José Roberto Arruda vem se mostrando um personagem político incomum. Único governador eleito pelos Democratas, ele abandonou o velho clientelismo do PFL para colocar em prática a nova receita do partido: combater o inchaço da máquina para garantir recursos que financiem o desenvolvimento. Na capital do funcionalismo público, Arruda demitiu 31.500 servidores, logo no primeiro dia de mandato. Nomeou apenas oito mil, metade dos quais concursados. “Eu peguei um governo inchado no aparelho público, um governo aparelhado de maneira clientelística e com uma dívida de R$ 750 milhões”, diz o governador, que preserva o forte sotaque mineiro (ele é de Itajubá). “Ou eu cortava despesas e organizava as finanças ou ficava escravo dessa herança; não seria governador, apenas passaria pelo governo”, constata.

Arruda reconhece, contudo, que medidas como essa estão longe de ser unanimidade. Em sua avaliação, as classes A e B receberam bem o corte de despesas públicas – que incluíram, além da demissão de apaniguados, a devolução de prédios e carros alugados pela administração. O contraponto, ele próprio admite, é uma certa impopularidade inicial junto às classes D e E, que formam a maioria de seu eleitorado. E isso é compreensível, pondera, porque o governo tomou outras medidas duras que afetam esses segmentos, entre elas a retirada de circulação das vans ilegais e a proibição de construção de casas em áreas irregulares, demolindo muitas delas. O governador fez isso, alega, para evitar que a capital federal repita o mesmo erro do Rio de Janeiro, “uma cidade agradável de se viver 30 anos atrás” que se deteriorou devido à “ocupação irregular das encostas, à favelização do centro urbano”, seguidas pelo desemprego, violência e tráfico de drogas. “O governo, para ser bom, tem que ser mais de leis do que de homens”, diz Arruda repetindo a máxima do conterrâneo Milton Campos (1900- 1972), paladino do liberalismo udenista.

Ele está ciente de que essas medidas iniciais contrariaram interesses, mas espera reverter o desgaste entre os estratos mais pobres da população com obras que beneficiem essa camada social, como asfaltamento de vias públicas e construção de escolas. Dinheiro para isso, Arruda tem: em seis meses, o governo do DF economizou R$ 500 milhões. “Pretendo chegar a 31 de dezembro com uma economia bruta, em custeio, de R$ 900 milhões.”

Aos 53 anos, o governador Arruda não tem problemas em falar do seu pior momento. Em 2001, Arruda estava no PSDB e era líder do governo FHC no Senado quando teve que renunciar ao mandato no episódio da violação do painel eletrônico da casa. Em reportagem de ISTOÉ, foi acusado de quebra de decoro parlamentar por ter levantado a lista de como votaram os senadores durante a sessão secreta que cassou Luiz Estevão (PMDBDF) em 2000. “Eu olhei uma lista que não deveria ter olhado, tentei mentir sobre isso, fui pego com a boca na botija e tive que renunciar”, diz, sem pestanejar. A admissão do erro foi seguida por um pedido de “uma nova chance” ao eleitorado. Ele a obteve: nas eleições de 2002, foi o deputado federal mais votado em Brasília. E, no ano passado, elegeu-se governador do Distrito Federal. Com tantos resultados positivos, o que incomoda Arruda são as especulações – como único governador do DEM, ele é nome natural à sucessão de Lula. “Eu não tenho projeto político para o futuro, eu já estou no meu futuro”, diz. “O homem é ele, suas circunstâncias e o seu destino”, filosofa, completando a definição do espanhol Ortega y Gasset, autor de A rebelião das massas. Respeitou as circunstâncias e o destino, ele garante, realizando seu sonho de provar que, por maior que seja o tropeço na vida de um homem, “se ele tiver humildade para reconhecer o erro e coragem para trabalhar, pode recomeçar”. Critica os colegas políticos não por errarem, mas por não reconhecerem os deslizes. “O homem é falível por definição. Por isso a sociedade não aceita mais políticos que se colocam como ungidos do Espírito Santo.” E faz um desafio: “Encontre, em toda a história da vida pública brasileira, um outro político que reconheceu publicamente seu erro.”