O futuro da aviação brasileira
mudou para melhor na semana
passada. O governo Lula finalmente
decidiu agir para evitar a falência da
Varig, companhia da qual a União é a
maior credora e a maior devedora. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
sentiu a pressão da sociedade e entrou pessoalmente na discussão de soluções que evitem a morte de um símbolo nacional e a demissão de milhares de pessoas em pleno ano eleitoral. Em vez de simplesmente lavar as mãos com base no falso discurso de que o problema da Varig é exclusivamente do setor privado, o presidente reuniu-se na quinta-feira 27 com os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil) e Waldir Pires (Defesa), que recebeu em seguida o juiz Luiz Roberto Ayoub, responsável pelo processo de recuperação judicial da empresa. O resultado foi a elaboração de um plano de vôo alternativo apoiado pelo governo, em que a Varig poderá ser salva da falência. Se for adiante, a empresa será dividida em duas e manterá sua bandeira apenas nos vôos internacionais.

A mudança de atitude foi decidida na manhã da terça-feira 25, durante reunião da coordenação política no gabinete do presidente Lula. No Senado, quatro comissões iniciaram uma audiência pública conjunta para discutir a crise. Nada menos que 71 dos 81 senadores compareceram aos debates. Lula entendeu a gravidade da situação e deu ordens para que os ministros encontrassem uma solução. No mesmo dia, o presidente da BR Distribuidora, Rodolfo Landim, que se opunha de forma feroz à pretensão da Varig de ganhar prazo de 30 dias para pagar pelo combustível, pediu demissão e aceitou um convite para trabalhar como executivo na rede Pão de Açúcar.

Na quarta-feira 26, a pressão veio da Câmara dos Deputados, que também fez audiências conjuntas de quatro comissões para debater a crise. Encarregada por Lula de coordenar as ações do governo com relação à Varig, a ministra Dilma Rousseff amenizou o discurso que vinha adotando publicamente sobre a questão. E admitiu que o BNDES poderia entrar na operação de salvamento “sem sombra de dúvidas”, como financiador de um investidor privado que apresente garantias ao empréstimo. O presidente da Infraero, José Carlos Pereira, mostrou-se disposto a parcelar o pagamento das tarifas de utilização de aeroportos, estimadas em R$ 900 mil por dia, e os atrasados de R$ 133 milhões. As discussões entre as partes envolvidas continuaram intensas e, na sexta-feira 28, o presidente Lula voltou a falar sobre o tema. “A Varig, como outras empresas do Brasil, virou uma espécie de paixão nacional, mas essas coisas você não trata com o coração”, disse. “Nós agora vamos trabalhar para ver se encontramos uma solução.”

Existem dois planos sobre a mesa. Ambos prevêem a divisão da Varig em duas empresas, uma boa, sem dívidas, e outra com o passivo de R$ 8 bilhões. No primeiro plano, recebido com frieza pelos credores, a ex-subsidiária Varig Log pagaria US$ 400 milhões por 95% do controle da Varig saneada e ficaria com as linhas nacionais e internacionais. No segundo plano, elaborado pela consultoria Alvarez & Marsal e discutido nesta semana em Brasília, a Varig sem dívidas ficaria com as linhas nacionais e seria vendida para um investidor privado, por meio de leilão, com financiamento do BNDES ao comprador. Seria uma empresa com quatro mil funcionários e 18% do mercado. O governo espera arrecadar até US$ 2 bilhões nessa operação.

Por essa proposta, a outra parte da Varig herdaria as dívidas, 3.500 funcionários e as linhas internacionais, que rendem mais de US$ 1 bilhão por ano. Os credores – governo, funcionários e estatais – teriam a opção de participar do controle da companhia, convertendo dívidas em ações ou comprando cotas de um fundo que está sendo criado para permitir a entrada de novos investidores. De seu lado, o Planalto faria um esforço para promover o encontro de contas entre as dívidas da União e dos Estados com a companhia, estimadas em mais de R$ 5,5 bilhões, e os atrasados da Varig com a União.

Os dois planos serão discutidos pelos credores em assembléia na terça-feira 2. Qualquer que seja o desfecho, o importante é que a Varig não pare de voar. A maioria dos empresários e dirigentes do setor privado ouvidos por ISTOÉ ao longo da semana concorda com o salvamento da empresa, desde que isso não inclua novas injeções de dinheiro público.

“Deixar quebrar seria um assassinato sem lógica econômica”, diz o economista Paulo Rabello de Castro, que atua em nome dos funcionários nas negociações.