14/05/2021 - 16:04
A Última Ceia é uma das obras de arte mais importantes e conhecidas, além de ser a pintura religiosa mais famosa do mundo. Foi criada por Leonardo da Vinci, que teve que se reinventar para conseguir produzir uma pintura de grandes dimensões e com características bem diferentes de outras da época.
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A obra tem mais de 500 anos e continua despertando a atenção de todos com seus mistérios. Selecionei para a coluna de hoje 20 curiosidades da Última Ceia para que esses detalhes chamem a atenção de todos para essa obra, que está instalada no refeitório de um convento italiano.
1-É maior do que você imagina– Para quem ficou decepcionado com o tamanho do quadro da Monalisa, a boa notícia é que “A Última Ceia” é maior do que se imagina: mede 4,6 metros de altura por 8,8 metros de comprimento. A obra também é chamada de “Santa Ceia”. Leonardo nunca tinha trabalhado em uma pintura tão grande como essa e não tinha experiência em pintura em afresco, cuja superfície seca rapidamente.
2-Está no refeitório de um convento– Sim, a obra fica dentro do convento da igreja Santa Maria delle Grazie, em Milão (Itália). A igreja e o museu foram declarados Patrimônio Mundial da Unesco. O local fica dez minutos a pé depois da estação de metrô Milano Cadorna, ou apenas a 15 minutos a pé do Duomo. Quando vi a obra pela primeira vez, os cuidados com o local e as restrições de visitação não eram tão intensos. Hoje em dia é bem difícil conseguir ingresso, mas a visita é imperdível.
3-Foi patrocinada- Muitos mosteiros e conventos eram mantidos na época por patronos locais. O duque Ludovico Sforza adotou o convento dominicano de Santa Maria delle Grazie e chamou Leonardo Da Vinci para criar a obra que seria instalada em um refeitório que seria usado pelos monges em suas refeições coletivas. O salão era muito grande, precisava de uma decoração e A Última Ceia foi escolhida como o tema religioso para a pintura. Os brasões Sforza aparecem com as iniciais da família nas três lunetas acima do mural. Quando o duque encomendou a pintura aos frades, Leonardo da Vinci tinha 42 anos. Era bastante conhecido, mas sofria com a fama de nunca terminar os projetos. Trabalhou de 1495-1498 em ritmo lento, mas conseguiu acabar a obra e melhorar sua fama.
4-Teve que fugir do óbvio- A Última Ceia é um dos temas mais populares da arte cristã. Além disso, no século 15, muitos artistas renomados produziram obras retratando a cena, em especial quando eram chamados para pintar paredes de refeitórios de conventos. Normalmente, essas pinturas mostram Cristo partindo o pão, instituindo, assim, o sacramento mais sagrado do Cristianismo: a Eucaristia. O problema é que a quantidade de pinturas deste tema acabou banalizado a cena, que é tão representativa para a Igreja e seus fiéis. Portanto, Leonardo da Vinci enfrentou o enorme desafio de criar algo totalmente novo e encontrar uma solução para resolver os problemas que pintores como Ghirlandaio e Castagno não conseguiram encontrar uma saída. Leonardo teve que criar uma composição que não apenas transmitisse a história e suas mensagens principais, mas, também, envolvesse o observador em um nível profundamente emocional. A solução foi brilhante: Leonardo decidiu não representar a Eucaristia, mas o momento dramático do Evangelho que Jesus anuncia que um de seus apóstolos o trairá. Intensificou o drama e evitou as típicas interpretações sóbrias e sem vida da cena. A pintura parece viva e é um tour de realismo emocional, isso sem falar que Leonardo retrata os apóstolos como pessoas comuns, sem indícios de santidade.
5-Grande importância religiosa– A Última Ceia foi a refeição que que Jesus teve com seus apóstolos em Jerusalém antes de ser capturado e crucificado. A pintura é uma referência para todos nós e nos acompanha há centenas de anos. Leonardo da Vinci captura o instante quando Jesus revela que um de seus amigos o trairá. Mostra momentos antes da Eucaristia, com Jesus pegando o pão e uma taça de vinho como símbolos-chave do sacramento cristão.
6-Proposta celestial– A pintura é ancorada por um triângulo equilátero formado pelo corpo de Cristo. Essas formas geométricas ideais referem-se ao interesse renascentista pelo neoplatonismo, um elemento humanista que reconcilia aspectos da filosofia grega com a teologia cristã. A geometria, usada pelos gregos para expressar a perfeição celestial, foi usada por Leonardo para celebrar Cristo como a personificação do céu na terra. A pintura mostra uma paisagem verdejante além das janelas. Frequentemente interpretado como paraíso, tem sido sugerido que esse santuário celestial só pode ser alcançado por meio de Cristo. Os doze apóstolos foram organizados em quatro grupos de três. Note que há três janelas na obra. O número três é uma referência à Santíssima Trindade na arte católica.
