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SÍMBOLO O lendário Museu do Louvre
e sua imponente pirâmide

Aux armes, citoyens! O grito de guerra da Marselhesa volta a ecoar nas ruas de Paris. Mas no mundo globalizado não são as massas que vão às barricadas para as jornadas revolucionárias, mas os intelectuais – essa entidade tão tipicamente francesa –, que voltam a apelar para os manifestos, como no final do século XIX. Nada menos que cinco mil pessoas – entre elas curadores, historiadores e arqueólogos – assinaram uma petição contra um acordo que permitirá aos Emirados Árabes Unidos construir uma espécie de “filial” do Museu do Louvre em Abu Dhabi, a capital daquele rico país do Golfo Pérsico. A inauguração do museu do deserto está prevista para 2012. Os xeques do emirado vão desembolsar nada menos que 700 milhões de euros pelo privilégio. Segundo os termos do acordo, que tem validade de 30 anos, o arquiteto responsável pela construção do museu deverá ser francês – comme il faut. Mas a parte mais controversa do acordo, justamente a que provocou a indignação dos intelectuais e artistas franceses, é a cláusula que permite aos Emirados Árabes alugar obras do Louvre e de outros museus franceses. “Nossos museus não estão à venda!”, diz a petição, no melhor estilo do J’Accuse! (Eu acuso), o manifesto publicado por Émile Zola em 1898 em defesa do capitão Alfred Dreyfus, injustamente acusado de espionagem, que marcou a entrada em cena dos intelectuais na política na França.

Para o escritor Didier Rykner, que escreveu o manifesto e o postou no seu website, La Tribune de l”Art, o acordo fará com que os museus franceses se privem de grande parte de suas maiores obras de arte, que, pior, serão mostradas “de maneira aleatória e nada artística” para os endinheirados do emirado – exemplo típico de “mercantilização da arte” temida pelos signatários do manifesto. “A lógica desse acordo é puramente comercial e diplomática”, aponta Rykner, que diz ter o apoio da maioria dos escritores e curadores franceses. O ministro da Cultura, Renaud Donnedieu de Vabres, rebate, alegando que o acordo representa uma “chance excepcional” para a divulgação da cultura francesa e ocidental no mundo árabe.

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FRISSON A Gioconda não deve ir
aos Emirados, mas nus como A
Duquesa de Villars e Gabrielle
d’Estrées
podem ferir suscetibilidades

De qualquer forma, os franceses podem ficar tranqüilos: não passa pela cabeça de ninguém que ícones do Louvre como a Gioconda, a Vitória de Samotrácia ou a Vênus de Milo, entre outros, possam um dia cruzar os mares para aportar nas areias quentes de Abu Dhabi. Por outro lado, pode-se imaginar os tipos de reação que despertariam num público majoritariamente islâmico os nus famosos como A Duquesa de Villars e Gabrielle d’Estrées, da Escola de Fontainebleau, ou Olympia, de Édouard Manet, do Musée D’Orsay, se o Louvre de Abu Dhabi resolvesse exibi-los. Os seguidores de Osama Bin Laden certamente salivarão ante mais um ato ímpio e blasfemo do Ocidente.