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Não faltam ao Brasil incentivos fiscais ao financiamento de projetos culturais e esportivos. A experiência de mecenato que mais deu certo até hoje é a da Lei Rouanet, que premia o investimento na área cultural, com ênfase em artes cênicas, cinema e música. Mais recente é a Lei de Incentivo ao Esporte, de dezembro de 2006, que permite o desconto no Imposto de Renda de patrocínios e doações para eventos esportivos. No ano passado, os projetos da Lei Rouanet somaram R$ 891 milhões. No setor esportivo, foram captados R$ 53 milhões para 21 projetos – só a Petrobras entrou com R$ 26 milhões destinados ao Comitê Olímpico. Trata-se de valores expressivos, mas muito aquém do potencial do mercado. Na área cultural, as empresas podem usar a isenção fiscal até o equivalente a 4% do lucro líquido. No caso de projetos esportivos, o teto é de 1% do IR devido. Mas a grande maioria fica longe do abatimento a que tem direito. A rara exceção é exatamente a Petrobras, que, em 2007, investiu R$ 205 milhões, dos quais R$ 180 milhões através da Lei Rouanet. Depois, bem abaixo, aparece a Vale, com patrocínios de R$ 32 milhões. A aplicação de grupos privados, como Ambev, Gol, IBM e Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), não chega sequer à casa dos dois dígitos. Essa realidade sobrecarrega a Petrobras, cada vez mais visada pelos produtores culturais e esportivos. “A Petrobras se orgulha de ser a maior parceira da cultura brasileira, mas não pode ter a expectativa tão concentrada nela”, afirma Eliane Costa, gerente de patrocínio da estatal.

Em certa medida, a Petrobras paga um preço alto por sua tradição no mecenato. As demais empresas ou são novas no ramo ou reagem negativamente diante da necessidade de criar áreas específicas para atender os candidatos a patrocínios e doações. O próprio governo federal levou algum tempo para convencer o Banco do Brasil a financiar a seleção feminina de vôlei. Algumas empresas são tão refratárias ao patrocínio cultural que financiam eventos e produções, mas preferem manter o anonimato. Temem que surjam filas de artistas e esportistas em sua porta. E não se mostram dispostas a montar estrutura para atendê-los. Na verdade, não está disseminada no País a cultura do mecenato. O que exige um trabalho de catequese por parte do setor público. O ministro do Esporte, Orlando Silva, por exemplo, tem realizado encontros com empresários para esclarecer sobre as vantagens fiscais embutidas na Lei de Incentivo ao Esporte. No final do ano, ele falou para diretores de 50 empresas, reunidos em evento no Jockey Club de São Paulo. Nesta segunda-feira, fará palestra para outro grupo de empresários, no Rio de Janeiro. Diante do desperdício da isenção fiscal, já existem empresas que reconhecem o erro e admitem rever a política de patrocínio. Uma delas é a Vale, que recentemente tomou a decisão de criar um núcleo de seleção de projetos semelhante ao da Petrobras. Enquanto o novo modelo está sendo elaborado, a Vale prefere não se pronunciar sobre o assunto. A mudança, porém, é líquida e certa, com o objetivo de ampliar o uso dos incentivos fiscais. Afinal, além da isenção, há o retorno positivo em termos de imagem institucional.

Para o ator Carlos Vereza, é um erro responsabilizar apenas as empresas pelo baixo volume de patrocínios. “Os empresários ficam receosos em relação à qualidade de muitos projetos e temem também pelo resultado do investimento”, diz ele. De fato, há muito projeto inviável e mal formulado. Mas o retorno é garantido pela renúncia fiscal da União. Tanto é bom negócio que a Petrobras criou uma estrutura azeitada para receber produtores culturais. Em 2003, a empresa lançou o Programa Petrobras Cultural, que, a cada ano, recebe cerca de nove mil propostas. A triagem inicial é feita por uma comissão de seleção externa. Os finalistas são submetidos ao Conselho Petrobras Cultural, composto de cinco membros: os gerentes de patrocínio e de comunicação da Petrobras, o gerente de comunicação da BR Distribuidora, um representante do Ministério da Cultura e outro da Secretaria de Comunicação da Presidência da República. No julgamento, eles foram auxiliados até o ano passado por um conselho consultivo de especialistas: José Miguel Wisnick (música), José Carlos Avelar (cinema), Jurema Machado (patrimônio), Ana Mae Barbosa (artes) e Arthur Nestrovski (literatura). Ao fim do processo de seleção, cerca de 300 projetos recebem o aval da estatal do petróleo. Vão de patrocínio de cinema, no valor de R$ 1,5 milhão, até gravações de CDs, de R$ 150 mil.

Preocupada em aprimorar a qualidade das propostas, a Petrobras passou a percorrer as principais capitais do País com uma oficina de formatação de projetos culturais. O resultado da iniciativa tem sido excelente, segundo a gerente Eliane Costa. Mas a Petrobras, que utiliza os 4% do lucro líquido, adverte que atingiu o limite de sua capacidade. Seus financiamentos já superam os limites dos incentivos fiscais. A empresa torce para que surjam novos mecenas e também que os mecenas existentes aumentem seus investimentos. Uma andorinha só ajuda, mas não faz verão.