7-Nova técnica- A obra não é um afresco porque não foi criada em gesso úmido. Leonardo da Vinci rejeitou a técnica tradicional porque desejava alcançar uma luminosidade maior e desejava pintar com calma, sem a pressa que o gesso exige dos artistas por secar rapidamente. Para dedicar todo o tempo necessário a cada detalhe, Leonardo da Vinci inventou uma técnica própria, utilizando tintas têmpera sobre pedra, após preparar a parede para receber a pintura. Leonardo acreditava que postura, gesto e expressão devem manifestar as noções da mente. Portanto, cada um dos 12 discípulos reage de uma maneira adequada à personalidade de cada um. O resultado é um estudo complexo de emoções humanas variadas, apresentado em uma composição que parece inicialmente simples, mas na realidade é extremamente complexa e planejada nos detalhes.
8-Parede descascada- Leonardo fez um experimento para misturar uma mistura de tempura e tintas a óleo para pintar os afrescos em um gesso seco. A ideia parecia genial, mas a parede começou a descascar logo na sequência, quando ele ainda estava vivo. Em apenas 20 anos, a pintura já estava em péssimo estado.
9-Perspectiva– Leonardo da Vinci usou barbantes e pregos para conseguir criar a perspectiva da obra. Os conhecimentos de matemática de Leonardo foram fundamentais para a criação da perspectiva da obra. Todos os elementos da pintura direcionam a atenção para a cabeça de Cristo. Para conseguir esse efeito, Leonardo colocou um prego no meio da pintura e puxou cordões para as extremidades para criar um desenho absolutamente proporcional.
10-Símbolos- A Última Ceia contém várias alusões ao número três. Na arte católica, três representa a divindade ou a Santíssima Trindade. Existem 3 janelas, os apóstolos estão em 3 grupos e Jesus tem uma forma triangular. Também se teoriza que A Última Ceia é uma representação do sistema solar e do zodíaco. Cada apóstolo reflete a característica dos 12 sinais. Por exemplo, Cristo é o Sol iluminando a cena com sua luz divina. Judas representa Escorpião na posição de Marte, um sinal de morte.
11-Mensagem secreta- Músicos especularam que a verdadeira mensagem oculta em A Última Ceia é, na verdade, uma trilha sonora que o acompanha. Em 2007, o músico italiano Giovanni Maria Pala criou 40 segundos de uma canção sombria usando notas supostamente codificadas a partir da obra de Da Vinci. Três anos depois, a pesquisadora do Vaticano Sabrina Sforza Galitzia traduziu os sinais matemáticos e astrológicos da pintura em uma mensagem de Leonardo da Vinci sobre o fim do mundo. Ela afirma que A Última Ceia prevê um dilúvio apocalíptico que varrerá o globo de 21 de março a 1 de novembro de 4006.
12-Comida em debate- Dizem que o sal derramado diante de Judas representa sua traição e o peixe pode representar doutrinação e, portanto, fé em Jesus. No entanto, se for arenque, pode simbolizar um descrente que nega a religião. Cada pessoa à mesa se reveza para mergulhar seu pão nele. Leonardo colocou Cristo e os discípulos em uma mesa retangular para mostrar bem os movimentos de cada personagem. Molhar o pão enquanto a pessoa à sua frente está fazendo isso é altamente desrespeitoso. Na pintura, Judas também derrubou o sal, trazendo azar.
13-Judas pode ter sido um criminoso real– Especialistas dizem que cada apóstolo foi criado a partir de um modelo da vida real. Quando chegou a hora de escolher o rosto do traidor Judas (o quinto da esquerda, segurando uma bolsa de prata com dinheiro do suborno), Leonardo da Vinci procurou um criminoso nas prisões de Milão para criar sua aparência.
14-João ou Maria- Há significados ocultos na Última Ceia que ainda estão sendo debatidos mais de quinhentos anos após sua criação. À direita de Jesus na pintura está João, o discípulo a quem Jesus amava. Mas, muitos estudiosos de arte e da Bíblia realmente acreditam que a pessoa à direita de Jesus na pintura é uma mulher, muito provavelmente Maria Madalena. Ela é a única figura da pintura que usa um colar. As especulações sobre isso começaram com “The Templar Revelation”, de Lynn Picknett e Clive Prince, e ganharam visibilidade mundial com o livro e o filme “Código da Vinci”, de Dan Brown. Leonardo era conhecido por pintar homens andróginos com cachos luxuriantes. Prova disso é que a própria Mona lisa tem traços do rosto de Salai, seu pupilo e assistente. Saba mais sobre a Mona Lisa em recente texto que escrevi sobre essa obra (link para a coluna).
