A noite encobriria como um manto gelado o vilarejo miserável em Bajur, nos confins do Paquistão. Somente os olhos mais atentos distinguiriam uma figura sombria movendo-se com extrema agilidade. Ninguém prestaria atenção; afinal, ali são comuns as mulheres apressadas trajando burcas negras – as vestes femininas tradicionais das muçulmanas. Somente um observador fenomenal teria notado o detalhe de uma inovação estilística na indumentária: duas protuberâncias pontudas nas laterais acima do capuz. Nesse caso, poderia ter comentado: “Você viu a burca daquela mulher enorme? Parece uma fantasia de Batman.” Mas aí seria tarde demais: Pow! Wamp! Crack! Seria nocauteado com três onomatopéias poderosas. Esse elemento de surpresa, no entanto, foi comprometido no início de fevereiro, quando o famosérrimo desenhista de quadrinhos Frank Miller anunciou ao mundo que está enviando Batman para dar um pau em Osama Bin Laden. O gibi Holy terror: Batman! (Santo terror: Homem-Morcego!) deverá contar toda a história a partir de março de 2007.

Mas faz sentido mandar o Batman enfrentar esta parada: o herói é considerado o melhor detetive do mundo e entende muito de caverna, esconderijo predileto de Bin Laden. O holofote com o sinal do morcego será acionado depois de um atentado contra Gotham, a cidade do coração do mocinho. “Imagine o poder da fúria de alguém que teve sua cidade atacada”, diz Miller. “Não faz sentido perseguir o Charada quando a Al-Qaeda está à solta”, justifica o autor. Chega de socar o Pingüim; agora é pancada no mujahedin. Agora, é o gótico contra o mourisco.

Miller anunciou sua idéia na mesma época em que se queimavam bandeiras da Dinamarca e de outros países europeus, resposta a um cartum dinamarquês no qual o profeta Maomé aparece com um turbante escamoteando uma bomba. Centenas de pessoas morreram ou ficaram feridas nos protestos. Se tudo isso aconteceu por causa de uma charge, imagine o que farão com as dezenas de quadrinhos em que Batman dará um coro em Bin Laden e sua gangue. A bem da verdade, nos países árabes há anos são vendidos nas ruas gibis em que os super-heróis são muçulmanos e malham vilões judeus ou cristãos. No Brasil, um estúdio gaúcho criou super-heróis para o Oriente Médio, como Jalina, heroína de Jerusalém que salva povoados e faz a festa da meninada árabe. Assim, a convocação de Batman é apenas mais um capítulo na guerra dos desenhos.

A nervosa antecipação provocada por esse embate
de titãs inflama especulações. Como seria o encontro entre o profeta do terror e o quiróptero humano?
Imagine a cena: Bin Laden, em seu covil, chama um assecla:
– Abdul, vá lá fora e me traz um homem-bomba.
O lacaio se empolga:
– Vamos atacar os demônios ianques, grande xeque?
– Não, imbecil, quero um homem-bomba-de-flit para detetizar essa caverna. Agora mesmo vi um morcego do tamanho de um Porsche” – diz Osama.
– Pode ser uma mensagem do Todo-Poderoso – sugere o pio Abdul.
– Nem mais um piu, cão cretino! Por que Alá me
faria ver um Porsche? E, ainda por cima, um conversível: parecia que a capota estava despregando. O que eu
vi era real e não vinha do paraíso. Vá buscar o homem-bomba.
Com a saída de Abdul, Batman confronta Bin Laden:
– Espero que você tenha bom estoque de Viagra, maldito terrorista! Vai precisar de combustível com aquelas 78 virgens de seu paraíso!– Alá é grande! Pensei que esse dia nunca chegaria. Estou pronto para meu martírio. Já não agüentava mais morar nesta caverna imunda. Argh! Seriam as últimas palavras do líder da Al-Qaeda, antes que as poderosas mãos do Cruzado de Capa envolvessem seu pescoço num aperto de morte.