortes aqui provocadas pelo barbeiro, transmissor da doença de Chagas. As casas de alvenaria diminuem esse risco. O fundo deu o material, orientou a construção das cisternas e as famílias se encarregaram de levantar as casas. Foi uma parceria feliz”, afirma José Luiz Esteves, diretor nacional do Fundo Cristão.

Incentivo – O projeto, que tem apoio da Universidade Federal de Viçosa, da
Auburn University (EUA) e do Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais, não custou mais de R$ 800 mil e foi uma experência-modelo. A escolha do Vale do Jequitinhonha não foi ao acaso. Localizado a 650 quilômetros da capital, Belo Horizonte, é umas das regiões mais pobres do País e abriga cerca de 800 mil pessoas, a maioria na zona rural. Famílias com sete filhos em média sobrevivem sem trabalho, comida, luz elétrica e atendimento médico. Vivem de bico, o que lhes rende no máximo R$ 5 por dia. Incentivadas pelos resultados, famílias inteiras têm se envolvido nas tarefas propostas pelo programa.

Essa união de esforços está transformando o cenário tórrido e infrutífero da região. Na comunidade Empoeira, região sul do Vale, por exemplo, o milagre veio com uma horta comunitária criada há dois anos. Seus 300 moradores agora têm uma alimentação mais rica e vendem hortaliças, frutas e legumes. “A prefeitura disponibilizou máquinas, nós ensinamos aos moradores técnicas de plantio e cultivo e fornecemos as sementes. Com orientação e apoio, eles mesmos resolvem suas necessidades”, conta o engenheiro agrônomo Carlos Eduardo Siste, coordenador do PDHS no Vale. Os moradores comemoram. “A gente só plantava na época das águas. Se chovesse, a gente colhia, mas isso era raro. Hoje, temos comida o ano inteiro. Não há dinheiro que pague isso”, conta a agricultora Joana Ferreira de Passos, mãe de oito filhos.

Voluntários – O Fundo Cristão, que hoje atende a 23 dos 52 municípios do Vale, quer ampliar a atuação do PDHS. “Estamos buscando parceiros na iniciativa privada”, explica Obedes Barbosa Soares, diretor de programas do Fundo Cristão. Para atender melhor as crianças, a ong adota o sistema de apadrinhamento. Todas as crianças envolvidas nos programas são cadastradas e ficam à espera de voluntários que contribuam com R$ 37 por mês. O sistema foi criado pelo casal de médicos americanos Calvitt e Helen Clarke, que fundou a instituição em 1938, logo após o fim da guerra entre japoneses e chineses – conflito que começou em 1931 com a invasão da China pelo Japão e durou vários anos. O alvo eram os milhares de órfãos dos dois países. No Brasil, já existem 85,5 mil crianças apadrinhadas, 87% por estrangeiros e apenas 13% por brasileiros.

Serviço: Para participar basta acessar o site www.apadrinhamento.org.br
ou ligar para 0800 900 110