15-Composição perfeita- Leonardo era conhecido por seu amor pela simetria. Note os detalhes da pintura, a divisão equilibrada de apóstolos dos dois lados da pintura. A postura serena de Jesus contrasta com a agitação dos apóstolos. Tiago, à esquerda de Cristo, estende os braços com raiva enquanto o Tomás aponta para cima e parece questionar o plano de Deus. Pedro aparece com uma faca em sua mão. Judas segura uma bolsa que contém sua recompensa por trair Jesus. O restante dos apóstolos se movimenta, como se estivessem sussurrando e lamentando o momento.
16-Danos na obra- Após o Renascimento, a igreja foi amplamente ignorada. Uma porta foi até cortada na parte inferior da “Última Ceia”, eliminando parte da mesa e dos pés de Jesus Cristo. Depois disso, o refeitório inundou algumas vezes e sofreu com a guerra.
17-Segunda Guerra Mundial quase destruiu a obra- Os bombardeios dos aliados durante a guerra contribuíram para prejudicar seriamente o estado da pintura. A igreja foi atacada. Uma bomba chegou a derrubar seu telhado. Depois disso, as tropas de Napoleão chegaram a usar o refeitório como um estábulo e alguns soldados jogaram tijolos na pintura. Como se não bastasse tudo isso, as explosões e incêndios que se seguiram mataram mais de 700 pessoas e destruíram muitos dos edifícios e monumentos mais importantes da Milão, incluindo uma parte significativa de Santa Maria delle Grazie. Milagrosamente, a parede do refeitório com a pintura de Leonardo da Vinci sobreviveu, provavelmente porque tinha sido escorada com sacos de areia e colchões dos frades. Católicos indicam que foi um verdadeiro milagre a obra ter sobrevivido aos diversos ataques que sofreu.
18-Restaurações– A obra foi restaurada muitas vezes e o experimento de têmpera sobre pedra de Leonardo Da Vinci demanda um acompanhamento de especialistas. Pouco do que se vê hoje em dia contém as pinceladas do próprio artista. O primeiro restauro ocorreu em 1726 e o mais longo foi o de 1999 que, em vez de tentar restaurar a imagem, foi feito um trabalho para conter a deterioração. Com isso, foi possível descobrir a pintura original de Leonardo depois de 12.000 horas de trabalho estrutural e 38.000 horas de restauração na própria pintura. Em 2019, a rede Eataly patrocinou a instalação de um sistema de filtragem de ar para filtrar o ar fresco e limpo para o refeitório e controlar seu microclima. Ele foi projetado para reverter os anos de poluição do ar, contaminação biológica, umidade e turismo de massa. Mesmo assim, o público ainda é uma ameaça para a conservação da obra. Como era de se esperar, as restaurações foram incluindo camadas e camadas de tinta, abandonando a obra original que tem mais de 500 anos.
19-Melhor local para visualização- Descobriu-se mais tarde que o local perfeito para admirar A Última Ceia está a quase 5 metros acima do solo. Leonardo provavelmente escolheu essa altura relativamente alta porque a borda inferior da pintura está a uma altura de 2,5 metros. Consequentemente, a obra parece estar em desacordo com o espaço do refeitório. Esse é um dos muitos paradoxos visuais da pintura, assim como o tamanho da mesa (muito grande para caber na sala retratada e pequena para acomodar 13 personagens. A cena cria a ilusão de um espaço tridimensional, algo surpreendente até os dias atuais.
20-Réplicas- A Última Ceia é a pintura mais copiadas da história da humanidade, porém poucas são precisas. Uma delas foi produzida por Leonardo em sua oficina e outra foi criada em 1506 a partir de uma encomenda feita por Luís XII, que queria ter sua própria Última Ceia. Mas essa réplica nunca chegou à França. Há também uma cópia em tamanho real de A Última Ceia na Royal Academy of Arts de Londres. É um óleo sobre tela executado por volta de 1520, atribuído a um aluno de Leonardo da Vinci. A pintura inclui vários detalhes perdidos, como os pés de Cristo. Existe uma réplica de Andrea Solari no Museu Leonardo da Vinci e há uma cópia de Cesare da Sesto. Muitos outros pintores também fizeram suas interpretações a partir da obra de Leonardo da Vinci, entre os quais Salvador Dali, Andy Warhol, Susan Dorothea White e Vik Muniz, que chegou a fazer uma versão com calda de chocolate.
Como dizia Leonardo da Vinci, “a beleza perece na vida, mas é imortal na arte”. Se tiver uma boa história para compartilhar, aguardo contato pelo Instagram Keka Consiglio, Facebook ou Twitter.