Essa é mais uma notícia surrealistas da política brasileira. O fato desenrola- se em São Paulo, mas é em Minas Gerais que seus personagens ganham vida. Na manhã de 18 de junho, policiais militares deveriam atender a uma ocorrência de um corpo baleado com dois disparos, encontrado no chão de uma calçada na periferia de São Paulo. Depois da chegada do carro fúnebre, os policiais receberam uma chamada telefônica anônima denunciando o autor do assassinato: tratava- se de um “matador profissional”, rapaz alto, loiro, olhos castanhos e que atendia pela alcunha de “Alemão”. O criminoso estaria no Shopping Tamboré (SP), às 11h, na praça de alimentação, trajando calça jeans e camiseta azul com listras brancas.

Assim que receberam a informação, os investigadores foram até o shopping e, de fato, lá estava o suposto criminoso. Assim que o rapaz viu os policiais, fugiu em disparada, deixando para trás, na mesa que ele ocupava com outro comparsa que foi detido, um pen-drive, uma foto e algumas folhas de papel. Quando os policiais abriram o cartão de memória no computador da delegacia, constataram que o “matador profissional” tinha arquivado um plano de morte e as tratativas da encomenda do crime. Isso mesmo: o próprio “matador profissional” grampeava suas conversas com seus contratadores. Estava lá: “Alemão” tinha a missão de matar, por R$ 150 mil, o deputado federal Carlos Willian de Souza (PTC-MG). Depois de revelado o conteúdo das gravações, o parceiro de “Alemão”, Odair da Silva, não teve outra alternativa a não ser admitir que a trama era financiada pelo seu patrão, o também deputado federal Mário de Oliveira (PSC-MG).

A casa caiu. O deputado Carlos Willian só não foi assassinado porque, no dia e hora programados para a execução do “serviço”, aconteceu um imprevisto. Segundo Odair contou aos policiais, Carlos Willian deveria ter desembarcado sozinho no Aeroporto de Confins (MG) na sexta-feira 15, mas acabou pegando “carona” na comitiva do presidente Lula, que visitaria Belo Horizonte. O plano foi então abortado. Era a terceira vez que isso acontecia. A quadrilha que queria matá-lo o seguiu desde novembro.

“Fiquei perplexo”, disse Carlos Willian assim que soube da trama para assassiná- lo. “Quem poderia me tirar a vida era o grupo político deles”, indignou-se. Onde ele falou “deles”, leia-se o deputado Mário de Oliveira, pastor e presidente nacional da Igreja do Evangelho Quadrangular – poderosa seita pentecostal, com 6.077 igrejas e templos espalhados pelo País e 554 programas de rádio. Mário de Oliveira negou as denúncias. A história dessa desavença começa em 2002. Carlos Willian, amigo de Mário de Oliveira havia pelo menos 20 anos, era também advogado da Igreja Quadrangular. O próprio Oliveira o lançou candidato a deputado federal pelo PSC em Minas Gerais. “Eu seria um puxador de votos”, diz Carlos Willian. O interesse político do PSC na época, segundo ele, era fortalecer a legenda. O grupo lançou Oliveira para o Senado e esperava eleger como deputado federal um pastor da Igreja, Antonio Costa. Mas, como urna é uma caixa de surpresas, quem acabou eleito foi o próprio Carlos Willian, o “laranja” da história. Ele obteve nada menos que 111.572 votos. Daí em diante, uma vez eleito, começou a sofrer todo tipo de pressão para renunciar e entregar o cargo ao pastor Antonio Costa, que tinha ficado como primeiro suplente do partido.

Carlos Willian não renunciou e a briga se arrasta desde então. Ele foi expulso da Igreja, trocou de partido e, nas última eleições, conseguiu se reeleger por outra legenda. “No dia da posse, o Mário encontrou comigo no plenário, me xingou e só não me bateu porque havia seguranças por perto”, conta. “Saí de lá e entrei como uma representação contra ele na Corregedoria da Câmara”, disse. Desde a terça-feira 26, o caso de tentativa de homicídio está na Corregedoria da Câmara nas mãos do deputado Inocêncio de Oliveira. Aguarda-se assim o desfecho desse outro fato enobrecedor da política brasileira.

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