Era quase uma e meia da madrugada do dia 26 de abril de 1986 quando os técnicos que trabalhavam no reator quatro da usina nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, cometeram um erro fatal. Em vez de desligá-lo, depois de horas de atividade, eles aceleraram o processo que faz os átomos de urânio enriquecido se partirem para liberar energia. O reator sofreu então um superaquecimento e explodiu. Uma nuvem de fumaça de partículas radioativas se espalhou pelo norte da Ucrânia, o sul de Belarus e a região russa de Bryansk com um poder 400 vezes maior que o da bomba que em 1945 devastou a cidade japonesa de Hiroshima, ao final da Segunda Guerra. Foi construído, às pressas, um contêiner cujas paredes de aço e concreto deveriam isolar o reator. O tempo passou, mas ele continua emitindo as suas partículas letais na atmosfera. O número de pessoas que sofrem de câncer e outras doenças desencadeadas pela radiação aumenta a cada ano. E não poderia ser diferente. Os efeitos de um desastre atômico demoram pelo menos 20 anos para se manifestar em larga escala.

Projetado para durar duas décadas, o contêiner, que funciona como um sarcófago para lacrar o reator, está carcomido pela umidade. A viga que suporta o telhado está apoiada numa parede abaulada pelas infiltrações. As rachaduras se espalham por uma área de 800 metros quadrados. As juntas das placas de aço que isolam o reator não estão soldadas e a água da chuva passa pelas frestas e buracos. Ao entrar no casulo radioativo, a água se contamina atingindo o solo. E animais. E o homem.

Uma geração depois do desastre, o governo dos três países mais afetados ainda negociam como financiar a construção de outro sarcófago. Maior que um campo de futebol e tão alto quanto a Estátua da Liberdade (93 m), ele vai custar US$ 800 milhões e levará cinco anos para ficar pronto. Será tarefa para um Hércules porque existe lixo radioativo enterrado por toda parte. É nesse local que os operários terão de fincar as estruturas do novo abrigo. Trágico detalhe: são grandes os riscos de contaminação na hora de retirar tudo o que está soterrado – o solo europeu está cada vez mais carregado de césio-137, uma das partículas expelidas após a explosão. A área de isolamento também aumentou. Inicialmente estava restrita a um raio de 30 quilômetros de Chernobyl e hoje cobre dezenas de milhares de quilômetros quadrados.

Não por acaso, Alemanha, Itália e Turquia abriram mão de seus programas nucleares. Os franceses e os japoneses foram exceção. De toda a energia
produzida por eles, 80% e 30%, respectivamente, provêm dos reatores. No Brasil esse índice é de 4%. Não há nada de errado na utilização de usinas nucleares na geração de energia. Elas não emitem gases tóxicos na atmosfera nem despejam substâncias poluentes nos rios. O que emperra a sua utilização é o alto custo de construção e manutenção, além da dificuldade de armazenamento do lixo atômico – sem contar, é claro, com as chances de acidentes como o de Chernobyl. Outra agravante é que o mesmo reator que gera energia pode ser empregado na fabricação de armas nucleares. E esse é um fantasma que dificilmente deixará de assombrar a humanidade.