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"A moda é uma filha da puta.” Com essa frase, começa a entrevista feita pela jornalista Nina Lemos com a outrora mais temida e observada editora de moda do Brasil. Uma espécie de proto-Edna Mode verde-amarela (quem não conhece deveria conhecer a figurinha especialista em moda para super-heróis do longa de animação “Os Incríveis”, supostamente inspirada na famosa editora americana Anna Wintour, que também forneceu o DNA para o personagem de Meryl Streep em “O Diabo Veste Prada”), a senhora retratada em seu apartamento na foto ao lado esteve por décadas à frente de algumas das mais importantes revistas e cadernos de jornais dedicados à moda, num tempo em que, inclusive segundo ela própria, esse universo flertava com a arte e cumpria outras funções além de servir como parte importante de um ciclo industrial e comercial que movimenta muito dinheiro.

Na entrevista, Regina Guerreiro mostra que carrega nome e sobrenome adequados. De certa forma se sentia e agia como uma espécie de rainha em seu latifúndio e, ao mesmo tempo, se vê como uma permanente batalhadora e guerreira do tipo que nunca se furtou a arregaçar as mangas e meter a mão na massa para chegar aos resultados que perseguia numa época em que photoshop não passava de algo escrito na placa de uma loja especializada em câmeras, filmes e artigos fotográficos.

Para Regina, a moda parece ter perdido muito de seu sentido e, pior, de sua graça. Com seu jeito ferino e cheio de piadas de retrogosto ácido, diz que a moda de hoje massacra a mulher e é feita para que ela se sinta um lixo por não ser magérrima. Critica a falta de criatividade, o excesso de “dinheirismo” e de estilistas que poderiam estar vendendo sardinhas ou geladeiras.

A entrevista de Regina a Nina Lemos sairá na revista “TPM” de junho, mas o leitor da coluna pode conhecer antes e com exclusividade algumas das melhores frases dessa senhora de 72 anos, até hoje considerada por muitos como a grande dama dos alfinetes.

Carreira como editora de moda:
“Tenho um jeito obsessivo de fazer. Sou perfeccionista. E fazia antes de existir photoshop e computador. Em Paris, escrevia as matérias à mão e depois mandava por telex (risos). E, outra coisa, não existia tratamento de imagem. Era tão difícil que você realmente passava uma noite em uma foto para que ela saísse leve. Era tipo receita de bolo. Por um triz acontece a magia e por um triz acontece o horror. A minha carreira é uma carreira de muita batalha, de muito trabalho. Eu não tive padrinho. O meu sangue é rosa-shocking, não é azul [risos]. E acho que influenciei muito as pessoas, fiz elas verem a moda como algo importante. E hoje, sinceramente, não acho mais tão importante, sinto dizer.”

A moda hoje:
“A moda foi banalizada. O corpo da mulher foi banalizado. A mulher é vista como objeto de consumo puro e simples. A moda hoje é só produção. A arte? Estilista podia estar vendendo sardinha ou geladeira (risos). Ele é um business man. Isso tudo prostituiu a moda. Acabou com a arte.”

A crítica de moda:
“Uma coisa é que as pessoas querem ser amadas. Todo mundo quer. Eu também quero ser amada. Não quero que as pessoas me olhem e falem: ‘Ah, olha lá a maldita’. As pessoas confundem. Não é ‘gostei e não gostei’. Isso não é crítica. É falar como desenvolveu, qual é a referência, de onde veio e para onde vai.”

Vítimas da moda:
“Todo mundo virou vítima da moda. Ser vítima da moda é querer ser essa mulher que todo mundo quer, mas que você não é. O lance seria você ir na contramão disso, seria você ser você mesma. E, na hora que encontrar uma pessoa que gosta de você, ela vai gostar de você de verdade. Não daquela personagem que você criou.”

Influências negativas:
“Acho que a moda prejudica, sim. Essa nova moda que virou essa coisa filha da puta. A minha mãe era uma mulher normal. Com seios normais, com uma bunda normal. Em qualquer livro que conta a história da moda, você vê que aconteceu um processo de violação com o corpo da mulher. Antes, podia ter bunda. Hoje não pode mais ter. É uma coisa horrível. Essas modelos que se sentem velhas com 20 e poucos anos.
”Por que a moda ficou assim?
“Porque é mais fácil fazer roupa para quem não tem formas. É o tal negócio. O talento do corte. Se você faz uma moda industrializada, tudo o que precisa é de um cabide. Mas, vou te falar uma coisa, quem insiste em não fazer roupa para quem é mais gorda ou normal… Tem muita gente falindo, né? Como você vai fazer roupa para gente que não existe, por preços irreais? Roupa brasileira por R$ 5 mil? A classe média vai se vestir como? Matando o marido para conseguir a roupa (risos.)?”