Os políticos em Brasília têm vivido em permanente ansiedade. Primeiro foi a expectativa pelo que viria no relatório final da CPI dos Correios. Depois, a apreensão em torno do petardo que seria a denúncia do Ministério Público. Agora, a caixa de Pandora é uma lista secreta que tem espalhado pânico nos gabinetes do Congresso. E não é para menos. O documento, elaborado sob o mais absoluto sigilo pela cúpula da CPI, contém nomes novos de parlamentares suspeitos de terem se lambuzado no megacaixa operado pelo empresário Marcos Valério e nos esquemas acessórios que abasteceram a compra de apoio político para o governo, como as corretoras que operavam para fundos de pensão. Se levada adiante, a lista poderá ampliar o rol de cassáveis e jogar um pouco mais de lama sobre a já maculada imagem do Parlamento. Até a quarta-feira 19, porém, a lista não havia nem sequer saído do lugar onde sempre esteve: as mãos do senador Delcídio Amaral (PT-MS) e as do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), respectivamente presidente e relator da Comissão. O assunto virou tabu e a pressão para que tudo permaneça como está é grande. Em suma, o desinteresse e o velho corporativismo podem fazer o documento virar pó.

Os planos de Delcídio e Serraglio sobre o que fazer com a relação de suspeitos já mudaram algumas vezes desde a reta final da CPI. Inicialmente, a idéia era incluí-la no relatório final da comissão, o que não aconteceu. A dupla, então, anunciou que entregaria o papel ao Ministério Público Federal. Dessa forma, passaria à frente a responsabilidade pela continuidade da investigação sobre os supostos novos mensaleiros. Só que tirar a lista do Congresso virou uma complexa missão. O listão inclui situações das mais diversas: indícios mais fortes contra uns e menos fortes contra outros. ISTOÉ teve acesso a uma versão preliminar do documento, datada de 17 de abril. Nela, estão os nomes de 59 deputados de dez partidos. Da base aliada e da oposição. A planilha foi feita pela CPI a partir do cruzamento dos nomes de funcionários da Câmara dos Deputados com o cadastro de visitantes da agência do Banco Rural em Brasília. Dessa interposição saíram 67 nomes de assessores parlamentares. Depois, com a ajuda do I-2, um software importado dos Estados Unidos e usado pelo serviço secreto britânico em investigações sobre lavagem de dinheiro, chegou-se aos nomes dos deputados para quem trabalham ou trabalharam aqueles funcionários. Seria um importante ponto de partida para a investigação. No listão, aparecem homônimos de assessores de deputados. Tem também o nome de um aguerrido líder da oposição, que dificilmente teria sido beneficiário do esquema valério-delubiano. Por outro lado, há outras coincidências interessantes. ISTOÉ cruzou a lista, que contém as datas das visitas dos assessores ao banco, com as datas dos saques em dinheiro efetuados na boca do caixa. E descobriu que assessores de 20 deputados estiveram na agência bancária exatamente nos dias em que a central de pagamentos do mensalão funcionou a todo vapor. Naquelas datas, foram sacados cerca de R$ 9 milhões das contas de Marcos Valério. Se aqueles funcionários foram buscar dinheiro, só uma investigação profunda pode comprovar. Mas não há dúvidas de que é um bom fio de meada para se avançar na investigação. Na lista ainda secreta a CPI foi um pouco mais além. Inclui nomes de parlamentares que receberam dinheiro de corretoras envolvidas em operações suspeitas com fundos de pensão suspeitos de terem sido fonte de recursos do mensalão. Na quarta-feira 19, uma pessoa com acesso ao cruzamento de dados revelou que a versão mais recente do listão aponta para 40 parlamentares.

Osmar Serraglio diz que até agora não se chegou a uma decisão definitiva sobre o que fazer com a lista por medo de injustiça. “Não é possível que daqueles nomes todos ninguém tenha envolvimento, mas sempre há o risco de, no meio dessa confusão, apontar o dedo para um parlamentar que não tem nada com o esquema”, diz o peemedebista. O deputado nega que esteja em curso uma operação-abafa para jogar o listão na gaveta. “Pressão eu também desconheço, mas que tem muita gente preocupada com isso tem”, admite Delcídio. A dupla que comandou a CPI só não esclareceu uma coisa até agora: se a idéia é repassar o documento ao MP para que os procuradores aprofundem a investigação, por que demorar tanto? O presidente do Conselho de Ética, deputado Ricardo Izar (PTB-SP), diz não entender a demora. Para ele, a lista já deveria ter sido repassada à Mesa Diretora da Câmara, para que, também internamente, fossem iniciados os procedimentos necessários para investigar os suspeitos. “A pressão interna está grande para que isso não prossiga”, afirma Izar. Medos à parte, o Congresso deveria saber que a melhor maneira de resolver a pendenga é concluir de vez a investigação. Para inocentar quem está lá de gaiato, e para punir quem tem culpa. Pior é a lista ficar vagando, até porque documentos assim em Brasília costumam virar instrumento de chantagem. Ainda mais em ano eleitoral.