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"Hoje, depois da operação, posso saborear
um doce de vez em quando"

Fábio Takechi, 44 anos, diretor comercial, de São Paulo

A experiência clínica dos especialistas e estudos recentes indicam que a cirurgia de redução de estômago é capaz de provocar a remissão da diabetes tipo 2. Geralmente associada à obesidade, a doença é caracterizada pela incapacidade de o organismo aproveitar corretamente a insulina, o hormônio que possibilita a entrada nas células da glicose que circula no sangue. O acúmulo de glicose prejudica diversas funções e eleva o risco para enfermidades cardiovasculares.

Nos últimos dois meses, dois importantes trabalhos demonstraram o poder da cirurgia no combate à doença. Em março, o respeitado jornal científico “The New England Journal of Medicine” publicou a pesquisa sobre a técnica realizada pelo New York Presbiterian Hospital (EUA) e Universidade Católica de Roma (Itália). Os cientistas constataram que a operação permitiu a remissão da doença (os índices de glicose voltaram ao normal) em 95% dos pacientes que passaram pela cirurgia de bypass por Y de Roux, a mais bem-sucedida para essa finalidade. Em junho, será editada na “Diabetes Care” outra publicação científica importante, um estudo brasileiro que chegou a um índice de 88% de doentes que entraram em remissão após serem submetidos ao mesmo método e a outros 11% nos quais houve melhoria significativa da glicemia. O Brasil, que virou referência no assunto, também sediou no último fim de semana o Congresso Internacional de Cirurgia Metabólica.

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ENERGIA
O empresário João Zanatta diz que ganhou mais disposição
após ter sido submetido ao procedimento

O mote foi tirar a cirurgia da berlinda e colocá-la como uma opção de tratamento efetivo. “E não é uma alternativa extrema”, explicou à ISTOÉ o cirurgião Francesco Rubino, autor da pesquisa americana e pioneiro em estudos de cirurgia metabólica no mundo. “É um tratamento para pacientes obesos com diabetes severa.” Nos consultórios, seus efeitos já eram observados. “Vivenciamos diariamente a remissão da doença por meio da cirurgia”, diz Gustavo Peixoto, da Universidade Federal do Espírito Santo.

Em São Paulo, o diretor comercial Fábio Takechi, 44 anos, e o empresário João Zanatta, 63, são exemplos do que afirma o médico. Takechi já havia sido obrigado a colocar na artéria coronária um stent – espécie de mola que mantém o vaso sanguíneo desobstruído. Depois de tentar exaustivamente controlar a diabetes, optou pela cirurgia. “Era uma espiral”, diz. “Fazia exercícios, perdia três quilos, tentava fazer mais ginástica, mas acabava cheio de lesões e ganhava peso novamente”, lembra. Hoje, após o procedimento, sente-se à vontade inclusive para saborear de vez em quando um doce, com autorização médica. Zanatta, por sua vez, ganhou nova disposição para a vida depois da operação. Antes, sentia-se cansado após anos e anos tentando controlar a doença, sem muito sucesso. “Pensei que não teria tempo de organizar tudo para os meus filhos antes de morrer”, diz. Hoje, ele divide as refeições em pequenas porções e diz nunca ter sentido tanta energia. “Foi a melhor decisão que tomei na vida.”

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CAMPANHA
Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU, está
envolvido na mobilização internacional

No tipo de cirurgia bariátrica usada contra a diabetes, parte do estômago é grampeada e há um desvio do intestino inicial, com exclusão do duodeno, que fica em formato de “Y”. O mecanismo pelo qual a operação derruba a glicemia ainda não está esclarecido. “Há uma ação antidiabética direta, não relacionada com a perda de peso”, explica Ricardo Cohen, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Metabólica e um dos autores da pesquisa brasileira.

A hipótese é que, a partir do rearranjo do intestino, a cirurgia daria espaço a um novo caminho metabólico com repercussões na taxa de açúcar. “Há evidências de aumento de secreção de incretinas, hormônios que ajudam na produção de insulina”, diz Cohen. “Saber de que modo a cirurgia atua seria uma maneira de entender melhor a doença e solucioná-la, quem sabe, com outras terapias”, diz o endocrinologista Jorge Gross, do Hospital das Clínicas de Porto Alegre. “É preciso investir em pesquisas que impeçam a progressão da doença”, explica o endocrinologista Antônio Chacra, da Universidade Federal de São Paulo.

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Os médicos também estão tentando estabelecer critérios mais apropriados de indicação. Hoje, só pode ser recomendada a pacientes que não controlam a doença há pelo menos dois anos e têm Índice de Massa Corporal superior a 35 (obesidade mórbida). “Mas, apesar de uma aparência saudável, pessoas magras podem ter excesso de gordura maligna que esconde diversas doenças, inclusive a diabetes”, diz Cohen.

A cirurgia, porém, ainda suscita polêmicas. Há quem diga que seus efeitos ainda não foram totalmente mapeados. Outros questionam se o procedimento não levaria a uma dificuldade de absorção de vitaminas que, no futuro, poderia causar mais danos do que benefícios. Outra resistência para sua adoção em larga escala é seu custo, que pode chegar a R$ 15 mil (aberta) ou a R$ 22 mil por videolaparoscopia (com corte mínimo). 

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