O caseiro Francenildo Santos Costa aumentou a temperatura da crise política ao apresentar sua versão sobre o que vira enquanto trabalhava em uma mansão no Lago Sul de Brasília. A reação do governo às suas declarações, porém, foi ainda mais danosa e coloca em ebulição a confiabilidade em uma das instituições mais respeitadas do País, a Caixa Econômica Federal. Na quinta-feira 23, a PF decidiu quebrar o sigilo bancário e telefônico do caseiro. Uma clara tentativa de dar ares de legalidade a uma operação ilegal, digna dos regimes de exceção, realizada uma semana antes. Na noite da quinta-feira 16, o extrato bancário de Nildo, como é conhecido o caseiro, foi vasculhado através de um terminal instalado no edifício-sede da Caixa. A bisbilhotice durou exatos 16 minutos e se deu enquanto o caseiro prestava depoimento na sede da PF, a pouco mais de 200 metros de distância da sede da CEF. Minutos antes de o terminal eletrônico da Caixa ser acionado, um delegado da PF pedira a Nildo o cartão bancário que tinha o número de sua conta. A senha para acessá-la, no entanto, não foi fornecida.

Quem forneceu a senha de Nildo aos bisbilhoteiros e a mando de quem foi feita a invasão na conta do caseiro é o mistério que a Polícia Federal tenta desvendar. “Não vamos conviver com quebra da regra democrática”, diz o ministro da Articulação Política, Jaques Wagner. Punir os responsáveis pela violação é fundamental para o estado de direito e só com o esclarecimento de toda essa operação é que a credibilidade da CEF pode se manter inabalada. Na quinta-feira, o presidente da CEF, Jorge Mattoso, cancelou uma viagem ao Japão para pilotar a crise. Sua cabeça, porém, nunca esteve tão ameaçada.

A inaceitável quebra do sigilo da conta de Nildo não foi o primeiro ato de arbítrio que vitimou o caseiro. Três dias antes, na segunda-feira 13, quatro terminais da sede da Secretaria da Receita Federal, que fica entre os edifícios da CEF e da PF, foram acionados para mapear a vida fiscal do rapaz, filho de uma lavadeira e de pai incerto. Apenas alguns altos funcionários da Receita têm acesso ao software do sistema “Dossiê Integrado da Pessoa Física” e “Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física”, que permite levantar a vida contábil e financeira de um cidadão. A manobra foi relatada ao deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) por três pessoas ligadas ao serviço de inteligência da Receita. A Polícia Federal também já tem conhecimento de que não apenas o extrato bancário de Nildo foi entregue à imprensa. Documentos da Receita e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) faziam parte do dossiê entregue pelos bisbilhoteiros.

A versão contada pelo caseiro e a atabalhoada reação do governo têm levado o presidente Lula a pensar em antecipar em quatro dias a reforma ministerial prevista para sexta-feira 31. A reviravolta no primeiro escalão do governo poderá minimizar o impacto provocado pela quebra do sigilo do caseiro e ainda coincidir com a leitura do relatório final da CPI dos Bingos, ajudando a diminuir sua repercussão.