chamada.jpg
IMAGEM ARRANHADA
Para a oposição trabalhista, o governo conservador de
Cameron tem se pautado pela defesa de interesses privados

Nos últimos anos, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, construiu uma imagem de gestor discreto e eficiente. A admiração foi reforçada pelo bom desempenho econômico do Reino Unido, que enfrentou a crise europeia sem sustos. Na semana passada, a reputação de Cameron, porém, sofreu um revés. Um sujeito chamado Peter Cruddas, ex-tesoureiro do Partido Conservador, o mesmo do premiê, foi flagrado tentando negociar a venda de acesso à alta cúpula do governo em troca de donativos. Cruddas chegou a dizer para repórteres do jornal “Sunday Times”, que estavam disfarçados de empresários alemães, que era possível burlar a lei que impede pessoas não domiciliadas no Reino Unido de fazer doações a partidos políticos. Mais: garantiu que, por uma quantia de cerca de US$ 400 mil, eles teriam acesso “de primeira linha” a jantares com o primeiro-ministro. “Nesse ambiente, tudo é confidencial”, disse o ex-tesoureiro diante das câmeras ocultas. “Você pode fazer praticamente qualquer pergunta que quiser.”

Apesar de negar ter se encontrado com pessoas indicadas por Cruddas, Cameron foi pressionado pela oposição trabalhista a divulgar as listas de convidados de seus jantares. Lá estão os 17 maiores doadores do Partido Conservador – juntos, eles deram cerca de US$ 36,5 milhões para a legenda. Agora, os britânicos se perguntam em que medida o trânsito de Cameron pelos círculos mais endinheirados de Londres influenciou suas recentes e controvertidas políticas econômicas e militares. Segundo os trabalhistas, o caso reforça as suspeitas de que o governo tem se pautado por interesses privados – uma tese que será explorada ao máximo pela oposição. Medidas controversas adotadas por Cameron agravaram a situação. Poucos dias antes da crise, o governo apresentou um orçamento que vem sendo considerado o mais impopular da história recente do país. As novas diretrizes incluem uma redução de 50% para 45% na alíquota máxima de imposto de renda para os mais abastados, uma mudança que havia sido defendida por alguns dos convidados de Cameron antes da apresentação do plano.

Para Victoria Honeyman, especialista em política britânica da Universidade de Leeds, a relação quase automática entre o novo orçamento e a lista de convidados de Cameron deve ser tomada com cautela. “É possível que em questões menores, mais específicas, a visão dos doadores possa ter alguma influência, mas poderíamos facilmente argumentar que alguns empresários são especialistas em suas áreas e, portanto, deveriam estar em contato constante com o governo em algumas matérias”, diz Victoria. Segundo ela, apesar de não ter sido provado que o governo foi pago para implementar quaisquer políticas, as denúncias retomam o debate sobre o financiamento público dos partidos, ainda que a proposta encontre pouco eco por conta de sua impopularidade, especialmente em tempos de crise. “O escândalo é sobre se uma doação partidária pode dar acesso a lideranças governamentais, o que não é ilegal, mas pode ser visto como imoral”, diz Victoria. “Há fumaça, mas até agora ninguém localizou o fogo.”

Um caso particular vem sendo colocado como principal exemplo dessa situação: é o de Ian Taylor, convidado para jantar na residência de Cameron no dia 11 de novembro de 2011. Presidente da Vitol, a maior empresa de comercialização de petróleo do mundo, Taylor teve papel fundamental na insurreição que derrubou o coronel Muamar Kadafi na Líbia ao garantir gasolina e ingressos aos rebeldes por meio da venda de seu petróleo no mercado internacional. O controverso acordo, que pode ter alcançado US$ 800 milhões, envolveu também Alan Duncan, ministro de Desenvolvimento Internacional e beneficiário de doações políticas de Taylor. Coincidência ou não, o encontro entre o empresário e o primeiro-ministro aconteceu menos de duas semanas após a morte do ditador líbio e da instauração de um governo apoiado pelo Reino Unido.

img.jpg

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias